Título: Querem mostrar país que não é real
Autor: Peña, Bernardo de la
Fonte: O Globo, 07/02/2007, O País, p. 14

Novelistas criticam controle e imposição de horários para exibição

Paulo Ricardo Moreira

Autores de novelas repudiam a nova portaria a ser assinada pelo Ministério da Justiça que classifica a programação da TV aberta. Para eles, o documento que torna obrigatório o uso do Manual da Nova Classificação Indicativa, elaborado pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, dá margem ao ressurgimento da censura.

Um dos pontos polêmicos do manual é a imposição de um horário obrigatório para exibição dos programas após a classificação por faixa etária. O autor Ricardo Linhares, que escreve com Gilberto Braga a próxima novela das 21h da Rede Globo, ¿Paraíso tropical¿, acha que a medida é antidemocrática e inconstitucional.

¿ Na prática, funciona como censura prévia ¿ diz Linhares. ¿ O horário de exibição dos programas é função das emissoras. Não cabe a um governo democrático impor horários e determinar escolhas.

Carlos Lombardi, autor da novela ¿Pé na jaca¿, da Globo, afirma que, mais uma vez, o governo tenta controlar tudo, inclusive o direito de os pais decidirem o que os filhos podem ou não assistir na TV:

¿ É arrepiante. Coisa de quem não entende absolutamente nada de dramaturgia. Sem conflitos familiares não há dramaturgia. Sem vilões, maldades e maus exemplos não há dramaturgia.

Carrasco: perigoso controle sobre o conteúdo artístico

Silvio de Abreu, novelista da Globo, achou confuso o texto do manual. Segundo ele, algumas regras são impossíveis de serem cumpridas, por falta de clareza ou de objetividade.

¿ Parece que querem mostrar na TV um país completamente fora da nossa realidade. Um país onde a justiça se cumpre, os ladrões vão para a cadeia, o preconceito não existe, as pessoas são educadas e falam corretamente nossa língua ¿ ironiza Abreu. ¿ A nossa Constituição deixa muito claro que está vedado qualquer tipo de censura, e proibir um programa de passar em determinado horário é censurá-lo.

Lauro César Muniz, conselheiro da Associação de Roteiristas e novelista da Record, frisa que os autores não são contra a classificação dos programas por faixa etária, mas não aceitam que o governo proíba a exibição de uma atração em determinado horário por considerá-la inadequada:

¿ Isso é um absurdo.

Para Walcyr Carrasco, novelista da Globo, o manual estabelece um perigoso controle sobre o conteúdo artístico:

¿ A arte lida com elementos subjetivos. Tentar colocar regras é limitar a liberdade de expressão.

Já o autor Antonio Clamon, também da Globo, teme pela vida cultural do país:

¿ Há uma vontade totalitária no governo. Queria saber quem são essas pessoas que se arvoram no direito de censurar a criação artística.