Título: Pagar o PAC
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 04/02/2007, O Globo, p. 2

Se tudo o que o presidente Lula quer é a aprovação pacífica das medidas do PAC ¿ tendo por isso lavado as mãos na disputa entre aliados pela presidência da Câmara ¿ deve ir se preparando para extenuantes negociações. Por razões diferentes, todos ali agora estão em busca de um bom escudo político. Vamos assistir a um campeonato de ¿desenvolvimentismo¿.

O PT, depois da forte inclinação à direita para garantir a vitória de Arlindo Chinaglia, ensaia vestir a velha camisa vermelha. O bloco derrotado que apoiou Aldo Rebelo (PSB-PDT-PCdoB), tratará de se descolar do PT e demarcar seu lugar no campo da esquerda. O PSDB, depois de garantir a vitória do petista, tentará amansar sua espantada base social tirando do armário o discurso social-democrata e a bandeira federativa. Todos, por essas diferentes razões, prometem jogar duro com o governo e forçar a negociação de mudanças nas medidas do PAC. A ministra Dilma, quando foi ao Congresso na sexta-feira levar uma mensagem de Lula com todo o foco na necessidade aprovar as medidas, pressentiu o clima: admitiu que o PAC é negociável, embora já tenha dito, em outro momento, que o governo chegou ao limite, seja no gasto, na desoneração ou na redução do superávit.

Ao receber a mensagem de Lula, um Arlindo ainda jubiloso com a vitória, fez o discurso do cavaleiro fiel. Mas, entre seu discurso e o do peemedebista Renan Calheiros, reeleito no Senado, houve uma diferença sutil, que pode ser semântica. Renan disse partilhar do otimismo do governo com o plano. O petista disse que ¿a Câmara trabalhará para tornar o plano operacional¿. O que isso significa, ainda veremos.

Petistas que estiveram na linha de frente de sua campanha andam dizendo que o PT vai surpreender, nesta legislatura, com suas demonstrações de independência ao defender com firmeza suas bandeiras. E adiantam algumas linhas: vão brigar pela queda mais acelerada nos juros e mais ousadia no investimento do governo, segundo o postulado de que caberá ao Estado dar passos mais largos para estimular o crescimento da economia. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que prepare o lombo.

O PSDB, mais que todos os partidos, procura desesperadamente reunir sua tropa pelo menos em torno de um discurso, enquanto não tropeça num projeto ou numa estratégia. Vão brigar para ampliar as desonerações tributárias (no que somará com o PFL) e sobretudo pelas questões federativas: revisão da partilha de alguns impostos e redefinição dos projetos nos estados. O governador de Minas, Aécio Neves, pegou primeiro esta bandeira. Ao marcar uma reunião com os governadores, Lula facilitou a vida deles, puxando-os para o cenário.

Por fim, o bloco de esquerda, que sempre serviu a Lula e ao PT, vai pôr preço político nos seus 70 votos. Ciro Gomes (PSB) anda dizendo que cada medida será minuciosamente discutida e negociada. Paulinho, da Força Sindical (PDT) avisa que nenhuma medida que fira direitos dos trabalhadores terá os votos do partido. Do jeito que está proposto, diz ele, o fundo de investimento com recursos do FGTS não será aprovado. Nem que o governo venha a apresentar garantias do Tesouro. A fórmula terá que ser a mesma adotada na pulverização das ações do Banco do Brasil e da Vale: o projeto vai ter que existir e mostrar sua viabilidade para que cada trabalhador decida investir nele ou não.

Se as coisas se passarem assim mesmo, Lula vai depender mais ainda do PMDB. Mas ele escolheu. Se tivesse, na hora certa, escolhido um de seus aliados e evitado a disputa, estaria no paraíso. Disporia de uma larga e unida base parlamentar.