Título: O PT e o retrovisor
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 10/02/2007, O Globo, p. 2

Embarcando para Salvador, onde o PT celebrou ontem seus 27 anos e deu início aos debates para o III congresso, o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, ouviu de um amigo: tente mostrar ao PT que é possível e saudável viver sem crises. Se não for por gosto e compulsão, é por não ter aprendido nada que o PT volta à guerra interna. Os eleitores que deram uma segunda chance ao presidente Lula esperam é que o segundo mandato suplante as decepções com o primeiro, em boa parte decorrentes de problemas criados pelo partido.

Foi o empenho pessoal de Lula, nos últimos dias, que fez a temperatura baixar. A troca pública de farpas cessou, expressões acusadoras foram amenizadas e um ataque conjunto ao Banco Central e a seu presidente, Henrique Meirelles, foi abortado. Ricardo Berzoini, presidente do partido, saiu em defesa de Meirelles, dizendo que há uma preocupação com juros e câmbio mas não uma obsessão com o assunto nem com a permanência de Meirelles no cargo. Um tranqüilizante para o mercado. Mas a luta interna, mesmo serenada, pode continuar semestre a dentro, embora o governo tenha tantos desafios e prioridades.

Quando deram uma segunda chance a Lula, os eleitores foram também generosos com o PT, partido mais votado para a Câmara. Deram a segunda chance, apesar dos escândalos, e também das promessas não cumpridas ou das bandeiras esquecidas: a política econômica foi continuadamente liberal. Garantiu a estabilidade mas o crescimento foi frustrante. Os bancos lucraram o máximo e a reforma agrária andou pouco. Lula foi salvo por sua mitologia, pelos programas sociais e pela esperança remanescente de 2002. Mas não foi para fazer mais do mesmo que os eleitores o reelegeram. Ele faz sua parte quando cria as condições políticas (coalizão) para a governabilidade e lança um programa para acelerar o crescimento.

Já o PT, gastando energias com a guerra interna, negligencia suas tarefas maiores, como dar suporte ao governo para aprovar sua agenda legislativa, centrada nas medidas do PAC, ou para ousar no que não ousou no primeiro mandato. Está aí esta violência bestial que os estados sozinhos não conseguem controlar. Estão aí as evidências de que a qualidade da educação está em franca decadência. Se desperdiçar a segunda chance, o PT corre o risco de perder o bonde. Em 2010, haverá um bloco à sua esquerda, que apóia Lula mas quer distância do PT. E Lula pode muito bem buscar ali o candidato do lulismo à sua sucessão.