Título: Violência é o que mais mata mulheres em Recife
Autor: Lins, Letícia
Fonte: O Globo, 11/02/2007, O País, p. 15

Assassinatos por arma de fogo, facadas e espancamentos somam 11,11 por cem mil, dobro da média nacional.

Letícia Lins

RECIFE. Os homicídios já são a principal causa de morte das mulheres em idade reprodutiva em Recife. É essa a conclusão de um estudo feito com base em dados da Secretaria de Saúde da cidade, analisados pelo médico Glaucius Cassiano Nascimento em sua tese de mestrado na Faculdade de Medicina da Universidade de Pernambuco.

Mortes por arma de fogo, facadas ou espancamentos de adolescentes e adultas somam 11,11 por cada grupo de cem mil mulheres. O pesquisador analisou 5.165 atestados de óbitos de mulheres com idades entre 10 e 49 anos abrangendo 84 meses, de 1997 a 2004. A taxa é o dobro da média nacional: no país, a estimativa é de que 5,6 mulheres são assassinadas para cada grupo de cem mil.

Até o início da década passada os assassinatos ocupavam o terceiro lugar nos obituários de mulheres da mesma faixa etária. Derrames e infartos eram as causas de morte mais comuns, situação que se inverte no fim dos anos 90, quando a violência de gênero explodiu no estado.

O estudo de Nascimento mostra que os homicídios são 8,54% da mortalidade por causas específicas das mulheres, à frente das doenças cerebrovasculares (7,55%), dos infartos (6,43%), do câncer de mama (5,07%) e de doenças virais, como a Aids (5%). De acordo com o estudo, os homicídios ocorreram por armas de fogo (81,80%), objeto cortante ou penetrante (8,39%), enforcamento, estrangulamento ou sufocação (3,85%).

Cresce também número de assassinatos de meninas

Os dados não surpreenderam o Fórum de Mulheres de Pernambuco e entidades feministas. Nas vigílias que fazem todos os meses nas ruas de Recife pelo fim da violência, elas assinalam com placas e cruzes o número de mulheres mortas a cada mês: só em janeiro foram 27. No ano passado, 319 mulheres foram assassinadas em Pernambuco, contra 274 em 2005, 263 em 2004 e 247 em 2003. A diretora do Departamento de Polícia da Mulher, Verônica Azevedo, anunciou um mutirão para investigar os 36 assassinatos das mulheres de 2007 e agilizar os inquéritos que se acumulam.

As mulheres do Fórum reclamam que a impunidade é grande mesmo com a Lei Maria da Penha, que impõe penas mais severas aos agressores. Segundo Eleonora Pereira, uma das coordenadoras do Fórum, as altas taxas de assassinatos divulgadas no fim do ano passado pela Diretoria de Polícia da Mulher escondem outro número dramático: o de meninas mortas.

Entre as 319 vítimas fatais de 2006, 32 tinham até 15 anos. Em 2007, já foram quatro as adolescentes assassinadas, e pelo menos 26 garotas desapareceram no estado. Sete entidades publicaram um cartaz com 16 fotos de crianças e adolescentes desaparecidos: nove meninas e sete meninos. Dos garotos, só um não apareceu. As meninas permanecem sumidas. As autoridades temem que elas tenham tido o mesmo destino de três garotas desaparecidas, que foram encontradas mortas.

Foi o caso de Sabrina Hellen Martins Pereira, de 13 anos, assassinada pelo garçom Anderson Bezerra da Rocha, de 24. Ele a seqüestrou e estuprou porque a menina não correspondia a seu assédio. Localizado pela comunidade, ele foi entregue à polícia. Outra história recente de sumiço foi a de Amanda Beatriz de Oliveira, de 16 anos, estuprada, espancada e morta por Geison Duarte da Silva, de 20. Geison foi denunciado à polícia pela mãe e está preso em Recife.

O governo de Pernambuco criou uma Secretaria da Mulher e diz que a investigação dos crimes é prioridade, e afirma que o combate à violência de gênero vai ser um dos eixos da política de segurança que está sendo construída para o estado.