Título: Uma faxina geral
Autor: Cruvinal, Tereza
Fonte: O Globo, 05/01/2007, Panorama Político, p. 2

A proposta da Executiva do PDT, veiculada no site do partido e assinada por seu presidente, Carlos Lupi, é uma orientação para a ação de sua bancada. Mas pode deflagrar, acredita o deputado Miro Teixeira, um debate mais substantivo, no calor da disputa pela presidência da Câmara, até agora centrada em nomes, ambos respeitáveis, mas não em diferenças essenciais quanto aos rumos do Legislativo. Mas, para isso, seria preciso um despertar dos partidos para o que já ficou bastante claro: nestes anos de construção democrática, o Congresso não se reciclou institucionalmente, conservando regras e ritos arcaicos que, somados aos deslizes pessoais e partidários, deram nesta interminável crise de credibilidade.

A proposta do PDT aborda algumas das mudanças necessárias. Sugere, por exemplo, a criação de uma Comissão Permanente de Normas e Projetos, destinada a fixar prazos para a tramitação das diferentes propostas legislativas e a valorizar a iniciativa dos parlamentares. De fato, um Congresso é para legislar, mas, incrivelmente, segundo levantamento do deputado Alexandre Cardoso, nos últimos quatro anos apenas 0,2% dos projetos de autoria de deputados viraram lei. Menos de um em cada cem. Já o Executivo transformou em lei 54% do que propôs. Ainda relativamente ao processo legislativo, sugere o PDT a redefinição do que seja relevância e urgência como critério para a edição de MPs. Não é fácil, tem que ser por emenda constitucional, mas, se quiser se reformar, o Congresso terá que enfrentar a parada e o Executivo.

Teria de enfrentar o Executivo também para aprovar o Orçamento impositivo, como sugere o PDT. A equipe econômica - do atual e de todos os governos - não admite, alegando que o Executivo perderia o controle sobre o gasto público. O PDT sugere ainda que o portal da Câmara divulgue, em "linguagem amigável", todas as informações sobre a execução orçamentária. Isso já existe, mas, realmente, em linguagem incompreensível para os leigos. Se o Orçamento não pode ser inteiramente impositivo, pode-se começar tornando obrigatória a execução das emendas dos deputados. Eles topariam, com certeza, um valor menor em emendas, desde que fossem garantidas. E isso evitaria Vedoins e outras mutretas.

Em relação aos subsídios, o PDT retoma a proposta defendida por Miro em dezembro, na crise da equiparação com o STF, quando argumentava que o Congresso precisa parar de fingir: para elevar os vencimentos, foi criando formas paralelas e dissimuladas de remuneração, como a verba indenizatória de R$15 mil, maior que o salário de R$12,7 mil, o que, somado aos penduricalhos, ultrapassa o teto constitucional, o salário dos ministros do STF, R$24,3 mil. Sugere ainda o PDT que o subsídio dos parlamentares torne-se a referência para teto nos três poderes, o que propiciaria maior transparência e possibilidade de controle pela sociedade.

Propõe, ainda, que os membros da Mesa deixem de se envolver com tarefas administrativas, como nomeações, tomada de decisões sobre o orçamento da Casa e outras prerrogativas que tornam os cargos da Mesa tão cobiçados, levantando suspeitas sobre interesses escusos de seus ocupantes.

Em relação à posse dos suplentes, a proposta é simples: só tomariam posse durante o recesso quando houvesse convocação extraordinária.

A lista do PDT não esgota as disfunções que vêm identificadas. É preciso, ainda, acabar com o voto secreto e talvez com os processos de cassação, entregando ao Judiciário o julgamento dos deputados acusados de delitos diversos. Mas este é o debate: o da faxina geral do Legislativo.

Preferido da oposição na disputa pela presidência da Câmara, Aldo Rebelo ganhou o apoio de Fernando Henrique. Mas não deve alardear, para não apertar o calo de Lula.

Posses conjuntas

O caso dos suplentes que vão ganhar para não trabalhar no recesso explicita as inconveniências do nosso calendário. Há outros problemas além do ganho indevido. Não faz sentido que o presidente e os governadores tomem posse no dia 1º e o Legislativo - federal e estaduais -, só um mês depois. Essas posses precisam ser coincidentes, além de removidas do dia de Ano Novo. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo, admitiu, sem entrar em detalhes, mudanças no calendário. A vaga dos suplentes é decorrência disso, do fato de alguns deputados irem trabalhar no Executivo, deixando a vaga aberta.

O injustificado intervalo cria dificuldades para o presidente montar seu ministério. Os descontentes podem sempre dar o troco na eleição dos presidentes das duas Casas.

Pior ainda fica a situação quando surgem situações que exigem uma convocação extraordinária. Imagine-se o governo tendo que aprovar medidas emergenciais para enfrentar uma crise neste intervalo. Os deputados que não foram reeleitos - geralmente a taxa beira os 50% - iriam tirar o couro do governo em troca deste último e derradeiro voto.