Título: Bush admite ter errado na guerra do Iraque
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 11/01/2007, O Mundo, p. 32

Em trechos antecipados do discurso, presidente dos EUA reconhece ter enviado número insuficiente de soldados

WASHINGTON. Trechos antecipados do discurso em que o presidente George W. Bush ia anunciar ontem sua nova estratégia para a guerra no Iraque mostram que ele admitiria claramente, pela primeira vez depois de quase quatro anos, o fracasso de todas as tentativas realizadas até aqui ¿ e, em especial o erro cometido logo na invasão: o envio de um número insuficiente de tropas.

De acordo com trechos do discurso ¿ ele falaria às 21h (meia-noite no Brasil) ¿, ao traçar o que parece ser a sua última chance de vitória, Bush procurou colocar o maior peso da tarefa sobre os ombros do governo iraquiano. E ao fazê-lo reconheceu, indiretamente, a incapacidade dos americanos em acabar com os insurgentes:

¿ Somente os iraquianos podem acabar com a violência sectária e dar segurança a seu povo. E o seu governo preparou um plano agressivo para isso ¿ diria Bush, dando a impressão de que em vez de estar lançando uma nova estratégia própria estaria endossando algo preparado pelo governo do Iraque.

EUA esperam conquistar Bagdá em oito meses

Ele foi obrigado a reconhecer que o alto comando militar tinha razão quando, ao receber ordens de ir à guerra, sugeriu o envio de 250 mil a 300 mil homens. No entanto, o então secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, e sua equipe civil ¿ os chamados ¿falcões do Pentágono¿, além do próprio Bush ¿ consideraram 100 mil suficientes:

¿ Os nossos esforços anteriores para dar segurança ao Iraque falharam por duas razões principais. Não havia tropas americanas e iraquianas suficientes para dar segurança às áreas de onde terroristas e insurgentes haviam sido removidos. E havia muitas restrições sobre as tropas com que contávamos. Nossos comandantes revisaram o novo plano iraquiano para garantir que tais erros tivessem sido corrigidos.

Como os 132 mil soldados americanos que estão no Iraque não estão dando conta do recado, Bush decidiu enviar mais 21,5 mil e ampliar a ajuda financeira ao país. Os custos ¿ que já passaram de meio trilhão de dólares ¿ subirão pelo menos mais US$7 bilhões. A expectativa é que Bagdá ¿ onde nas últimas 48 horas foram mortas mais de 100 pessoas ¿ será conquistada daqui a oito meses.

Bush, no entanto, evitou ser específico sobre a data em que as tropas americanas deixariam o país, insistindo que o melhor remédio seria manter um número maior de soldados no Iraque por mais algum tempo, do que iniciar uma retirada gradual, como têm sugerido os opositores:

¿ Dar um passo atrás agora causaria um colapso ao governo iraquiano. Faria com que nossas tropas fossem forçadas a permanecer no Iraque por um tempo ainda maior, e confrontar um inimigo que seria ainda mais letal ¿ diria em outro trecho.

Ao garantir que a nova estratégia militar foi aprovada pelo novo comando do Pentágono, Bush acabaria deixando claro, de forma indireta, que ela foi mais uma vez concebida na Casa Branca. Segundo o jornal ¿Washington Post¿, oficiais da cúpula revelaram que membros do Estado Maior das Forças Armadas continuam se opondo ao aumento de tropas e tiveram que engolir o novo plano.

Bush repetiria no discurso que os EUA estão engajados numa batalha que determinaria a direção da guerra contra o terror, e a segurança dos americanos em seu próprio território.

O Partido Democrata, maioria na Câmara e no Senado, reagiu imediatamente. Nancy Pelosi, presidente da Câmara, anunciou que convocará uma votação no Congresso sobre o aumento das tropas e os novos gastos da guerra:

¿ O povo americano perdeu a confiança no presidente. Uma votação sobre a proposta poderá lhe trazer de volta tal confiança. É uma lástima que não tenha havido consultas ao Congresso na preparação de uma estratégia que diz respeito à segurança do nosso povo ¿ disse ela.

Entidades cívicas anunciaram manifestações de protestos contra o novo plano, a serem realizadas a partir de hoje em várias cidades do país.