Título: Problema inaugural
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 03/01/2007, Panorama Político, p. 2

O êxito tem outros pré-requisitos, como a formação de uma equipe ministerial que tenha lastro político e competência gerencial. Mas isso Lula deixou para depois, alegando exatamente que é preciso vencer primeiro a sucessão no Parlamento. Faz sentido, desde que ela saia da contemplação para a ação. Os dois candidatos começaram a fazer movimentos fortes que podem tornar a disputa inevitável. Tem-se evocado muito o racha na base governista em 2005, que levou à eleição de Severino Cavalcanti. Comparação pouco perfeita porque o risco agora é outro. Não há um Severino no páreo, embora possa aparecer. O perigo é o esgarçamento da futura base na Câmara antes mesmo de estabelecida, apesar do grande número de partidos alinhados com o governo. Se o atual presidente da Câmara, aliado e ex-ministro de Lula, e o líder do governo na Câmara, por ele escolhido, sentirem-se autorizados a disputar votos no plenário, rachando a nascente coalizão, o que vão pensar os novos deputados que vêm aí? Vão achar que tudo é mesmo permitido, inclusive votar contra a orientação partidária e do governo quando bem entenderem. Esta é a porta da casa de mãe Joana, senha para a fragmentação que compromete a sustentação de qualquer governo, inviabilizando sua agenda relacionada com seus projetos. Em fevereiro vão tomar posse 269 novos deputados, e dependerá muito deles o ambiente da nova Câmara.

O petista Chinaglia, bancado pelo PT e por parte do PMDB, está em campo arregimentando apoios. Aldo também adotou postura mais agressiva desde que avisou a Lula que é candidato, no dia 22 passado. Ele tem o apoio do PSB, do PP, do PFL e da ala do PMDB que já era governista no mandato passado, além do de seu pequeno PCdoB. Cabe a Lula ouvir seus líderes, avaliar as possibilidades de cada um e fazer o que não gosta, uma escolha. Aliados de Aldo, como o deputado e senador eleito Renato Casagrande (PSB-ES), apontam o apoio do PFL como uma porta de diálogo com a oposição. Chinaglia, por outro lado, personifica a aliança com os neogovernistas do PMDB. A promessa de apoio do PT a um candidato peemedebista daqui a dois anos fortalece a aliança. Tudo tem que ser pesado. Lula pode, para facilitar as coisas, convidar o preterido para ser ministro. Isso é do jogo. Mas cabe agora a ele, e a mais ninguém, fazer um movimento para evitar um mau começo na gestão política. O Ministério ele pode deixar para depois. Este problema, não.