Título: JUÍZES DE PE E PA SÃO PRESOS POR GOLPE DE R$1 BI
Autor: Lins, Letícia
Fonte: O Globo, 12/01/2007, O País, p. 11

Magistrados são acusados de vender sentenças, e outros sete foram detidos; quadrilha atuava em nove estados

RECIFE. Nove pessoas, incluindo dois juízes de Pernambuco e do Pará, foram presas ontem, sob acusação de pertencerem a uma quadrilha que atua em nove estados, nos quais teriam aplicado golpes de mais de R$1 bilhão contra empresas públicas, de economia mista, privadas e em contas particulares inativas. Os juízes são acusados de usar os cargos, vendendo sentenças para facilitar a atuação do bando. A quadrilha operava a partir de Pernambuco, onde foi preso ontem o advogado João Bosco de Souza Coutinho, acusado de chefiar o esquema.

A Operação ¿Mãos Dadas¿ foi uma ação conjunta dos Ministérios Públicos de Pernambuco e do Pará, do Tribunal de Justiça de Pernambuco e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Os juízes Antônio de Pádua Casado de Araújo Cavalcanti e Maria José Correa Ferreira e seus comparsas foram denunciados pelo Ministério Público por estelionato, prevaricação, formação de quadrilha, falsificação de documentos, falsidade ideológica, falsa identidade e corrupção passiva. Eles tiveram as prisões preventivas decretadas pelo relator do processo, desembargador Bartolomeu Bueno, que autorizou a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico dos acusados e a perícia de documentos e equipamentos usados pelos golpistas.

Segundo o presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Fausto Freitas, a quadrilha também agia em Piauí, Pará, Maranhão, Amazonas, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Ele disse que o sigilo garantiu o sucesso da operação, deflagrada na madrugada de ontem. Houve cinco prisões em Pernambuco e quatro no Pará.

Ano passado, o juiz André Rui de Andrade Albuquerque, acusado de envolvimento com o esquema, foi preso em Recife, por ter participado de um golpe de R$990 mil. Alguns acusados da época aparecem também entre os denunciados. Em Pernambuco, cinco juízes afastados são investigados por suspeita de envolvimento. Eles respondem a processos administrativos.

¿- Foram apenas afastados, a lei os protege. Estamos aguardando que sejam denunciados criminalmente para tomarmos as providências devidas. Praticaram fraudes semelhantes aos outros dois ¿ afirmou Freitas.

¿ Se preciso, vamos cortar na carne para fazer a depuração do Judiciário ¿ disse Bueno.

Petrobras foi vítima de golpe, com resgate de títulos

Segundo o relator, os acusados se valeram do cargo público para ¿simular créditos, falsificar documentos, utilizar a máquina judiciária desse e de outros estados, promovendo medidas judiciais ilícitas, lastreadas em documentos inexistentes, inidôneos e falsos para o fim de obter vantagens ilícitas, provocando danos de grande monta às suas vítimas e ocultando ativos ilícitos. A motivação dessa conduta não pode ser outra senão a de enriquecer ilicitamente¿.

A quadrilha tentou dar, contra a Petrobras, um golpe de R$89.189.477, com o resgate de títulos podres emitidos ao portador entre 1955 e 1957, e que foram indevidamente validados pelo juiz Antônio Cavalcanti. O golpe contra a Petrobras não chegou a ser consumado. A empresa, ao saber do bloqueio de valor alto em suas contas, acionou o departamento jurídico e identificou a origem do saque.

Segundo a denúncia, o juiz ¿emitiu liminar autorizando o resgate de títulos sem que o autor da ação apresentasse documentos originais¿. A juíza Maria Ferreira, do Pará, é acusada de facilitar a autenticação de falsas cartas precatórias.

Segundo a investigação, a quadrilha deu golpes em empresas e em contas particulares. Obtinha liminares fraudulentas dadas por juízes e conseguia vultosas somas, pulverizadas depois em outras contas, para evitar rastreamento. Também usou títulos podres, que ganharam validade na Justiça.

Segundo o Ministério Público, o dinheiro do golpe seria lavado com a emissão de notas frias de vendas e depois redistribuído para diversas contas.