Título: Para Brasil é melhor ter Venezuela no Mercosul
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Fonte: O Globo, 11/01/2007, O Mundo, p. 30

Como membro do bloco, país tido como estratégico pelo governo Lula teria que seguir a chamada cláusula democrática

BRASÍLIA. Ruim com ele, pior sem ele. Esta é a avaliação comum nos bastidores do governo brasileiro, no momento em que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, ameaça reestatizar as áreas de energia e telecomunicações. Apesar do efeito que Chávez já começa a provocar na percepção de investidores em relação à América Latina, no que diz respeito ao cumprimento de regras e contratos, a Venezuela é uma nação tida como extremamente estratégica pelo governo Lula, especialmente sob o ponto de vista do comércio e da integração física. Por isso, nada melhor que seja um sócio pleno do Mercosul.

Para a área diplomática, o ideal é que Chávez se mantenha como membro pleno do bloco. Seu perfil polêmico, com atitudes que já deixaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva constrangido e irritado algumas vezes, exige uma proximidade maior de Chávez com o Mercosul. Para pertencer ao bloco, explicaram fontes do governo brasileiro, é preciso seguir normas e, principalmente, a chamada cláusula democrática, que prevê a expulsão do membro que romper com os princípios democráticos.

Planalto reage com cautela e prefere não se manifestar

A posição das autoridades brasileiras frente à nacionalização anunciada por Chávez é de cautela. A ordem do Palácio do Planalto é esperar o desdobramento dos acontecimentos, sem qualquer manifestação oficial.

¿ Não vamos nos pronunciar sobre assuntos da política interna da Venezuela. Vamos continuar tendo boas relações. Trata-se de um governo que está saindo legitimado de uma eleição, e não temos lições a dar ¿ afirmou ao GLOBO o assessor para assuntos internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia.

Na visão de alguns especialistas, porém, a situação é preocupante e envolve não apenas petróleo e gás, mas também investimentos em infra-estrutura.

¿ Com essa experiência socialista exótica, Chávez está tentando retardar a economia e o crescimento. E afeta toda a América Latina ¿ disse o diretor de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Giannetti da Fonseca.

Economista diz que grau de contaminação é baixo

Segundo Giannetti, seria interessante se o Mercosul previsse a expulsão do país que romper unilateralmente contratos. Além da Petrobras, lembrou, grandes empreiteiras brasileiras têm interesse na Venezuela por conta das obras de infra-estrutura.

¿ Foi um erro colocar um incendiário como Chávez no Mercosul, e o Brasil pode ter problemas sérios com a nacionalização ¿ reforçou o consultor internacional Adimar Scheievelbein.

Para o economista sênior do Unibanco Asset Management, José Luciano Costa, a grande preocupação é que ainda não se sabe como será a reestatização, se haverá ruptura unilateral de contratos, por exemplo. Ele enfatizou que, de modo geral, o investidor sabe diferenciar o Brasil de outros países latino-americanos, inclusive da Venezuela.

¿ Não teve grande mudança de percepção. O grau de contaminação do Brasil, pelo menos por enquanto, é bastante baixo ¿ disse Costa.

Apesar da polêmica, o PT enviou uma carta de saudação a Chávez pelo novo mandato, elogiando suas políticas públicas e manifestando a esperança em que os dois governos consolidem o processo de integração dos povos. ¿O Partido dos Trabalhadores faz votos de que este novo mandato seja coroado de êxitos na continuidade e no aprofundamento das políticas públicas que asseguraram o grande apoio popular que distingue seu governo¿, diz a carta.