Título: Políticos tentaram comprar voto de 8% dos eleitores
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 08/02/2007, O País, p. 5

Segundo pesquisa, assédio triplicou de 2002 para 2006

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. As investigações criminais e o desgaste público de políticos envolvidos em corrupção nos últimos anos não foram suficientes para conter indícios de irregularidades nas eleições. Pesquisa divulgada ontem pela organização não-governamental Transparência Brasil indica que 8,3 milhões de eleitores teriam sido abordados por políticos e cabos eleitorais interessados em comprar votos em 2006. O número corresponde a 8% dos brasileiros que foram às urnas em outubro. O percentual é quase três vezes maior que os 3% de eleitores que disseram ter recebido proposta de suborno nas eleições gerais de 2002.

¿ O problema da compra de votos é alarmante, e está se agravando de maneira catastrófica. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não pode lavar as mãos e dizer que só age se for provocado ¿ criticou Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil.

Abramo responsabiliza a pouca fiscalização da Justiça Eleitoral e a indiferença dos partidos políticos pelo comércio de votos. O levantamento mostra que metade do contingente de eleitores assediados, mais de 4 milhões de brasileiros, teria recebido proposta de pagamento em dinheiro para votar. Nas demais abordagens, os políticos ofereciam telha e cimento, entre outros tipos de ajuda.

O levantamento foi feito pelo Ibope a pedido da Transparência e da União Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacom), entidade que reúne fiscais da Controladoria Geral da União. Foram entrevistadas 2.002 pessoas em 142 cidades das cinco regiões.

Para o presidente da Unacon, Fernando Antunes, a compra de votos indica caixa dois em campanhas eleitorais:

¿ O caixa dois ainda está muito ativo.

Eleitor se diz contra o ¿rouba, mas faz¿

O levantamento foi feito pelo Ibope com amostragens de âmbito regional. Os autores da pesquisa não divulgaram dados por estado, mas informaram que na única unidade da Federação em que os dados foram detalhados, o Paraná, 22% dos eleitores teriam sido alvo de proposta de compra de voto. O percentual equivale a mais de 1,3 milhão de eleitores. O governador do estado, Roberto Requião, foi reeleito com apenas 10 mil votos de diferença sobre o pedetista Osmar Dias. A pesquisa não indica onde teria havido as abordagens para a compra de voto.

As perguntas abrangiam as campanhas de candidatos a deputado, senador, governador e presidente da República. Não foi possível identificar quais candidatos ou cabos eleitorais tentaram comprar votos.

O principal alvo da compra de votos são os jovens. Pela pesquisa, 13% dos eleitores de 16 a 24 anos receberam oferta para votar em alguns candidatos. Os responsáveis pelo levantamento constataram, no entanto, que a compra de votos não está restrita a grotões, áreas pobres ou à população com baixa escolaridade. Pela pesquisa, os maiores índices de denúncias de compra de voto estão na Região Sul, onde 12% dos eleitores disseram que receberam proposta para vender o voto.

Em segundo, vem o Nordeste, onde 10% dos eleitores teriam sido pressionados a trocar voto por dinheiro ou vantagens materiais. O percentual caiu para 6% no Sudeste e 5% no Centro-Oeste e no Norte. Para Abramo, a pesquisa derruba o mito de que brasileiro gosta de políticos desonestos mas bons administradores ¿ prática sintetizada na expressão ¿rouba, mas faz¿.

¿ O deputado Paulo Maluf foi eleito com 740 mil votos, mas num colégio eleitoral de 22 milhões de eleitores. Isso não demonstra que o eleitorado paulista gosta de político com fama de ladrão ¿ disse Abramo.

Abramo diz que é dever do TSE fiscalizar

Para Abramo e Antunes, a compra de votos deve ser imputada a falhas do TSE e dos partidos. Para Abramo, o TSE deveria identificar as regiões mais vulneráveis e apertar o cerco sobre fraudes. Ele também defende punições para partidos.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio de Mello, reagiu com indignação ao relatório.

¿ Injúria, senão calúnia. É uma injustiça manifesta, porque pela primeira vez tivemos nas eleições de 2006 uma propaganda institucional voltada à conscientização do eleitor. A Justiça Eleitoral não é tutora dos eleitores, ela não vota pelos eleitores. O problema é mais sério: é cultural ¿ disse Marco Aurélio.