Título: Efeito gangorra nos mercados: após alta, bolsas mundiais voltam a cair
Autor: Eloy, Patricia e Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 02/03/2007, Economia, p. 22

Em novo discurso, Greenspan diz que recessão é improvável.

Na China, queda ontem foi de 2,91%. No Brasil, houve perda de 0,86%.

RIO, PEQUIM, TÓQUIO e WASHINGTON. Após a recuperação da véspera, os mercados financeiros globais tiveram ontem novo dia de fortes quedas, devido a dúvidas em relação à expansão das economias americana e chinesa e a indicadores dos EUA mais negativos. No início da madrugada, o movimento das bolsas asiáticas era um prenúncio do dia negativo: a bolsa de Xangai fechou em queda de 2,91%, seguida por perdas de 1,55% em Hong Kong. Com isso, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) chegou a cair 4% na primeira meia hora de negócios, mas dados positivos sobre a economia americana divulgados à tarde trouxeram alívio aos mercados, e as perdas foram reduzidas para 0,86% no fechamento.

Nos EUA, os mercados também reagiram. A bolsa eletrônica Nasdaq, que chegou a cair 2,36% pela manhã, encerrou o pregão em queda de apenas 0,49%. Já o índice Dow Jones, após recuar 1,70%, fechou em queda de 0,28%.

A inflação acima do esperado nos EUA afetou as bolsas no início do dia. O núcleo do índice de gastos pessoais (PCE, na sigla em inglês) que orienta as decisões do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e exclui as variações nos preços de alimentos e energia, subiu 0,3% em janeiro, bem acima das expectativas dos analistas, de 0,2%. Em dezembro, o avanço havia sido de 0,1%.

Mercados se recuperam com alta do setor manufatureiro

A inflação mais pressionada alimentou especulações sobre um aumento de juros pelo Fed a curto prazo, o que poderia reduzir ainda mais o apetite dos investidores estrangeiros por aplicações de risco.

E foi justamente outro dado da economia americana que impulsionou a recuperação dos mercados. O setor manufatureiro voltou a crescer em fevereiro. O indicador ficou em 52,3 pontos no mês passado, ante uma expectativa de 50 pontos. Foi o melhor resultado desde setembro de 2006, que indica forte expansão da economia.

Com isso, o dólar, que chegou a subir mais de 1% frente ao real, fechou em queda de 0,14%, cotado a R$2,118, após um leilão de compra de moeda pelo Banco Central (BC), que adquiriu cerca de US$800 milhões, segundo operadores. O risco-Brasil avançou 1,55%, para 196 pontos centesimais. A média de risco das economias emergentes ficou em 182 pontos, uma alta de 2,20%.

Greenspan volta atrás e diz que recessão é improvável

Também trouxeram alívio as declarações do ex-presidente do Fed Alan Greenspan. Ele afirmou, durante encontro em Tóquio, que uma recessão americana, embora possível, é improvável neste ano. Na segunda-feira, no entanto, ele havia dito que a expansão da economia americana poderia estar próxima do fim e que uma recessão poderia ocorrer no fim deste ano. As declarações ajudaram a derrubar os mercados no dia seguinte, junto com especulações sobre controle de capitais na China.

Segundo analistas, a bolsa de Xangai subiu 4% anteontem porque o governo chinês obrigou alguns bancos de investimento a comprarem ações, para reduzir o ritmo de perda dos mercados. Chineses também fizeram fila em corretoras para comprar os papéis, após a maior queda dos últimos dez anos.

Boatos sobre um pacote anti-especulação que seria lançado pelo governo chinês e preocupações sobre a dependência das economias locais do comércio internacional levaram a novas quedas nas bolsas asiáticas. Além das perdas de 2,91% em Xangai, as bolsas de Japão (- 0,86%) e Taiwan (- 2,83%) também recuaram.

O governo chinês vive um dilema: evitar a especulação dos mercados após as ações dobrarem de preço em um ano ou estimular essa importante forma de captação de recursos das empresas. Alheios a isso, os investidores formaram ontem uma enorme fila no escritório do China Construction Bank (CCB), no Centro de Pequim, responsável pela venda de cotas do fundo de ações do banco, aberto para pessoas físicas no início da semana.

Segundo o governo da China, a indústria de fundos de ações captou 400 bilhões de yuans (US$51,61 bilhões) ano passado. A idéia de ter ações em bolsa seduz o imaginário dos chineses em busca de status e prestígio: além de lucrativo, é chique nas rodas de amigos e no escritório. Com isso, o governo determinou a criação de programas de esclarecimento com relação ao risco e à volatilidade dos mercados.

(*) Correspondente (com agências internacionais)