Título: Parecer ameaça pensões vitalícias nos estados
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 09/01/2007, O País, p. 3

Procurador-geral considera aposentadoria para ex-governadores inconstitucional

Afarra das aposentadorias vitalícias dos ex-governadores pode estar com os dias contados. O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, deu o primeiro passo ao considerar inconstitucional o pagamento de aposentadoria integral vitalícia a ex-governadores, já que a Constituição não prevê esse tipo de benefício. Na última sexta-feira, ele enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer favorável a uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo PDT contra o pagamento do benefício no Ceará a quem exerceu o mandato por menos de seis meses. As legislações estaduais foram aprovadas à revelia da Constituição e, no julgamento do mérito, os ministros do STF podem considerar inconstitucional o pagamento das pensões vitalícias para todos os governadores, até mesmo para que os cumpriram o mandato inteiro.

Se a maioria dos ministros do Supremo concordar com o procurador-geral, os ex-governadores cearenses e de outros estados perderão a aposentadoria. O resultado do julgamento será aplicado apenas no caso específico do Ceará, mas servirá de precedente para derrubar o benefício em todo o país, desde que sejam propostas outras ações ao STF contra o pagamento da aposentadoria a ex-governadores.

Marco Aurélio vai relatar ação proposta pelo PDT

No caso do Ceará, uma emenda à Constituição estadual instituiu, em 2002, o direito à aposentadoria integral mensal a ex-governadores e ex-vice-governadores para o resto da vida em valores iguais ao salário do governador em exercício. Segundo a ação ajuizada pelo PDT, a norma fere o artigo 25 da Constituição Federal. Esse artigo proíbe os estados de ter legislação incompatível com os princípios da Constituição Federal ¿ que não prevê a aposentadoria vitalícia e integral para ex-governadores. Esse mesmo princípio consta do artigo 11 das Disposições Transitórias da Constituição brasileira.

O PDT entrou com a ação em maio de 2006 pedindo uma liminar para suspender os efeitos da norma. Segundo o partido, as aposentadorias dos ex-governadores representam lesão às finanças públicas e desrespeito à ordem jurídica, além de tratar-se de ¿imoralidade diante de milhões de trabalhadores brasileiros que não dispõem de tratamentos privilegiados como este¿.

Em seu parecer, Antonio Fernando concordou com os argumentos apresentados pelo PDT. ¿As normas constitucionais estaduais devem guardar harmonia com os princípios da Constituição Nacional¿, escreveu. O parecer será analisado pelo ministro Marco Aurélio de Mello, relator da ação. O caso poderá ser levado ao plenário para a apreciação dos demais ministros a partir de fevereiro, quando termina o recesso no Judiciário. Ainda não há data para o julgamento.

Em 2003, a situação dos ex-governadores cearenses foi discutida pela primeira turma do STF. O colegiado examinou recurso proposto pelo governo do Ceará contra uma decisão do Tribunal de Justiça do estado, que reconhecera o direito de pensão vitalícia ao ex-governador Francisco de Paula Rocha Aguiar, que depois foi deputado pelo PPS. Por motivos técnicos, os ministros não julgaram o caso e, com isso, o benefício foi mantido. Ele só deixou de receber quando foi empossado como conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, ficando impossibilitado de acumular os vencimentos com a aposentadoria.

Rocha Aguiar ocupou o cargo de governador, em caráter permanente, entre outubro e dezembro de 1994, após a renúncia do titular, Ciro Gomes. O estado recorreu ao STF com o argumento de que teria havido ofensa ao princípio da moralidade. Na ação, o estado deixou de mencionar o artigo correto da Constituição, que proíbe esse tipo de aposentadoria. Por essa razão, o caso não pôde ir a julgamento.

Levantamento publicado pelo GLOBO anteontem mostrou que dos 13 governadores que deixaram o cargo no início deste ano, sete terão direito a pensão vitalícia. Leis que garantem o privilégio vigoram em 15 estados. Em outros seis estados, o benefício foi extinto, mas ainda há aposentados remanescentes. Pelo menos 122 ex-governadores ou viúvas de quem ocupou o cargo recebem de R$1 mil a R$22.500 sem ter contribuído para qualquer tipo de previdência.