Título: Universidades paulistas pressionam Serra
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 20/02/2007, O País, p. 3

Área acadêmica critica medidas que tiram autonomia financeira de instituições de ensino

Soraya Aggege

SÃO PAULO. Donas de quase 5% do orçamento do estado e de mais de 40% da produção científica nacional, as três Universidades estaduais paulistas abriram guerra contra a chamada "área dura" do governo de José Serra (PSDB). No mundo acadêmico brasileiro, as Universidades estaduais paulistas são consideradas referência, pela autonomia financeira e política que mantêm do governo estadual. Mas, logo no início do ano, nos primeiros dias de governo Serra, essas instituições foram surpreendidas por um pacote de medidas oficiais que resultariam no controle financeiro e político das Universidades.

- A violação da autonomia mobilizou a comunidade acadêmica, que continua pronta para entrar em greve em março, caso o governo insista nas medidas - disse César Augusto Minto, da coordenação do fórum que reúne docentes e funcionários das três Universidades estaduais de São Paulo e presidente da Associação dos Docentes da USP (Adusp).

"A autonomia das paulistas sempre foi um emblema para nós"

O fato de São Paulo servir de modelo de autonomia fez com que a tentativa do governo Serra, que na prática assumiria o controle financeiro e político das Universidades, gerasse protestos nacionais. O Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (Crub) reclamou da medida, alegando que o modelo da autonomia paulista inspira todas as Universidades públicas do país.

- Estamos preocupados com as medidas e lamentamos a situação de São Paulo. A autonomia das paulistas sempre foi um emblema para nós - disse o presidente do Crub, Nival Nunes de Almeida, reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Pelas medidas, em parte publicadas em decretos do governo estadual, o repasse anual de 9,75% da arrecadação do ICMS garantidos às Universidades (R$3,9 bilhões em 2006) passaria ao sistema comum das demais áreas do governo. Ou seja: os gastos teriam que ser autorizados pelo estado. No modelo atual, as Universidades aplicam diretamente a verba repassada. Além disso, o comando político sairia do conselho de reitores das paulistas, o Cruesp, cuja presidência é definida em rodízio, para as mãos de José Aristodemo Pinotti, ex-reitor da Unicamp, nomeado para uma nova pasta, criada no primeiro dia do governo Serra: Secretaria do Ensino Superior do Estado de São Paulo.

Em entrevista ao GLOBO, Pinotti definiu a crise com as Universidades como "um qüiproquó" sem fundamento real, atiçado por declarações infelizes de vários lados, inclusive do próprio governo.

- Não houve mudança alguma. Foi um qüiproquó. Imagine se eu, ex-reitor da Unicamp, e o governador Serra, ex-professor, que tivemos nossas bases na autonomia universitária, iríamos fazer uma coisa dessas! - disse Pinotti.

O secretário do Planejamento, Francisco Vidal Luna, chegou a declarar em público que já poderia controlar os recursos das Universidades, ao mesmo tempo em que Pinotti dizia que não usaria a prerrogativa do veto. O secretário da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira, também declarou que "as Universidades não são ilhas isoladas", ao defender a necessidade de maior rigidez dos gastos do estado.

Serra foi chamado para conversar com os reitores. Pinotti assegurou aos secretários empenhados no decreto que não assumiria a presidência do Crueb, nem reteria verbas.

- Virei juiz de conciliação de casais divorciados. Creio que acabei conseguindo um equilíbrio - disse Pinotti.

Segundo ele, o maior mal-entendido começou no fim do governo Cláudio Lembo (PFL), quando as Universidades pediram aumento do percentual de 9,57%:

- Esse foi outro qüiproquó: Lembo não aumentaria, até para deixar Serra à vontade, e vetou o item para o aumento. Ao fazer o veto, o índice de 9,57% ficou em branco. Então, ao juntar tudo, virou um bom caldo de mal-entendidos. Agora o índice vai voltar para o orçamento do estado.

"Faremos quantas reuniões e adaptações forem necessárias"

Sobre a execução financeira das Universidades por meio do Sistema Integrado de Administração Financeira do Estado e Municípios (Siafem) de São Paulo, Pinotti disse que os reitores temem perder a agilidade para aplicar as verbas, mas frisou que o problema será contornado:

- Faremos quantas reuniões e adaptações forem necessárias - disse o secretário de Ensino Superior.

Para os reitores, o impasse está resolvido.

- A crise está praticamente resolvida. Creio que, em mais algumas semanas, encontraremos um equilíbrio - disse o reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge.

Segundo ele, falta ainda equacionar o caso do Siafem com a autonomia:

- Talvez precisemos de um decreto para remanejar verbas entre grupos distintos de despesas. Mas temos boas expectativas - disse.

Para Jorge, o governo tentou fazer uma generalização entre as Universidades, únicas áreas autônomas do governo, com os demais setores.

- Quando o tema ganhou dimensão, se deram conta de que houve um erro, quem sabe um mal-entendido - disse o reitor da Unicamp.