Título: Itamaraty: Lafer põe lenha na fogueira da crise
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 07/02/2007, O País, p. 12

Ex-ministro das Relações Exteriores diz que, com Lula, há promoção por afinidade ideológica e erros na política externa

Flávio Freire

SÃO PAULO. O ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer não só endossou as críticas feitas pelo ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos Roberto Abdenur ao Itamaraty, como jogou mais lenha na fogueira. Lafer disse que, na gestão do presidente Lula, a carreira de diplomata foi politizada e o critério de seleção tem sido o do entusiasmo e adesão ao governo. Lafer concorda com as declarações de Abdenur, dadas em entrevista à revista ¿Veja¿, de que a promoção de diplomatas obedece a critérios de afinidade política, a condução da política externa atesta um ¿antiamericanismo atrasado¿, e que a incorporação da Venezuela ao Mercosul foi um erro.

¿ A carreira no Itamaraty sempre foi baseada em concurso e na qualificação do diplomata. Hoje há uma politização da carreira, que obedece a critérios de entusiasmo e adesão ao governo ¿ disse Lafer, que concorda ainda com a tese de que o Itamaraty aplica uma doutrina ideológica ao estabelecer uma bibliografia básica para alinhar o pensamento dos diplomatas.

¿ A exigência de leituras obrigatórias mostra o esforço do Itamaraty por um pensamento unificado. Esse é um dado que diminui a capacidade do Itamaraty de ser eficiente na sua posição de Estado. Fica só com uma posição de governo ¿ diz Lafer, que foi ministro das Relações Exterior no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Depois de lembrar da trajetória de Abdenur (ex-embaixador do Brasil em Viena, nos EUA, Alemanha, China e Equador), Lafer disse que o colega ¿não está fazendo comentários sem conhecimento de causa¿. Seguindo a mesma linha de raciocínio do ex-embaixador, Lafer criticou a defesa do Brasil à incorporação da Venezuela, sem negociação prévia, ao Mercosul.

¿ Hugo Chávez, com as suas posições, construiu os Estados Unidos como inimigo. E ele orienta por aí a sua política externa, inclusive com alianças estranhas, como a que fez com o Irã. O Brasil, ao defender a incorporação da Venezuela ao Mercosul, coloca a identidade do bloco à prova. Para Chávez, o que interessa é conflito, o que não é interessante para o Brasil.

Lafer também concorda com a tese de que o país tem dado muita ênfase nas relações Sul-Sul, assim como o faz Abdenur.