Título: Chinaglia sob fogo cerrado
Autor: Braga, Isabel e Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 30/01/2007, O País, p. 3

Aldo e Fruet pressionam petista em debate dos candidatos à presidência da Câmara.

O debate promovido ontem pela TV Câmara entre os três candidatos à presidência da Casa ¿ Arlindo Chinaglia (PT-SP), Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Gustavo Fruet (PSDB-PR) ¿ mostrou que a acirrada disputa deixará seqüelas, especialmente na base governista. Chinaglia, que detém hoje o maior leque de apoios oficiais, acabou acuado com ataques disparados tanto por Aldo, que condenou a concentração de poderes nas mãos do PT, como por Fruet, que insinuou que a candidatura do petista seria patrocinada pelos partidos que mais produziram escândalos. Mesmo irritado, Chinaglia se conteve ao responder Aldo, mas apelou para a ironia ao rebater o tucano:

¿ Espero que o Fruet não tenha incluído entre essas forças a decisão do PSDB, que apoiou primeiro a mim e só depois mudou.

Fruet retrucou dizendo que Chinaglia parecia inconformado com a mudança de posição do PSDB. E no fim do debate, foi ainda mais duro:

¿ Imagina como será com ele presidente da Câmara. Para assumir esse cargo é preciso ter postura, serenidade. É quase um caso para a psiquiatria essa inconformidade dele com a decisão do PSDB. Se eleito, Chinaglia será uma fonte de conflito permanente.

Fugindo ao estilo pacato, Aldo também não perdeu a oportunidade:

¿ Nada tenho contra os meus concorrentes, principalmente contra aquele que é de um partido aliado, do PT. Mas não creio que, em nome da democracia e do equilíbrio dos poderes do país, se deva dar ainda mais força e poder a um único partido. Não julgo prudente, não acho que seja bom para o país nem para o próprio PT tamanha concentração de poder.

Diante do tiroteio, Chinaglia pediu direito de resposta até quando foi citado por uma jornalista que perguntava a Aldo se ele reabriria os processos contra pelo menos dois deputados que renunciaram ao mandato na legislatura passada ¿ Paulo Rocha (PT-PA) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) ¿ para escapar da cassação. O petista evitou, contudo, se posicionar, mas teve de ser mais enfático quando Fruet levantou suspeitas de que Chinaglia estaria disposto a patrocinar a anistia do ex-deputado José Dirceu.

¿ Desafio Vossa Excelência ou qualquer outro a provar que eu esteja colocando minha candidatura para promover a anistia do ex-deputado José Dirceu ¿ provocou.

O presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), defendeu Chinaglia e se queixou das declarações de Aldo:

¿ Não foi um gesto elegante. Ele tentou criar um ambiente de rejeição ao PT que não existe.

SALÁRIOS: Os candidatos unificaram o discurso sobre o aumento dos subsídios. Defenderam que de forma imediata seja votado em plenário um aumento repondo a inflação do período (cerca de 16%). Aldo defendeu, a longo prazo, teto único para os representantes dos três poderes, lembrando que hoje um ministro do STF ganha quase três vezes o que ganha o presidente da República. E pregou que até a instituição do teto do funcionalismo, o salário dos ministros do STF fiquem congelados. Chinaglia também defendeu o teto, além do reajuste com base na inflação. O petista criticou a interferência do STF no aumento de 90,7% aos parlamentares concedido por ato das Mesas da Câmara e do Senado.¿Não cabe ao Judiciário legislar. Os três poderes têm independência e harmonia entre si¿, disse Chinaglia. Fruet defendeu a reposição pela inflação, mas alertou que é preciso ter cuidado para que o debate sobre o teto não leve a aumentos generalizados.

REFORMA POLÍTICA: Chinaglia prometeu retomar a discussão sobre reforma política e estabelecer um prazo para a votação. Mas ressaltou que a reforma ideal não acontecerá a curto prazo. O petista não se posicionou contra ou a favor da cláusula de barreira (que estabelece condições para o funcionamento parlamentar), derrubada recentemente pelo STF. Aldo, que é contra a cláusula, defendeu os pequenos partidos, afirmando que a liberdade política deve ser tão importante quanto a religiosa ou de imprensa. Fruet pregou a reforma para sanar o que chamou de vícios da política. Citou o acordo entre PT e PMDB para a eleição de Chinaglia, e o fato de o presidente Lula não ter nomeado o novo Ministério, aguardando o resultado da eleição na Câmara.

MENSALÃO: Fruet acusou a candidatura petista de ser a simbologia das forças que marcaram a crise política, provocando reação dura de Chinaglia. Foi um dos momentos mais tensos entre os dois no debate. Fruet afirmou que Chinaglia contava até com o apoio de Severino Cavalcanti e que teria que se conformar com a nova decisão do PSDB, de ter candidatura própria. Chinaglia reagiu afirmando que, antes da candidatura do tucano, obteve o apoio formal do PSDB, e cobrou respeito aos partidos. Segundo o petista, as siglas não podem ser punidas pelos pecados que alguns cometem e que as acusações não tiram a autoridade dos partidos. Chinaglia insistiu na legitimidade popular dos que, mesmo acusados de participação no esquema, foram eleitos no ano passado. Aldo não se manifestou sobre esse assunto.

REABERTURA DE PROCESSOS: Aldo disse que regimentalmente é possível reabrir processos contra deputados que renunciaram para escapar de cassação, como é o caso do petista Paulo Rocha (PA) e Valdemar Costa Neto (PR-SP), e que ganharam novos mandatos em outubro. Enfatizou, contudo, que é preciso iniciativa de partido ou do corregedor da Câmara. Não respondeu se reabrirá ou não os processos, se eleito. ¿É possível combinar o respeito às urnas, que é a instituição mais sagrada da democracia, com o respeito ao Regimento Interno da Casa, que é também um instrumento da democracia¿, disse. Chinaglia, em entrevista após o debate, disse não ter opinião formada sobre a reabertura de processos. Disse que se o conjunto de partidos da Casa não representar, é uma pista para não reabrir. Mas falou em respeito à vontade popular: ¿Discordo que haja partidos de mensaleiros. Houve uma renovação pelas urnas. Todos os novos deputados foram eleitos. Não posso expurgar a vontade popular¿. Fruet não se manifestou diretamente sobre o assunto, mas disse que o compromisso do parlamentar com a sociedade não acaba com o resultado das urnas.

ANISTIA A DIRCEU: Chinaglia, provocado por Fruet, não afirmou se é contra ou a favor da anistia ao ex-ministro e ex-deputado José Dirceu, cassado por envolvimento no mensalão. Desafiou o tucano a provar que esteja trabalhando para anistiar Dirceu, mas disse que se chegar à Casa um projeto de iniciativa popular nesse sentido, com mais de um milhão de assinaturas, submeterá ao plenário. Em entrevista, Chinaglia disse que não irá patrocionar a anistia. ¿Se vem um projeto de iniciativa popular, com que autoridade vou dizer que não será pautado? Esses milhões que assinarem têm o direito de ver a proposta tramitar. O resultado quem dará é o plenário¿. Após o debate, Fruet disse ser contra a anistia, mas que se houver projeto de iniciativa popular, seguirá o regimento. ¿É colocar combustível numa fogueira que estava se apagando¿. afirmou Fruet. Aldo não se manifestou sobre esse tema.

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