Título: ONU indicia ministro e líder de milícia por crimes de guerra em Farfur
Autor: Cooper, Helene e Semple, Kirk
Fonte: O Globo, 28/02/2007, O Mundo, p. 27

Governo do Sudão diz que não entregará acusados a tribunal de Haia.

HAIA, Holanda. Numa ação considerada arrojada por finalmente associar o governo do Sudão às atrocidades cometidas em Darfur, o Tribunal Penal Internacional (TPI) da ONU indiciou ontem os primeiros dois acusados de cometer crimes de guerra na província localizada no oeste do país africano. E um deles é do governo: o ex-ministro do Interior, atual ministro de Assuntos Humanitários, Ahmed Haroun. O outro indiciado pelo tribunal de Haia é Ali Mohammed Ali Abd al-Rahman, também conhecido como Ali Kushayb, líder da milícia árabe Janjaweed ¿ acusada de atrocidades contra os habitantes não-árabes de Darfur e que receberia apoio e financiamento de Cartum.

Pelo menos 200 mil pessoas já foram mortas e mais de dois milhões tiveram que deixar suas casas desde que os confrontos começaram, em 2003, quando um levante rebelde deu início à perseguição contra os não-árabes ¿ classificada por muitos como genocídio e limpeza étnica. Os relatos das testemunhas da tragédia costumam ser chocantes: assassinatos a sangue frio, torturas, estupros de mulheres, crianças mortas de fome, milhares de pessoas doentes. O governo do Sudão, que nega envolvimento na matança, reagiu ao indiciamento e declarou ser capaz de julgar os acusados:

¿ Nunca entregaremos um sudanês à Justiça internacional ¿ disse o ministro da Justiça, Mohammed Ali al-Mardi, frisando que o TPI tem apenas jurisprudência quando cortes nacionais são incapazes de agir.

¿ Temos todos os motivos para acreditar na culpa dos dois. Os responsáveis pelas atrocidades em Darfur não tinham apenas rebeldes como alvos, mas sim civis. Esperamos que o tribunal consiga dar um ponto final a esses crimes ¿ disse o promotor-chefe do TPI, o juiz argentino Luis Moreno-Ocampo, que quer indiciar outros envolvidos.

Acusado dificulta trabalho de agências humanitárias

Como ministro de Assuntos Humanitários, Haroun é considerado o terror das agências humanitárias, já que constantemente nega vistos ou impõe restrições a quem tenta ir a Darfur ajudar as vítimas. Na época em que a perseguição aos não-árabes foi mais intensa, entre 2003 e 2004, ele era ministro do Interior e foi visto dezenas de vezes na província em companhia de milicianos. Já o líder da Janjaweed estaria em poder das autoridades sudanesas. Analistas prevêem ser quase impossível que eles sejam entregues espontaneamente a Haia.