Título: Outra onda de lama a caminho
Autor: Costa, Célia e Engelbrecht, Daniel
Fonte: O Globo, 12/01/2007, Rio, p. 12

Poluição já atinge o Estado do Rio, mas uma segunda vaga deve chegar hoje

Alama química com rejeitos da mineradora Rio Pomba Cataguases que poluiu o Rio Muriaé chegou ontem ao município de Laje do Muriaé, o primeiro no Estado do Rio a ser afetado pelo desastre ambiental. A lama contendo bauxita e sulfato de alumínio percorreu 45km desde Miraí (MG), onde fica a barragem da empresa que se rompeu anteontem, e uma outra onda, com mais dejetos, deve chegar hoje à divisa do estado. Segundo o presidente da Feema, Axel Grael, que sobrevoou o Rio Muriaé no início da tarde de ontem, uma nova tromba d´água voltou a cair anteontem à noite sobre a barragem. Desta vez, no entanto, a quantidade de lama carreada para o ri é bem menor que os dois bilhões de litros que vazaram na madrugada de quarta-feira.

¿ Não dá para identificar visualmente a nova carga de lama que foi despejada no rio. Mas a textura da água é diferente em vários pontos ¿ disse o presidente da Feema.

Em um ou dois dias, a lama deve chegar a Itaperuna, 25km adiante. Ainda restam dentro da barragem em Miraí, segundo Grael, 40% dos resíduos que estavam depositados. Técnicos da Fundação do Meio Ambiente (Feam) de Minas Gerais e da Companhia de Saneamento de Minas (Copasa) trabalham na contenção do material para evitar novos vazamentos.

A chegada da lama interromperia o abastecimento de água em Laje do Muriaé. Ontem à tarde, a Cedae em Itaperuna decidiu interromper o abastecimento de água captada no Rio Muriaé no distrito de Comendador Venâncio, na área rural da cidade, por causa da lama química.

À tarde Laje do Muriaé já estava inundada pelo transbordamento do rio, cujas águas, empurradas pela lama que vazou da barragem, aumentaram de volume. Em alguns pontos do Centro, a água chegou a dois metros de altura. Segundo a Defesa Civil municipal, pelo menos 500 pessoas estão desabrigadas e 400, desalojadas. O prefeito José Geraldo decretou situação de emergência. A sede da prefeitura, a Câmara dos Vereadores, o Fórum, o Destacamento de Policiamento Ostensivo da PM, o Ciep e o único banco ficaram alagados. Até a barragem da Companhia Hidrelétrica Paulista foi coberta pela água.

A RJ-116, que corta a cidade, foi bloqueada e só canoas e lanchas passavam. Só uma farmácia e dois supermercados ficaram fora d´água e funcionando. O prefeito estimou o prejuízo em R$1 milhão. O estrago só não foi maior porque as autoridades locais foram informadas do rompimento da barragem ainda na madrugada de quarta-feira. Com isso, a Defesa Civil e a prefeitura conseguiram retirar as pessoas das áreas mais afetadas antes da chegada da enchente. Ainda assim, muitas pessoas perderam tudo, como o carpinteiro Walter Nascimento Murito, de 59 anos. Morador da Rua Ferreira Cesar, a principal da cidade, ele não estava em casa na manhã de anteontem e não conseguiu salvar móveis e eletrodomésticos:

¿ Quando cheguei em casa, já era tarde demais. Só consegui retirar roupas. Minha casa ficou com 1,5 metro de água ¿ lamentou.

Mortandade de peixes já começou

O diretor de Interior da Cedae, Heleno Silva, explicou que a cidade naturalmente sofreria com enchentes devido às chuvas dos últimos dias, mas a situação foi agravada pelo rompimento da barragem em Minas.

A Cedae montou um laboratório móvel na cidade para analisar a qualidade da água e mandou equipes de monitoramento para Muriaé (MG), onde a turbidez da água estava 19 vezes acima do tolerável para tratamento, e Patrocínio do Muriaé (MG), onde estava oito vezes acima. Diferentemente dos municípios fluminenses, as duas cidades mineiras retiram água de outros mananciais.

A intenção da Cedae é fazer o tratamento e distribuição até quando for possível. A capacidade da estação de Laje do Muriaé é de 20 litros por segundo. Para atender a população em caso de interrupção do abastecimento em Laje do Muriaé e Itaperuna, a empresa solicitou à Companhia de Saneamento de Minas (Copasa) 38 carros-pipa. Os primeiros começaram a chegar na tarde de ontem e foram enviados para Itaperuna, onde já faltava água em alguns bairros devido à enchente. A Copasa também ficou de enviar hoje 140 mil copos de água mineral, que serão distribuídos em escolas, asilos e hospitais de Itaperuna.

No fim da tarde a água começou a baixar em Laje do Muriaé. Sob o comando do coronel Moacir Pires, comandante regional da Defesa Civil, 35 homens do Corpo de Bombeiros estão na cidade auxiliando a população. Segundo ele, nenhum caso mais grave foi registrado.

Os efeitos no meio ambiente devem ser desastrosos. Embora a lama que vazou da barragem não seja, a princípio, tóxica, ela deve se acumular no fundo do Rio Muriaé, matando a fauna e a flora. Em Muriaé (MG), já havia mortandade de peixes ontem.

¿ Os efeitos no meio ambiente vão ser sentidos por mais de 20 anos ¿ estimou o diretor da Cedae.

* Enviado especial

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