Título: Barreira contra o tráfico humano
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 11/02/2007, O Mundo, p. 39

EUA tentam debelar contrabando de imigrantes. Brasileiros estão entre os mais vulneráveis.

Marília Martins

Ooverno Bush decidiu reforçar o patrulhamento das fronteiras com o México: vai duplicar o número de guardas nas áreas consideradas mais vulneráveis, especialmente o Texas, e acaba de criar uma unidade especial vinculada ao Departamento de Justiça para combater o tráfico de imigrantes ilegais. Segundo o governo, 800 mil pessoas por ano atravessam ilegalmente as fronteiras internacionais, sendo que 17.500 são vítimas de tráfico humano nos EUA.

Os países latinos com maior número de casos são México e Equador, mas o Brasil, que teve acentuada queda no número total de imigrantes ilegais presos nas fronteiras americanas em 2006, aparece como um dos países mais vulneráveis ao tráfico humano com vistas à exploração sexual. No relatório de 2006 do Departamento de Estado, o Brasil entrou para a lista de países ¿que merecem observação atenta¿ ¿ a chamada watch list.

¿ Consideramos o tráfico de seres humanos uma versão moderna da escravidão ¿ diz a promotora Grace Chung Becker, assistente do procurador-geral dos EUA, Alberto Gonzales. ¿ Adotamos uma nova estratégia que visa a punir as redes criminosas de contrabando e a tratar como vítimas os imigrantes ilegais que foram submetidos a fraude, força ou coação, dando a eles direito à assistência legal, médica e psicológica, podendo inclusive optar por ficarem nos EUA com um visto especial.

Tráfico humano aumentou na AL

De acordo com recenseamento do Departamento de Segurança Interna, Ásia e América Latina são as regiões que mais enviam imigrantes ilegais aos EUA, muitos vítimas de contrabandistas, com uso de documentos fraudulentos. Depois de atravessada a fronteira, tornam-se alvos de chantagem, coação, abuso sexual e espancamento. De acordo com as autoridades de fronteira, asiáticos são as maiores vítimas de trabalho escravo após desembarcarem, e os latinos, sobretudo as mulheres, de exploração sexual.

¿ A América Latina teve aumento no número de casos de tráfico humano em 2006 e a região é uma das maiores fontes de vítimas deste tipo de crime, tendo como destino os EUA ¿ comenta Eleanor Gaetan, coordenadora do Escritório de Monitoramento de Tráfico Humano do Departamento de Estado.

O relatório afirma que cerca de 70 mil brasileiros, na maioria mulheres, se dedicam à prostituição fora do território brasileiro e estima-se que outros 25 mil, na maioria homens, sejam vítimas de trabalhos forçados.

¿ O Brasil reduziu o número total de imigrantes ilegais para os EUA por causa da mudança da legislação mexicana, que passou a exigir vistos para brasileiros, dificultando assim o acesso à principal rota para entrada em território americano ¿ diz Gabriel Garcia, chefe da unidade de combate ao tráfico humano do Departamento de Segurança Nacional e Controle de Fronteiras dos EUA. ¿ Mas percebemos um aumento no número de casos de vítimas de tráfico com vistas à exploração sexual.

O relatório afirma ainda que a nova classificação do país na watch list se deve ao fato de que o governo brasileiro, apesar de ter feito grandes esforços para a redução da imigração ilegal, ainda tem falhas no combate ao tráfico de pessoas, sobretudo no que se refere à punição das redes criminosas de exploração sexual e aos recrutadores de trabalho forçado. ¿Ainda que o governo tenha aumentado o efetivo policial no combate ao trabalho forçado e tenha resgatado 4.113 trabalhadores que viviam em regime de escravidão em 2006, os violadores da lei continuam a usufruir de virtual impunidade no país¿, diz o relatório.

¿ O Brasil está classificado no grau 2, que indica números ainda elevados de imigrantes ilegais vítimas de tráfico e há uma tendência de crescimento desses números em função da aparente impunidade que os criminosos usufruem por causa das falhas das autoridades brasileiras no combate ao crime ¿ avalia Eleanor Gaetan.

Os imigrantes submetidos a trabalhos forçados nos EUA são encontrados, na maioria dos casos, em grupos importados para servidão em grandes fazendas, quando se trata de região rural, ou em restaurantes e indústrias alimentícias, nas cidades médias e grandes. As mulheres que entram no mercado de prostituição são na maioria recrutadas como modelos e dançarinas. Todos são atraídos pela promessa de uma vida melhor, rápida legalização de documentos nos EUA e de um breve reencontro com familiares.

Outra medida a ser adotada até o fim do ano, pelo Departamento do Trabalho, é a divulgação de uma lista mundial de produtos fabricados sob suspeita de trabalho escravo. A lista inclui produtos de multinacionais que transferiram suas instalações para países asiáticos porque o pagamento de mão-de-obra na região costuma ser muito inferior aos padrões americanos e europeus. A facilidade em obter mão-de-obra em países asiáticos teria levado algumas companhias a descontar despesas de alojamento e comida nas imensas linhas de montagem como parte dos salários dos trabalhadores. China e Tailândia podem estar no topo da lista produzida pelo governo americano.