Título: Governo russo prepara nova doutrina militar
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Fonte: O Globo, 06/03/2007, O Mundo, p. 24

Intenção é modernizar Forças Armadas para fazer frente à Otan e ao projeto de escudo antimísseis americano

MOSCOU. Depois de endurecer o discurso contra os EUA, o governo da Rússia anunciou ontem que prepara uma nova doutrina militar, com o objetivo de fazer frente ao fortalecimento e expansão da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e à idéia de Washington construir um escudo antimísseis na Europa. Em nota, o Conselho de Segurança da Rússia (SCRF, na sigla em inglês), um órgão consultivo do Kremlin, disse que ¿a configuração da presença militar no mundo está mudando e as alianças militares, especialmente a Otan, estão mais fortes¿. Segundo o SCRF, a atual doutrina militar russa ¿ promulgada pelo presidente Vladimir Putin em 2000 ¿ precisa ser revista para acompanhar a modernização bélica das principais potências, que ¿cada vez mais interferem na política dos principais Estados do mundo¿.

Impulsionado pelo crescimento econômico de seu país ¿ devido aos altos preços do petróleo e do gás ¿ Putin usou nas últimas semanas uma retórica em que claramente mostra o seu interesse de inserir novamente a Rússia no cenário das grandes potências mundiais, adotando uma política externa mais agressiva. O presidente criticou abertamente o governo americano e ameaçou romper um tratado nuclear com os EUA, caso o escudo antimísseis seja construído na Polônia e na República Tcheca (integrantes da Otan). O SCRF já havia citado o escudo como uma ameaça direta. A doutrina atual já prevê, por exemplo, o uso em primeira instância de armas nucleares em caso de uma grave ameaça à Rússia. A nova doutrina será elaborada por integrantes linha-dura do governo Putin.

Escudo pode afastar Rússia da UE, diz chanceler

O anúncio do Kremlin coincide com um intenso debate dentro da União Européia (UE) sobre a construção do escudo. O premier tcheco, Mirek Topolanek, defendeu ontem o projeto, aumentando a preocupação de vários países europeus de que o escudo possa prejudicar as relações do bloco com a Rússia.

¿ É incompreensível, depois do fim do século XX e da queda do Muro de Berlim, as hostilidades voltarem a aumentar. Se jogarmos a Rússia para escanteio, não teremos estabilidade na Europa ¿ argumentou o chanceler de Luxemburgo (país integrante da Otan), Jean Asselborn, que defende uma decisão conjunta da UE sobre o escudo americano.