Título: Governo descarta alternativas para o câmbio
Autor: Beck, Martha e Duarte, Patricia
Fonte: O Globo, 09/02/2007, Economia, p. 27

Equipe econômica acredita que valorização excessiva do real é temporária. Para a Fazenda, taxa de juros é o vilão

Martha Beck e Patrícia Duarte

BRASÍLIA. Mesmo diante das pressões do setor privado e de parte do próprio governo, a equipe econômica já tem claro que não há intervenções possíveis no mercado para segurar a queda livre do dólar. A avaliação é de que a excessiva valorização do real frente à moeda americana é algo passageiro e que o câmbio atingirá um ponto de equilíbrio com o tempo. Para o Ministério da Fazenda, o vilão é mesmo a taxa de juros, e sobre ela não há como operar.

Com isso, estão fora da mesa, pelo menos por enquanto, a adoção de medidas alternativas - como financiamentos vantajosos - para compensar as perdas dos exportadores. O entendimento da equipe econômica é que elas não teriam condições de resolver o problema.

A solução é mesmo reduzir muito mais as taxas de juros, o que bate na preocupação do Banco Central (BC) com o controle da inflação. Ao ser perguntado ontem sobre a possibilidade de o governo aumentar o limite de 30% das receitas de exportação que as empresas podem deixar lá fora, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu:

]- Nem mesmo o limite de 30% está sendo utilizado hoje. Sabe por quê? Porque eles (empresários) trazem (o dinheiro) de volta para o Brasil, pois aplicar em real dá mais do que aplicar em dólar. Os juros atrapalham um pouco a eficiência desse instrumento.

Lula descarta mudar política de câmbio flutuante

Outra medida que poderia auxiliar no câmbio seria a redução das tarifas de importação, mas também foi mais uma vez descartada por Mantega. Esse tipo de ação só será adotado para evitar que determinados setores prejudiquem os consumidores no mercado interno, com uma elevação de preços.

A pressão para tentar puxar a cotação do dólar vem de todos os lados, inclusive de dentro do governo. O ministro Luiz Marinho (Trabalho) foi o mais categórico nesta semana, culpando o BC - e sua política de juros e de câmbio - pela desaceleração do crescimento do emprego formal no país. Mesmo com a grita, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar de ter pedido explicações à equipe econômica sobre a situação, deixou claro que a política flutuante do câmbio está mantida.

A mesa de câmbio do BC vive dias tensos devido à força da entrada de dólares, mas continua pautada pelas recomendações técnicas, sem ordens atípicas para conter a derrocada do dólar. Ou seja, as compras mais vultosas são vistas como normais. Por dia, o BC tem comprado cerca de US$500 milhões.

Meirelles reitera preocupação com inflação

Mostrando tranqüilidade, Meirelles buscou amenizar o momento de pressão que sofre à frente do Banco Central, durante entrevista em Recife (PE), de onde pegaria um vôo para Portugal ontem à noite:

- Essas críticas são normais. O importante é que o Brasil vive um momento de sucesso, com crescimento da economia e do emprego. A redução dos juros é, sim, necessária, mas sem alta da inflação.

O Palácio do Planalto saiu ontem em defesa de Meirelles. O ministro de Relações Institucionais, Tarso Genro, apesar de assinar um documento do PT em que faz críticas ao BC, disse não ter conhecimento de atritos. Indagado sobre a situação do presidente do BC no governo, disse:

- Que eu saiba, está muito bem.

Já a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, preferiu se fechar e não comentou a queda de braço com o BC nem a situação do câmbio. Ela é tida como uma das que mais de opõem à política de juros e de câmbio da autoridade monetária:

- Eu preferia não me manifestar sobre esse assunto porque não é minha área - disse, acrescentando, em tom de ironia, diante da insistência dos repórteres:

- No que se refere às matérias do jornal tem dia que eu acordo de manhã querendo saber quando é que eu disse certas coisas. Desconfio que é no sono.

COLABORARAM Chico de Gois e Luiza Damé