Título: Sinal amarelo em Brasília
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 12/01/2007, O Mundo, p. 29

Planos de Chávez deixam governo Lula apreensivo com preservação da democracia na região

Um dia depois do discurso do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, pregando ¿socialismo ou morte¿, e anunciando uma série de nacionalizações, uma luz amarela acendeu no governo brasileiro. O Palácio do Planalto e o Itamaraty passaram a ver o anúncio com uma visão mais crítica, com preocupação focada na preservação da democracia na região. Segundo uma graduada fonte da área diplomática, na visão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, qualquer que seja a mudança no sistema de governo em um país, esta deve se dar mediante os princípios constitucionais ou com a aprovação do povo, via referendo ou plebiscito.

O fato de Chávez ter pedido ao Congresso ¿ onde tem ampla maioria ¿ plenos poderes para governar por decretos em sua empreitada de reestatização preocupa o governo. Lula pretende conversar pessoalmente com seu colega venezuelano sobre o assunto na próxima semana, no Rio, em um encontro paralelo à reunião de chefes de Estado do Mercosul, do qual a Venezuela faz parte.

Tensão com EUA é ruim para Mercosul

Fontes próximas ao presidente da República disseram ontem que Lula pretende fazer um apelo a Chávez, para que seja respeitado o Protocolo de Ushuaia. O documento foi assinado em 2001 e trata do compromisso democrático no Mercosul, na Bolívia e no Chile. Na época, esses eram os únicos países com acordos de preferências tarifárias firmados com o bloco.

Embora a Venezuela ainda não tenha se integrado totalmente ao Mercosul como membro pleno, pois depende de um prazo para se adequar, entre outras coisas, à Tarifa Externa Comum (TEC), o país tem direito a voz dentro do bloco e fala como membro da união aduaneira em fóruns internacionais. Por isso, afirmaram fontes, precisa cumprir o protocolo, chamado informalmente de cláusula democrática do Mercosul.

O documento não define o que é ordem democrática, mas indica que o Mercosul não admite rupturas e decisões unilaterais, sem a aprovação do Congresso e do povo. A punição máxima ao descumprimento do Protocolo de Ushuaia é a expulsão do país do bloco, medida que o governo brasileiro não gostaria de tomar, dada a importância da Venezuela para o Brasil e os demais países da região.

Outro foco de preocupação dentro do governo brasileiro diz respeito à forma como se dará a nacionalização dos setores de energia e telecomunicações na Venezuela, anunciada com destaque por Chávez. Isso significará o acirramento das tensões entre venezuelanos e americanos, prevêem técnicos. A conseqüência seria o fim de qualquer possibilidade de acordo de livre comércio com os Estados Unidos que o Mercosul vem tentando negociar há cinco anos.

A Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) anunciou ontem que prestará uma homenagem a Chávez no próximo dia 19, durante a visita dele ao Rio. Chávez receberá a medalha Tiradentes, homenagem máxima dada pela instituição. A iniciativa foi do deputado Paulo Ramos (PDT).