Título: R$1,7 trilhão vira pó
Autor: Eloy, Patricia
Fonte: O Globo, 03/03/2007, Economia, p. 27

Em quatro dias, bolsas dos EUA e da América Latina perderam bem mais que no 11 de setembro

Patricia Eloy

Oreceio dos investidores em relação a uma desaceleração brusca da economia dos EUA - a locomotiva do crescimento global, junto com a China - provocou ontem um dia de perdas generalizadas nos mercados globais. A exceção foi a Bolsa de Xangai, que subiu mais de 1%, recuperando as perdas dos dias anteriores. No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) encerrou o pregão em queda de 2,64%. No pior momento do dia, chegou a cair quase 3%.

Desde o início do estresse nos mercados, na última terça-feira, até ontem, as bolsas da América Latina e dos Estados Unidos viram sumir do mapa US$799,7 bilhões (R$1,705 trilhão), bem mais do que após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Naquela ocasião, os mercados encolheram US$555,2 bilhões - parte no próprio dia 11, parte em 17 de setembro, quando os pregões americanos reabriram.

Segundo levantamento da consultoria Economática, mais de US$66 bilhões desapareceram da Bovespa desde terça-feira, seis vezes mais do que em 2001 (US$11 bilhões). Para se ter uma idéia de quanto representa essa perda, o valor de mercado da cadeia de fast food McDonald"s é de US$53,1 bilhões. Já as bolsas dos EUA perderam, nesses quatro dias, US$694,1 bilhões.

Meirelles não vê risco para o Brasil

Os olhos dos investidores, dizem os analistas, não estão concentrados na Ásia, mas sim nos Estados Unidos. Uma crise nos EUA afetaria a economia global e reduziria o apetite de risco dos investidores, que tenderiam a retirar seus recursos de mercados emergentes, como o Brasil.

Por isso, os mercados tremeram ontem diante da divulgação de mais um indicador negativo da economia dos Estados Unidos. A confiança do consumidor americano medida pela Universidade de Michigan recuou em fevereiro para o menor nível desde setembro do ano passado. Ficou em 91,3 pontos, ante uma expectativa dos investidores de 93,5.

Nem mesmo as declarações do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de Saint Louis, William Poole, de que a economia dos EUA não caminha para uma recessão, conseguiram aplacar o nervosismo dos investidores. Com isso, as bolsas americanas fecharam em forte queda. O Dow Jones fechou em queda de 0,98%. Já o índice Nasdaq, que reúne as ações de tecnologia, caiu 1,51%. E o S&P 500, que inclui as 500 maiores empresas americanas, recuou 1,14%. Nos mercados asiáticos, apesar da alta de 1,23% na Bolsa de Xangai, o dia foi de nervosismo. A Bolsa de Tóquio caiu 1,35%. Na Coréia do Sul, as perdas foram de 0,20%.

No Brasil, o dólar voltou a subir. Fechou com alta de 0,71%, a R$2,133, próximo à máxima do dia, de R$2,135. O Banco Central (BC) fez um novo leilão de compra de moeda, o que ajudou a pressionar as cotações. O risco-Brasil, indicador da confiança dos investidores estrangeiros no país, subiu 2,55%, para 201 pontos centesimais, bem menos do que a média dos emergentes, que avançou 3,23%, para 192 pontos.

O presidente do BC, Henrique Meirelles, amenizou ontem a crise nos mercados internacionais e disse que os ajustes já eram previstos "há um certo tempo".

- A grande questão é se este é um processo pontual ou se faz parte de um ajuste maior. Vai depender muito do mercado imobiliário nos Estados Unidos. É preciso ver até que ponto isso vai se espalhar ou não, ou contaminar outros mercados. Até agora não tem acontecido.

Para Meirelles, o Brasil tem grandes chances de não sofrer os efeitos negativos dessas oscilações: - O Brasil hoje está em uma posição de muito mais força do que esteve nas últimas décadas para passar por situações desse tipo. Tem reservas de US$100 bilhões e saldo em conta corrente.

Saem as normas do pacote cambial

Sete meses depois de anunciado o pacote cambial, que permitiu que os exportadores deixem no exterior 30% do valor recebido pelas vendas externas, a Receita Federal publicou ontem, no Diário Oficial, a instrução normativa que regula essa prática. Diversos empresários brasileiros aguardavam a edição do ato da Receita para poderem utilizar o novo mecanismo.

Segundo o coordenador-geral de Fiscalização da Receita, Marcelo Fisch, a demora se deveu ao fato de que, pela primeira vez na história do país, o órgão passará a controlar contratos de câmbio. Ele esclareceu, porém, que a internalização no país de 70% dos recursos recebidos pelos exportadores já era possível desde agosto do ano passado.

COLABORARAM Lino Rodrigues e Eliane Oliveira