Título: Queda da CPMF foi descartada
Autor: Jungblut, Cristiane e Barbosa, Flávia
Fonte: O Globo, 05/02/2007, Economia, p. 16

Ministro do Planejamento diz que demorará seis meses para o PAC acontecer.

BRASÍLIA. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, desconversa. Mas o tempo que tem dedicado ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) revela que sua permanência é certa na Esplanada. É com essa intimidade com o ¿fio condutor do segundo mandato¿ que afirma que demorará seis meses para a máquina pública ¿ficar azeitada¿ e o plano acontecer. E que não se pense em alterá-lo. Às críticas de que a questão fiscal merecia tratamento mais rigoroso, responde que ¿gestão é a palavra de ordem¿ e que a União não pode abrir mão de receita. Por isso, a alíquota de 0,38% da CPMF será mantida na proposta de prorrogação do governo, provavelmente por dez anos ¿ foi descartada a queda gradual. Para ele, a sociedade quer investimento: ¿O PAC foi feito para acelerar! Acabou a era do (superávit de) 4,8%. A era agora é de ousar¿. Num aviso aos governadores, afirmou que o PAC é federal e não adianta querer ¿levar vantagem¿ com sua adoção. Somente uma ou outra reivindicação considera factível. Renegociar dívida não é uma delas, pois seria ¿abrir uma caixa de Pandora¿. ¿Quando estou com fome...¿, brincou o ministro, tentando amenizar o tom do recado, em alusão ao fato de a entrevista exclusiva ao GLOBO ter avançado sobre a hora de seu almoço.

Cristiane Jungblut e Flávia BarbosaCom o resultado da eleição do Congresso, quais são as perspectivas de aprovação do PAC?PAULO BERNARDO: O Congresso teve dias muitos turbulentos, tudo isso prejudicou o andamento e a imagem. A eleição encerrou uma fase. Os parlamentares, mesmo da oposição, vão ter muito mais interesse em discutir o mérito das propostas. Então, vamos fazer um verdadeiro corpo-a-corpo no Congresso, com ministros e técnicos, para explicar as medidas.Sem atender às reivindicações dos governadores, há condição de se aprovar o PAC?BERNARDO: Talvez eu seja muito taxativo, mas fizemos um programa de aceleração do crescimento considerando aquilo que é nossa responsabilidade, que temos condição de fazer. Esse é o nosso programa. O presidente achou que deveríamos convidar os governadores (para o anúncio) porque vamos fazer empreendimentos que terão impactos enormes nos estados.Os governadores argumentam que tinham outra lista de obras...BERNARDO: Pega o Rio, vai experimentar um volume enorme de investimentos: porto, pólo petroquímico. É importantíssimo, pois o Rio está numa situação que alguns chamam de decadência econômica. São Paulo tem o Rodoanel, com previsão de investimento federal de R$1,2 bilhão. O volume de investimentos em Minas é muito expressivo. Quando saíram as reações, imaginava que diriam: olha, não quero o Rodoanel, quero o Porto de Santos, não quero as 700 vagas no aeroporto (de Confins, em Minas), quero em outra... O que se verificou depois é que os governadores têm é uma agenda de reivindicações paralela. Vamos separar.Mas os governadores não podem ser uma barreira?BERNARDO: Os parlamentares não são seguidores automáticos de governador algum. Normalmente, o Congresso se comporta de maneira autônoma. E, como tem muitos investimentos, é difícil o parlamentar de Minas ou o de São Paulo dizer que não vai aprovar. Acho absurda a idéia de pensar que algum governador vá fazer trabalho contra. Agora, reivindicações são normais. Temos que sentar e discutir.Dividir a CPMF está mesmo fora de questão?BERNARDO: O esforço é para aumentar o investimento sem deixar de lado a responsabilidade fiscal. Quando vem uma reivindicação, tem que ver como é que vou atender as despesas com assistência social, saúde e previdência, o que os governadores querem fazer com esse dinheiro. Não posso pensar que porque o governo federal montou seu programa e vai ter que dialogar com o Congresso, que alguém tem que tirar vantagem disso.O governo pode atender aos pedidos sobre Fundeb, DRE, Cide, renegociar dívida?BERNARDO: Falando francamente, a equipe econômica já foi empurrada pelo presidente (no caso do Fundeb), colocando quase R$5 bilhões para financiar a educação básica. Claro que é razoável discutir com os governadores, mas tem que lembrar que tem uma coisa chamada prefeitos. Sobre Cide, não posso dizer a priori se o governo é contra ou a favor. DRE (Desvinculação das Receitas dos Estados) é possível, por que não? Mas flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal (os estados querem três anos de carência para recomeçar a pagar a dívida) é um absurdo. Isso aí é abrir uma caixa de Pandora.O que o presidente Lula levará, então, à reunião do dia 6 de março?BERNARDO: O principal ponto é a Reforma Tributária. Mas tem que ter condição de fazer. Quando chega ao Congresso, é um contra o outro e todo mundo contra o contribuinte. Queremos fazer Reforma tributária para simplificar, diminuir carga tributária. Se for cada um olhando para seu umbigo, teria que depenar o contribuinte mais ainda. Queremos ouvir e dialogar. Não ficar essa barafunda, guerra fiscal. Mas não é simples. A última grande reforma foi feita no ICMS, em 1967. Naquele tempo era moleza, era só fazer um decreto-lei.O governo diz que a reforma é prioridade, mas pedirá prorrogação da CPMF, que era para ser temporária. A proposta já foi fechada?BERNARDO: Tem que prorrogar. Não temos condição de abrir mão nem da DRU (Desvinculação das Receitas da União) nem da CPMF, temos que fechar as contas. Acho que, se a prorrogação da CPMF fosse por dez anos, seria melhor. Mas teremos que combinar com o Congresso. Já a queda progressiva da alíquota que eu defendia, de 0,38%, até 0,08%, quando ficaria apenas um imposto fiscalizatório, foi descartada. O argumento da Fazenda é bem razoável: devemos continuar fazendo o esforço de desonerar setorialmente, porque temos limite.Os servidores já estão ameaçando fazer um movimento contra o limite fixado para a expansão anual da folha salarial dos Três Poderes, de 1,5% mais inflação.BERNARDO: Fizemos uma proposta que não pode ser taxada de arrocho salarial, nem de indexação. É o limite máximo. Não quer dizer que não tem reajuste de salário. As reações dos sindicatos são normais, pois eles têm como objetivo melhorar as coisas para o trabalhador. Nós, aqui, não estamos lutando para melhorar salário de ninguém. Queremos cuidar do equilíbrio das contas e garantir previsibilidade.Como compatibilizar contratações previstas com o teto da folha?BERNARDO: Se você trocar terceirizados por concursados, isso não vai ser considerado aumento. A não ser que gaste mais. Embora seja singelo, o teto coloca uma questão crucial: discutir produtividade, qualidade e eficiência. Quem disse que, ao substituir mil terceirizados, não posso contratar só 800 servidores?Parece uma resposta à crítica de que o PAC é muito tímido no corte de despesas.BERNARDO: Esse mantra de alguns analistas de que tem que cortar gastos, como conceito geral é válido. Mas não pode ser aplicado a qualquer coisa. A concepção do PAC é: precisamos gastar melhor. O presidente está cobrando isso. O que está no nosso horizonte não é só ¿tem que cortar, cortar, cortar¿. A sociedade hoje tem uma demanda por infra-estrutura, pelo social. Uma grande parcela (do investimento) vai ser feita com recursos privados. Mas a presença do setor público é fundamental.A palavra de ordem é gestão, não corte?BERNARDO: O Estado precisa estar preparado para executar, porque os investimentos orçamentários e estatais do PAC são ambiciosos. Chegamos à conclusão de que tinha que ter um Comitê Gestor para que os investimentos não sejam simplesmente um plano anunciado, que, daqui a um ano, saiam matérias desastrosas para o país, dizendo que não andou. Gestão é a palavra-chave. Se não tivermos muita gestão, há grandes chances de as coisas darem errado.Com mais gasto público, o senhor não teme uma sinalização ruim com a provável redução do superávit?BERNARDO: O governo já se compromissou com a responsabilidade fiscal. Sinalização agora é coisa para 2010 (ano de eleição). Há demandas outras na sociedade, como crescimento. O PAC foi feito para acelerar! Acabou a era do (superávit de) 4,8%. A era agora é de ousar.Mas o PAC é um conjunto de intenções. Quando terá efeito prático?BERNARDO: Vamos acompanhar semanalmente o andamento de todos esses projetos e não deixar que os problemas se avolumem. Provavelmente, vamos ter um período, imagino de uns seis meses, para obter licenças ambientais, modelar, licitar, fazer tudo isso ficar azeitado, (para) a máquina trabalhar azeitada. Depois, o fluxo de execução será mais contínuo.