Título: Espero que o BC não atrapalhe muito. Por que não atrapalhar é utopia
Autor: Cotta, Sueli e Amora, Dimmi
Fonte: O Globo, 24/01/2007, Economia, p. 22

Economista destaca garantia de que investimentos não serão contingenciados

O economista Paulo Nogueira Batista Júnior, professor da Fundação Getúlio Vargas, acredita que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) poderá, sim, incentivar investimentos privados, pois ataca os gargalos de infra-estrutura do país. Mas teme que, enquanto o governo ¿acelera¿, o Banco Central ¿puxe o freio de mão¿ da economia.

Qual é sua avaliação do PAC?

PAULO NOGUEIRA BATISTA JÚNIOR: As mudanças vão na direção correta. Desde o tempo do presidente Figueiredo (1979-1985), o Brasil não cresce de forma acelerada. Estamos numa semi-estagnação alternada com vôos de galinha. E com o pano de fundo vexaminoso do resto do mundo em geral indo bem melhor, sobretudo os emergentes. Então, o foco é correto ao começar o segundo governo com um programa de aceleração do crescimento. Há uma nova atitude, que diferencia este programa do primeiro mandato do Lula e mesmo do ¿Avança Brasil¿ do Fernando Henrique, quando os projetos eram contingenciados. Está claro que os recursos previstos no PPI (Projeto-Piloto de Investimentos, que será excluído do cálculo do superávit fiscal primário) não estão sujeitos a contingenciamento.

O senhor acredita, então, que o PAC vai cumprir seu objetivo de acelerar o crescimento?

PAULO NOGUEIRA: A situação econômica está melhor e houve uma mudança de percepção do presidente. A parte mais importante do PAC é o programa de investimentos em infra-estrutura. Procura atacar deficiências graves que nos levaram a um apagão elétrico em 2001, um apagão aeroportuário em 2006 e a um apagão nas estradas. E são problemas que dificilmente se consegue resolver com investimentos privados. O último grande programa de investimentos públicos que tivemos foi o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), do governo Geisel (1974-1979).

E quanto aos investimentos privados? Estes virão na magnitude prevista pelo governo?

PAULO NOGUEIRA: O governo está contando com uma visão keynesiana (do economista britânico John Maynard Keynes) de que o investimento público vai abrir caminho para o investimento privado. É uma hipótese plausível para o Brasil, dado que existe uma capacidade ociosa na economia e que um dos fatores que inibem o investimento privado é a insegurança quanto à oferta e ao custo de infra-estrutura. Então, o investimento público terá dupla função: sinalizar o objetivo de estimular a economia e atacar os gargalos de infra-estrutura.

Com isso, será possível aumentar os investimentos privados?

PAULO NOGUEIRA: O setor privado depende de outras coisas. Pode ser que não seja suficiente. A carga tributária continua grande, a taxa de juros é elevada e o câmbio está muito valorizado, em parte devido aos juros altos. Espero que o Banco Central (BC) não atrapalhe, muito. Porque dizer apenas que espero que não atrapalhe é utopia. Se houver uma combinação de câmbio e juros hostil ao investimento privado, as medidas do PAC podem ser ineficazes.

Hoje o BC decide a nova taxa básica de juros. O PAC poderá influenciar?

PAULO NOGUEIRA: Se sair um corte de só 0,25 ponto percentual isso vai ser interpretado como um sinal contraditório ao do PAC. Mesmo que se alegue que na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária do BC) a diretoria já estava rachada, um ritmo de corte mais lento vai ser interpretado como o governo acelerando e o BC puxando o freio de mão. O risco é que o BC, na prática, é excessivamente autônomo. Então, pode haver um movimento contraditório.