Título: A volta ao Senado, 14 anos depois do impeachment
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 02/02/2007, O País, p. 10

Collor toma posse e troca afagos com antigos aliados e com ex-adversários políticos

BRASÍLIA. Com cabelos bem pretos, assim como o terno e a gravata, e uma imagem de Nossa Senhora de Fátima na lapela, o ex-presidente Fernando Collor de Mello assumiu ontem seu mandato de senador na mesma Casa que há 14 anos lhe cassou os direitos políticos, com a confirmação do seu impeachment no dia 30 de dezembro de 1992. O primeiro voto como senador, Collor deu ao conterrâneo Renan Calheiros (PMDB-AL), que se elegeu presidente do Senado.

Os dois alagoanos passaram de aliados a inimigos ainda no governo Collor. Depois de dez anos de rompimento, eles se reconciliaram há poucos dias. Ontem, num encontro formal, o ex-presidente declarou que votaria no conterrâneo.

Num estilo bem diferente ao adotado quando presidente, Collor promete adotar um comportamento discreto. Pelo menos até conhecer melhor o Senado e estabelecer uma relação mais cordial com antigos adversários, como o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), e mesmo alguns algozes, como os senadores Pedro Simon (PMDB-RS) e Eduardo Suplicy (PT-SP), que votaram a favor do seu impeachment.

Ontem mesmo, ele fez questão de cumprimentar os três e ouviu de Suplicy explicações sobre o pedido de abertura da CPI que desembocou no seu impeachment. Suplicy o abordou para dizer estar certo de que os dois vão conviver de maneira civilizada, apesar das diferenças políticas.

O petista contou que, em 1992, ele e o então deputado José Dirceu passaram seis horas em um hotel conversando com seu irmão, Pedro Collor, que revelou os escândalos de seu governo. Disse que foi durante essa conversa que reuniram informações suficientes para garantir a abertura do processo que deu no impeachment do senhor. Suplicy disse a Collor que se passou muito tempo e que o povo de Alagoas o absolveu concedendo-lhe o mandato de senador.

Eleito pelo PRTB, o novo senador deverá trocar de legenda ainda hoje, assinando a ficha de filiação do PTB, passando a integrar oficialmente a base de sustentação do governo Lula. Collor foi levado ao novo partido pelo o ex-deputado Roberto Jefferson.

Para Collor, isso está longe de ser um problema. Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha sido seu principal adversário na eleição de 1989 e o PT um dos partidos mais ativos em seu impeachment, o ex-presidente diz que não guarda ressentimentos. Ele promete ajudar o governo no que for possível.

- Naquilo que estiver ao meu alcance, ajudarei a dar sustentação ao governo Lula, que tem exercido bem seu papel e merece a colaboração de todos que querem ver o país continuar avançando. O que passou, passou. Aprendi que é melhor olhar para a frente, sem mágoas ou ressentimentos. Faço isso, não em homenagem aos meus adversários, mas pensando na minha própria saúde - disse o ex-presidente.

No primeiro discurso que fará da tribuna, Collor promete dar sua versão dos fatos durante o período em que presidiu o país.

- É uma sensação boa entrar como senador no plenário que cassou meus direitos políticos. Boa por saber que agora tenho uma tribuna onde poderei dar minha versão sobre tudo que me aconteceu. Considero que esse é um dever meu perante a nação brasileira. Mas antes quero me ambientar e conhecer as peculiaridades da Casa - antecipa.

Até lá, ele pretende se dedicar à elaboração de uma proposta de reforma política. Sua idéia é propor a mudança do sistema presidencialista.

- O presidencialismo é a carroça do sistema político brasileiro, já está ultrapassado - dispara.