Título: Eu gostaria de estar no lugar da mãe do João, de ter enterrado o meu filho
Autor: Duran, Sergio
Fonte: O Globo, 13/02/2007, Rio, p. 10

Pais de dois dos acusados presos pela morte do menino pedem desculpas

Sergio Duran

Nilson Leonardo da Silva e M., ambos de 34 anos, são pais de cinco filhos. Dois deles, um adolescente de 16 anos e Carlos Eduardo Toledo de Lima, de 23, fazem parte da quadrilha que praticou o roubo de carro no qual morrEu o menino João Hélio Fernandes Vieites, de 6 anos. Assim como o pai de outro acusado, Nilson ajudou a polícia a prender um dos filhos. Ontem, na casa humilde onde mora na favela São José da Pedra, em Madureira, o casal disse não ter culpa pelos atos dos filhos e pediu desculpas à família de João Hélio em um desabafo dramático:

- Eu gostaria de estar no lugar da mãe do João. Ter enterrado o mEu filho. Não queria que ele estivesse preso, não queria passar por essa situação. Minha dor é pior - disse M., que pediu para não ter sEu nome revelado porque teme ser chamada de "a mãe do monstro".

Evangélicos, os pais dizem não entender como os filhos tiveram capacidade de cometer um crime tão cruel. A mãe contou que as outras crianças são tranqüilas, estudiosas e honestas. Uma delas, um adolescente de 17 anos, parou de ir à escola com medo de sair de casa após o crime. Os pais contam que nunca admitiram roubos, drogas e mentiras.

- Fecho mEus olhos e vejo aquele carro correndo, com aquela criança pendurada. Peço às pessoas que me ajudem a ficar de pé. Não criei mEus filhos para fazerem isso - disse a mãe. - Não tenho culpa. Como mãe e evangélica, fiz tudo o que estava ao mEu alcance. Tive dificuldades quando as crianças eram pequenas, mas sempre ensinei o certo. Não parei de trabalhar para comprar o material escolar dos mEus filhos.

A culpa em troca de um celular

Os pais acreditam que o adolescente participou do roubo influenciado pelo irmão e pelo colega, Diego Nascimento da Silva, também preso. Nilson contou ter ouvido de um policial que o menor teria assumido o crime para proteger o irmão maior, no primeiro depoimento à polícia, mas depois voltou atrás. O adolescente teria dito que o irmão pediu para ele assumir a culpa porque, como menor, ficaria preso por pouco tempo. Em troca, teria oferecido um celular.

- Acreditamos que ele (o adolescente) está dizendo a verdade. O Eduardo já foi preso e cometEu outros delitos. É mais experiente. Mas não tiro a culpa dos dois. Eduardo e Diego devem ter passado tudo pra ele. Só não entendo o motivo de ele ter ajudado em um crime assim - disse Nilson, sem largar a Bíblia.

O menor teria sido detido apenas uma vez por pichar um muro. Já Carlos Eduardo fugiu de casa e vivia na rua dos 10 aos 18 anos, circulando pela Zona Sul e pela Ilha do Governador. Ele teve cinco passagens pela polícia, quando menor. Foi condenado por furto e roubo. Em regime semi-aberto, estava dormindo no Casa do Albergado Crispim Ventino, em Benfica.

- Sempre o buscávamos de volta para casa, mas ele fugia de novo. Tudo de ruim, ele aprendEu na rua, até ser preso - contou a mãe.

No dia do crime, ela saiu com Nilson por volta das 18h para um culto evangélico na Gávea. Segundo eles, o adolescente estava em casa nessa hora e quando retornaram, por volta das 22h. O crime teria acontecido às 21h. Carlos Eduardo foi expulso de casa depois de agredir Nilson em uma discussão, uma semana antes do assassinato de João Hélio.

Após a morte de João, Carlos Eduardo procurou um pastor evangélico, que mediou uma conversa com Nilson, na qual ele pediu para se entregar à polícia. O pai do criminoso ligou para um inspetor da 30ª DP (Marechal Hermes), também evangélico, e acompanhou o filho em sua rendição, no domingo. Segundo ele, foi como entregá-lo ao matadouro:

- DEus não quer isso, mas, para o povo, ele é digno de ser morto. Ele acredita que vai provar inocência e será punido só por descumprir as regras da prisão - disse.

Nilson também acredita que Carlos Eduardo teria coragem para incriminar o irmão e pediu à polícia que puna os culpados, mas poupem sEus filhos, caso seja provado que algum deles seja inocente.

- Se a Justiça fosse consertar mEu filho, ele poderia passar a vida dele dentro da cadeia. Mas lá vai conviver com pessoas piores, vão maltratar ele e, quando sair, será muito pior de que quando entrou - disse a mãe.

M. contou que não conseguiu ver a entrevista com os pais de João Hélio no "Fantástico". Ao fim da entrevista, pediram desculpas:

- Quero pedir desculpas ao pai dessa criança - disse Nilson.

Ele foi interrompido pela mulher:

- Desculpa é pouco. A gente não tem palavras.

Nilson continuou:

- Se mEus filhos foram os causadores dessa morte, quero pedir desculpas por ser pai deles. Que DEus possa consolar o coração deles (os pais do João). Sofro junto com eles. Queria poder conversar, abraçar e chorar junto com eles.