Título: Senado rejeita pedido de tropas de Bush
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Fonte: O Globo, 25/01/2007, O Mundo, p. 34

Comissão diz que envio de mais soldados é contrário aos interesses dos EUA, um dia após discurso a congressistas

Menos de 24 horas depois de pedir ao Congresso para dar uma oportunidade de sua ordem de enviar mais soldados para o Iraque dar certo, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, foi desafiado pelo Senado. A comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou uma resolução que afirma que a idéia do presidente "não atende aos interesses nacionais dos EUA". A medida, que deverá ser votada no plenário do Senado semana que vem, foi o primeiro sinal de que a nova maioria democrata não apoiará o presidente republicano a continuar a impopular guerra no Iraque.

A resolução foi aprovada por 12 votos a 9 na comissão, contando com o voto dos 11 democratas e até mesmo o de um senador republicano, Chuck Hagel, um dos autores da proposta. Ela, porém, não tem caráter vinculante. Ou seja, o presidente não é obrigado a obedecê-la, e, inclusive, já deu sinais, através de declarações feitas pelo vice-presidente Dick Cheney, de que irá ignorá-la. Mas a decisão isola o presidente.

O presidente da comissão, o senador democrata Joseph Biden, dirigiu palavras duras a Bush.

- Esta medida é uma tentativa de poupar o presidente de cometer um erro significativo - disse Biden. - Este é um sinal. Senhor presidente, por favor não faça isso.

O fato de a votação ter seguido linhas partidárias não significa que os democratas estão sozinhos na oposição aos planos de Bush. Vários dos senadores republicanos da comissão demonstraram que seu rechaço à resolução era mais uma questão de defender a imagem dos EUA no exterior do que concordância com a ação do presidente.

- Não precisamos de uma resolução para confirmar que há um grande desconforto com a guerra - disse o líder republicano na comissão, Richard Lugar.

Para ele, a medida é "o equivalente legislativo a uma forte mordida" e mostraria que o Congresso lava as mãos em relação à sua responsabilidade pela guerra e "enfraqueceria os EUA" aos olhos de observadores estrangeiros.

Outros senadores, no entanto, queriam medidas mais fortes, como o corte de fundos adicionais para a guerra ou a adoção de limites para o número de soldados.

Hillary e Obama criticam presidente

No discurso anual sobre o Estado da União, terça-feira no Congresso, Bush utilizou um tom mais conciliador diante do Congresso de maioria democrata. Mas não recuou um milímetro em sua decisão de enviar mais 21,5 mil soldados para o Iraque para, segundo seu plano, garantir a segurança de Bagdá e da província de Anbar.

- Esta não é a luta na qual entramos no Iraque, mas é a luta na qual estamos agora - disse o presidente.

Bush teve dificuldades para conseguir aplausos até mesmo da ala republicana do Congresso quando falava da guerra. Especialistas ressaltaram que o presidente, ou um de seus redatores de discurso, utilizou um truque retórico para evitar terminar esta parte da sua declaração diante de um silêncio constrangedor. Na última frase, terminou afirmando que era preciso "apoiar nossas tropas", frase que torna politicamente obrigatório o aplauso de um congressista nos EUA.

- Nunca tinha ouvido um silêncio tão ensurdecedor quando um presidente falava o trecho mais importante de seu programa - disse o senador Biden.

Outros congressistas de destaque também ressaltaram que o discurso de Bush não mudou o fato de que a guerra no Iraque é um fracasso e que os EUA não deveriam continuar no meio de uma guerra civil. Uma das principais críticas veio da senadora Hillary Clinton, pré-candidata do Partido Democrata à Presidência em 2008:

- Em vez de delinear um novo rumo no Iraque, que incluísse a solução política desesperadamente necessária, para que possamos trazer nossos soldados de volta para casa, o presidente continuou a sua defesa de uma estratégia fracassada e seu plano de fazer uma escalada na guerra no Iraque.

O também pré-candidato e senador democrata Barack Obama ressaltou o fato de Bush estar isolado até mesmo em seu partido:

- O interessante foi a falta de entusiasmo dos republicanos. Havia no Congresso um grande ceticismo. Ceticismo que se reflete no povo americano por sua escalada nas tropas e a continuação de uma estratégia que não funcionou.

Já pré-candidatos presidenciais do Partido Republicano, como o senador John McCain e o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, tentaram frisar outros trechos do discurso. McCain, por exemplo, citou as menções à mudança do clima mundial e à imigração.

- Acho que o presidente está tentando, de certo modo, não ir além do Iraque, mas nos lembrar que há muitos outros assuntos e coisas que nos preocupam para que criemos um futuro melhor. O Iraque é parte disso, mas não é a única parte - tentou explicar Giuliani.