Título: Mensaleiros unidos
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 17/01/2007, O País, p. 3

Chinaglia (PT) fecha acordo com todos os partidos envolvidos no escândalo do mensalão

Fechou-se o circuito dos mensaleiros ao redor da candidatura de Arlindo Chinaglia (PT-SP) à presidência da Câmara. Depois de ter conseguido a adesão do PR (ex-PL), ele acertou ontem e fecha hoje, oficialmente, o apoio dos outros dois partidos que, como o PT, operaram o esquema do mensalão: PTB e PP. Nos últimos dias, Chinaglia fez uma intensa mobilização para atrair essas bancadas, o que deve fortalecer sua guerra contra a reeleição do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Em sua campanha, o petista trouxe de volta ao Congresso personagens citados no escândalo que motivou a maior crise política do primeiro governo Lula.

Ontem, circulavam com desenvoltura pelos corredores e gabinetes da Câmara pedindo votos para Chinaglia os ex-deputados Pedro Correa (PP-PE), cassado pelo plenário, e José Borba (PMDB-PR), que renunciou ao mandato para não ser cassado. Também passou pelo Salão Verde o ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PP-PE), que renunciou ao mandato depois do envolvimento no chamado escândalo do "mensalinho". Todos, em plena campanha por Chinaglia.

- O Chinaglia vai ganhar e tem o nosso apoio. Ele representa o pulso firme contra as covardias feitas em relação a esta Casa. Ele vai resgatar a Câmara. O escândalo do mensalão já é passado. Não tem mais nada a ser descoberto. Aliás, vários deputados pagaram com juros, correção monetária e multas por causa desse mensalão. A fatura já foi contabilizada e isso é matéria vencida - disse José Borba.

Nos bastidores, o deputado José Janene (PR), ex-líder do PP, tem telefonado para aliados cabalando votos. Nessas conversas, tem assegurado que Chinaglia sempre foi um aliado fiel e o trata como amigo. Dá seu testemunho que o petista esteve ao seu lado quando foi acusado de receber dinheiro do esquema do empresário Marcos Valério, pivô do mensalão. Janene foi absolvido em plenário no final de 2006, depois de quase um ano em que o seu processo ficou parado.

"A sociedade já fez seu julgamento"

No PT, o núcleo de coordenação da campanha de Chinaglia também é formado por deputados e ex-deputados do PT citados no escândalo do mensalão, entre eles João Paulo Cunha (SP), José Mentor (SP), Professor Luizinho (SP), Paulo Rocha (PA), além do deputado cassado e ex-ministro José Dirceu. A estratégia do grupo é retomar a influência na Câmara e no governo Lula. Ontem, o candidato evitou comentar o apoio dos partidos envolvidos no mensalão.

Na véspera, entretanto, ao receber a adesão do antigo PL, ele fez uma defesa enfática do apoio recebido. Disse que houve uma renovação do comando do PL, que no escândalo do mensalão era presidido pelo então deputado Valdemar Costa Neto (SP), que renunciou depois do episódio. O então líder do partido, Sandro Mabel (GO), que também foi envolvido e absolvido no plenário, é um dos coordenadores da campanha de Chinaglia.

- Em relação ao mensalão, vários partidos foram envolvidos. Esta é uma nova legislatura. Houve renovação. Quem se elegeu tem legitimidade. É bom lembrar que bancada antiga do PL foi decisiva para eleger o Aldo e ninguém disse nada. Imagina se eu fosse condenar cada instituição, partido, ou órgão de imprensa pelos erros do passado! Não sou responsável por cada deputado que votar em mim - afirmou Chinaglia.

Ontem, ele conversou com os líderes do PP, Mário Negromonte (BA), e do PTB, José Múcio (PE). Os dois lhe asseguraram que teria a maioria das bancadas. O PP tem 41 deputados, e o PTB, 24. Negromonte e Múcio classificaram de injusta a denominação de seus partidos como mensaleiros.

- Essa coisa de partido do mensalão não existe. Isso é julgar outra vez muitos que já foram julgados e condenados. A sociedade já fez o seu julgamento - reagiu Múcio.

Candidatos acirram troca de acusações

Petista chama Aldo de mentiroso e nega negociações com cargos e emendas

BRASÍLIA. A disputa pela presidência da Câmara transformou-se ontem num duelo verbal entre os candidatos Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que tenta a reeleição, e o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP). O acirramento foi motivado pelas declarações de Aldo da véspera. Em entrevista, ele acusou o adversário de oferecer cargos na Mesa, acordos regionais em pelo comando das Assembléias Legislativas da Bahia e São Paulo, ou promessas de ministérios em troca do apoio. Ontem, Chinaglia rebateu as afirmações e chamou seu adversário de irresponsável e mentiroso.

Na semana passada, Chinaglia recebeu o apoio do PSDB em troca de acordo para cargos na Mesa Diretora e nas Assembléias Legislativas de São Paulo e Bahia. O mesmo ocorreu com o PMDB, que anunciou apoio em troca do comando da Câmara em 2009 e do cargo de primeiro-secretário. Com o PR (ex-PL), o líder do governo avalizou a permanência do seu desafeto, Inocêncio Oliveira (PE), na Mesa.

- Como esses comentários vêm de um sujeito oculto, esse sujeito está trabalhando com irresponsabilidade - afirmou.

Informado de que as declarações eram de Aldo, foi contundente:

- Se alguém disse isso está mentindo.

Duas horas depois, no Salão Verde da Câmara, Aldo manteve o tom das críticas, embora evitando acusar diretamente o petista:

- A partir do noticiário divulgando a promessa de distribuição de cargos e liberação de emendas, na condição de candidato que possa ser atingido por esse tipo de movimento, devo censurar esse tipo de ação.

Questionado se acreditava que Chinaglia estava prometendo liberar emendas e cargos em troca de votos, Aldo disse que desconfiava:

- A gente não acredita em tudo, mas desconfia de muita coisa.

Lula fica no Planalto e diz que quer ficar afastado da campanha

Indagado se a corneta de Chinaglia não estava soando mais forte do que a sua, já que tem conseguido mais declarações de apoio, Aldo disse que há flancos descobertos na campanha do adversário. A corneta é o símbolo da campanha de Aldo, referência ao Corneteiro de Pirajá, personagem essencial na vitória brasileira sobre os portugueses na Bahia, em 1823.

- Minha corneta foi tocada há algum tempo. Já estamos na ação, que foi conseqüência do toque de avançar. Agora estamos em plena batalha. Há muitos flancos descobertos no exército do meu adversário, há muita vulnerabilidade. Estamos com força firme e concentrada e minha estratégia é mais eficiente.

Em seu segundo dia de trabalho após as férias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou o dia em reuniões com os ministros da coordenação política, além dos ministros da área econômica Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento). Lula tem dito que quer se manter afastado, pelo menos diretamente, da disputa na Câmara.(G.C.)

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