Título: PT dispara fogo amigo por cargos
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 14/01/2007, O País, p. 3

Partido cobra postos de Lula, que deve receber indicações de Cabral e Dornelles

Pouco mais de dois meses depois do segundo turno das eleições, o Rio de Janeiro será palco de uma nova batalha política. No centro de uma disputa que deverá opor o PT a caciques da base aliada estão cerca de seis mil cargos federais ¿ a maior estrutura da União fora da capital ¿ e algumas jóias da coroa, como as cobiçadas direções da Petrobras e de Furnas. O PT do Rio vai apresentar, no próximo dia 25, uma lista de nomes que considera aptos para o preenchimento de algumas destas vagas ¿ os indicados e os cargos, por enquanto, são mantidos em segredo.

Será uma investida ousada, pois os próprios petistas admitem que terão de medir forças com o grupo do governador Sérgio Cabral Filho (PMDB), o senador Francisco Dornelles (PP) e representantes de outras forças políticas que apoiaram o presidente na eleição passada.

PT do Rio quer primeiro escalão

Mas o partido pensa alto. Alberto Cantalice, o presidente regional do PT, adianta que a lista será encabeçada por um nome para o primeiro escalão. Além dele, os petistas estão de olho ainda na Transpetro ¿ subsidiária da Petrobras responsável pelo transporte e pela armazenagem de petróleo e derivados, álcool e gás natural ¿, na TV Educativa, na Rádio MEC e na Financiadora Nacional de Projetos (Finep).

¿ Não queremos conflito com a base de apoio e nem a pecha de que estamos atrás de cargos ¿ diz, porém, Cantalice.

Dois argumentos vão sustentar os pedidos dos petistas fluminenses: a modesta representatividade do Rio no governo federal, no primeiro mandato, e uma suposta excelência de pessoal técnico para os cargos disponíveis.

¿ A Transpetro é fundamental para a implementação de uma política de revitalização dos nossos estaleiros ¿ argumenta o presidente regional do PT.

Não será uma disputa fácil. Sérgio Cabral e Dornelles são políticos vitoriosos, enquanto o PT, com Vladimir Palmeira, amargou um quarto lugar na disputa para o governo estadual. Os petistas sabem também que o interesse nos cargos do Rio ultrapassa as divisas do estado, no momento em que o presidente monta o seu segundo governo no contexto de um debate sobre a ¿despetização¿ da máquina federal.

Um importante aliado de Cabral reforça a tese do confronto ao antecipar o interesse do governador pela rede de comunicação federal:

¿ Dificilmente, Lula nomeará alguém para a TVE ou Rádio MEC sem consultar o governador. Sérgio tem vontade de montar programas nessas emissoras.

Lista de cargos enche os olhos

A relação de cargos, num estado que concentra quase 20% dos servidores federais, é de encher os olhos dos políticos mais ambiciosos: além de Petrobras e Furnas, o Rio de Janeiro abriga ainda a Eletrobras, a Fiocruz, o IBGE, o IRB, a Casa da Moeda, a Funarte, o BNDES e o Arquivo Nacional.

Outro obstáculo no caminho dos pleiteantes aos cargos é o corporativismo. Os próprios petistas tiveram oportunidade de testá-lo no Arquivo Nacional, no ano passado, quando tentaram nomear o funcionário de carreira Alexandre Rodrigues na direção geral do órgão. Houve protesto dos funcionários, pela permanência do diretor Jaime Antunes, e o PT teve de recuar.

¿ Não esperamos mudanças na grande maioria dos cargos, já preenchidos por pessoal de carreira. Achamos correto, mas às vezes há excessos ¿ lamenta Cantalice.

A história recente mostra que a distribuição de cargos no Rio, segundo critérios políticos, não foi benéfica para a população. Em 2005, no auge do escândalo do mensalão, o ex-deputado Roberto Jefferson (na época, aliado do governo Lula e presidente do PTB) foi acusado de montar um esquema de arrecadação de R$400 mil por mês para o PTB no IRB com a nomeação de amigos.

Mesmo os nomes ligados ao PT local não escaparam das denúncias. Manoel Severino, indicado pela ex-governadora Benedita da Silva para a presidência da Casa da Moeda, chegou a figurar na lista entregue por Marcos Valério às CPIs dos Correios e do Mensalão como o destinatário de R$2,676 milhões.

Em depoimento, Severino admitiu ter repassado a tarefa de resolver as dívidas da campanha a Carlos Manoel ¿ recentemente nomeado e demitido por Benedita (atual secretária de Ação Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro) no governo fluminense.

Os petistas insistem em dizer que não querem briga com os aliados de Lula, mas dificilmente escaparão dela se pretendem resistir ao processo de despetização do governo e a formação de uma equipe que não apenas amplie o espaço dos demais partidos governistas, principalmente o PMDB, mas também aumente a presença de personalidades sem filiação partidária.

Se levarem a cabo a determinação, podem transformar a ocupação de cargos federais no Rio numa espécie de terceiro turno eleitoral. A Transpetro, por exemplo, é presidida pelo ex-senador Sérgio Machado, do PMDB cearense. Há ainda o temor de perder espaço para a dupla Cabral-Dornelles.

Gil não é visto como nome fluminense

O presidente regional do PT afirma que, diferentemente dos anos anteriores, o partido desta vez trabalha unido. Derrotado na eleição para governador, vai alegar que tem hoje nove prefeituras no estado e participa de mais 25.

Ao contrário do primeiro mandato, quando o Diretório Estadual apresentou uma extensa lista de indicações, a relação desta vez será curta. Cantalice lamenta que, se em 2003 havia três representantes do Rio no Ministério de Lula ¿ Benedita da Silva, Miro Teixeira e Roberto Amaral ¿ o quadro hoje seria de ausência total.

¿ Não dá para considerar o Gilberto Gil um ministro do Rio. Ele é um nome nacional ¿ disse.

Os petistas não se conformam com a demissão de dois correligionários do Ministério da Cultura ¿ o o presidente da Funarte, Antônio Grassi, e o secretário de Articulação Institucional da pasta, o antropólogo Márcio Meira. O secretário nacional de Cultura do PT, Glauber Piva, acuso Gil de não consultar formalmente a legenda para trocar postos- chaves da pasta.