Título: A triste honra de levar o país ao golpe
Autor:
Fonte: O Globo, 13/01/2007, O Mundo, p. 33

Viúva de Perón assentou bases para a ditadura que traumatizou Argentina

MADRI. María Estela Martínez de Perón, mais conhecida por seu nome artístico Isabelita, foi presidente da Argentina por pouco mais de vinte meses, após a morte de seu marido, o general Juan Domingo Perón. A Isabelita coube a triste honra de ter levado o país a um dos momentos mais sinistros de sua agitada história e de ter assentado as bases para o golpe de Estado que resultou na terrível ditadura militar, com milhares de mortos e desaparecidos ¿ uns dez mil, segundo os levantamentos mais confiáveis.

Isabelita conheceu Perón em 1955, no Panamá, onde o general vivia exilado depois de ter sido derrubado pelos militares. Ela acompanhou Perón em seu exílio na Espanha e ali se tornou sua terceira mulher, sucessora da lendária Evita. Apesar das tentativas de dar-lhe uma aparência que lembrasse a de Evita, Isabelita não tinha o menor talento político e carecia por completo do carisma de sua antecessora. Entretanto, as necessidades do grande articulador que era Perón acabaram levando-a à mesmíssima Presidência da República, para desgraça do povo argentino.

O peronismo abarcava desde nazistas a guerrilheiros de extrema-esquerda. Para não tomar partido de uns ou outros, Perón colocou Isabelita como vice-presidente. Perón morreu em 1º de julho de 1974 e, no mesmo dia, Isabelita assumiu a Presidência já sob a influência nefasta de José López Rega, conhecido como o bruxo, uma versão latino-americana de Rasputín.

Cantor de boleros e policial, ele chegou ao todo-poderoso cargo de ministro do Bem-Estar Social de Isabelita. Práticas esotéricas, espiritismo e todo tipo de macumba os uniam. Foi López Rega, um ultradireitista com enorme potencial assassino, quem criou a tenebrosa Aliança Anticomunista Argentina, a Tríplice A, que se dedicou a assassinar e fazer desaparecer centenas de supostos esquerdistas e mesmo peronistas de tendências inimigas. O bando de assassinos contava com a proteção e o beneplácito de Isabelita.