Título: Ministério Público ou PF: quem investiga?
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 20/02/2007, O País, p. 4

Categorias fazem lobby no Congresso contra e a favor de PEC que tira poderes de promotores e procuradores

Carolina Brígido

BRASÍLIA. O Ministério Público e a Polícia Federal estão em guerra não declarada nos bastidores do Congresso. As principais associações representativas das duas categorias andam rondando os gabinetes dos parlamentares para tentar convencê-los de que estão certos na disputa pelos poderes de investigar crimes. De um lado, os delegados argumentam que a Constituição não dá a promotores e procuradores da República o direito de investigar, pois essa prerrogativa seria uma exclusividade das polícias. Por outro lado, os membros do Ministério Público defendem que a Constituição deve ser interpretada de forma a favorecer os promotores e procuradores, já que é deles a autoria das ações penais apresentadas ao Judiciário.

A briga vem de longa data, mas ganhou novo fôlego a partir do ano passado, quando o ex-senador Valmir Amaral (PTB-DF) apresentou ao Congresso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, que ameaça tirar poderes do Ministério Público. O texto traz alterações substanciais ao capítulo da Constituição que trata de segurança pública.

Uma delas deixa claro o que está dúbio na Constituição: dá à Polícia Federal exclusividade para fazer investigações criminais da União. Outro foco de polêmica é a criação do Conselho Nacional de Polícia Federal, que passaria a exercer o controle externo da atividade policial, feito hoje pelo Ministério Público.

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), responsável por definir as diretrizes de atuação de promotores e procuradores, mostrou preocupação com o assunto em reuniões recentes. Ano passado, chegou a editar uma resolução disciplinando regras para a atividade investigatória da categoria. Recentemente, chegou a criar a Comissão de Preservação da Autonomia do Ministério Público, justamente para tentar convencer os parlamentares a barrar a PEC. Na sessão do dia 31 de janeiro, a comissão publicou uma nota técnica com argumentos contrários à PEC, que foi distribuída aos parlamentares.

Proposta está parada na CCJ

A PEC está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde o ano passado, aguardando o relatório do senador Almeida Lima (PMDB-SE). Apesar de agradar aparentemente aos interesses da Polícia Federal, entidades representativas do órgão juram que a proposta não foi apresentada por interesse da corporação. Para o presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, Sandro Torres, houve até exagero nos artigos da PEC:

- Há muita coisa que pode ser mudada. Está muito pesada.

Segundo Torres, no entanto, a parte que dá mais autonomia à Polícia Federal, por não ser mais fiscalizada pelo Ministério Público, não é exagero. Ele também defende que a Constituição é clara ao dar às polícias a exclusividade nas investigações:

- O processo penal brasileiro coloca a defesa e a acusação em posições eqüidistantes do juiz. Se o Ministério Público, que faz a acusação, investigar também, um dos lados fica mais forte. Já a polícia é neutra.

O presidente da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR), Nicolao Dino, está do outro lado da disputa e informou que, depois do carnaval, vai intensificar as visitas aos gabinetes dos integrantes da CCJ do Senado para tentar convencê-los de que os efeitos da PEC não serão bons para o país. Para ele, se o Ministério Público deixar de investigar, aumentarão as chances de impunidade aos criminosos.

- A Constituição não proíbe a investigação do Ministério Público. Essa exclusividade da polícia não atende ao interesse Público - opinou.