Título: Assaltado, ministro não vai à polícia
Autor: Aggege, Soraya e Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 24/02/2007, O País, p. 3

Mantega, com outras pessoas, foi feito refém em sítio de empresário de SP e não deu queixa

Soraya Aggege e Ricardo Galhardo

Oministro da Fazenda, Guido Mantega, ficou refém de três homens armados e encapuzados na noite da terça-feira de carnaval, durante cerca de três horas, num assalto à casa de um amigo, o empresário Victor Sandri, em Ibiúna, interior de São Paulo. Apesar disso, o ministro e o empresário não registraram boletim de ocorrência na polícia - o que dificulta a investigação e acaba favorecendo os criminosos.

Ameaçado pelos bandidos, Sandri teve que sair para sacar em caixas eletrônicos e arrecadar dinheiro na casa de amigos em São Paulo, enquanto o ministro ficou na mira dos ladrões, segundo a Secretaria de Segurança. O comando da polícia paulista soube do caso e registrou a ocorrência por conta própria. Ontem mesmo foram presos três suspeitos em Ibiúna.

- Os ladrões não reconheceram o ministro, que estava sem seguranças, em uma visita privada. Também não houve violência de nenhuma das partes. Nós entendemos o fato de eles não terem registrado a ocorrência, pois geralmente as vítimas ficam traumatizadas com esses assaltos - disse o delegado-geral da Polícia de São Paulo, Mário Jordão.

A polícia vai pedir ao ministro que deponha sobre o caso. Ontem, Sandri depôs em Ibiúna, mas o teor de seu depoimento não foi divulgado.

Versões diferentes sobre presentes

Pela versão apresentada ontem pelo delegado-geral, Mantega foi, juntamente com sua mulher, jantar na chácara do empresário, que estaria apenas com a mulher e os filhos. Mas, segundo vizinhos da chácara ouvidos ontem pelo GLOBO, havia uma festa na casa, com pelo menos 15 pessoas.

O caseiro da chácara foi rendido pelos ladrões, que roubaram duas armas do empresário, alguns objetos da casa e um montante em dinheiro, segundo Jordão. O delegado-geral não soube explicar quais objetos foram levados nem a quantia exata em dinheiro. Os ladrões teriam obrigado Sandri a sair de carro com eles para sacar mais dinheiro.

Os três assaltantes teriam invadido o local depois de render um jardineiro, que fora buscar uma cozinheira da chácara. No interior do imóvel, dominaram cerca de 15 pessoas que estavam na casa principal. Sandri, Mantega e outros três convidados caminhavam pela chácara e não estavam na casa no momento da invasão, de acordo com vizinhos. Eles foram rendidos em seguida.

- Não houve violência. Os bandidos disseram que, se o Sandri seguisse as ordens, não aconteceria nada com ninguém - disse um vizinho.

Os assaltantes teriam pedido dinheiro para liberar os reféns. Como não tinham a quantia em mãos, dois convidados rodaram caixas eletrônicos e casas de amigos para arrecadar o dinheiro. Voltaram mais de três horas depois.

Quando o caso chegou ao conhecimento do comando da polícia paulista, o delegado de Ibiúna, Regis Vieira, foi acionado. O próprio delegado foi ao local, no bairro Paruru. O caso foi registrado às 23h32m do dia seguinte, no BO 545. Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública, o delegado conseguiu informações com um vigia da região.

Jordão disse que os suspeitos foram presos rapidamente porque o assalto foi o quarto na região de Ibiúna nos últimos três meses, todos com as mesmas características.

- Os ladrões não sabem dirigir. Tanto que, depois de encerrado o assalto do dia 20, eles pediram ao dono da chácara (Victor Sandri) que os deixasse de carro em um local ermo da região. A única diferença é que eles não usaram capuzes nos outros assaltos. Mas ontem achamos capuzes e coldres de revólveres nas casas dos suspeitos - disse o delegado-geral.

Suspeitos têm entre 18 e 20 anos

Os detidos negaram a autoria do assalto. Os três, com idades de 18, 19 e 20 anos, foram transferidos ontem à noite para a Cadeia Pública de São Roque, onde permanecerão presos.

Guido Mantega possui uma casa no condomínio Veleiros de Ibiúna, um dos mais caros da cidade, a poucos quilômetros da chácara de Sandri. De acordo com os relatos, os assaltantes não reconheceram o ministro. A pequena Ibiúna ficou nacionalmente conhecida em outubro de 1968, quando mais de mil estudantes, entre eles o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, foram presos em um congresso ilegal da União Nacional dos Estudantes (UNE).

Na década de 80, a cidade, à beira de uma das maiores represas de São Paulo e cercada de montanhas, atraiu um grupo de professores universitários que, anos mais tarde, fundaria o PSDB. Entre os tucanos que têm casas de veraneio lá estão o governador de São Paulo, José Serra, o ex-ministro da Justiça José Gregori e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Na última década Ibiúna passou a ser alvo de ladrões que se aproveitam da ausência dos donos durante a semana para roubar as chácaras.

- É uma coisa impressionante. Uma vez levaram cerca de150 quilos em equipamentos - disse o administrador de empresas Lourival Vilani, que tem chácara em Ibiúna há cinco anos e já foi roubado cinco vezes.

Mantega não comenta o caso

O ministro chegou ontem, às 13h30m, a São Paulo e foi para sua casa na capital, no bairro dos Jardins. A assessoria de Mantega informou que ele não pretende comentar o crime.