Título: Unidos para driblar a Lei Fiscal
Autor: Jungblut, Cristiane e Beck, Martha
Fonte: O Globo, 07/03/2007, O País, p. 3

O governo federal não aceitou compartilhar a receita da CPMF com estados, mas cedeu, com promessas, numa das principais reivindicações dos governadores: o aumento da capacidade de investimento, e conseqüentemente de endividamento, dos estados. Para isso, o governo abriu a possibilidade de os estados financiarem suas dívidas com a União no mercado financeiro, o que ainda será detalhado. Além disso, o governo prometeu encontrar uma forma de liberar os Executivos estaduais das exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para a obtenção de empréstimos em instituições estrangeiras, como Bird e BID. A Lei Fiscal foi aprovada em 2000 justamente para moralizar e conter os gastos públicos.

Os governadores reclamaram que têm as contas do Executivo em dia, de acordo com a LRF, mas ficam impedidos de buscar novos créditos por causa de problemas financeiros do Judiciário ou do Legislativo estadual. Na primeira reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com os 27 novos governadores, na Granja do Torto, o governo federal se mostrou sensível a pelo menos sete dos 14 pontos apresentados previamente, contrariando a expectativa do próprio grupo.

Aécio: Lula quer entrar para a História

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que essas iniciativas do governo permitirão que os estados aumentem sua capacidade de investimento. O presidente conseguiu seu objetivo: os governadores, inclusive da oposição, saíram fazendo rasgados elogios a Lula. Como previsto, a reforma tributária ficou para o futuro.

- Hoje, começamos a discutir uma agenda nacional. Não temos condições de compartilhar a CPMF nem a Cide com os estados, mas podemos tomar medidas que vão elevar a arrecadação deles. Há uma questão da LRF que acaba afetando o estado como um todo, e ficamos de estudar como liberar o Executivo (estadual) das faltas cometidas por outros entes estaduais - disse Mantega.

Na prática, o governo federal acaba resolvendo um problema indireto do PAC: a falta de recursos dos estados para as obras complementares às previstas no programa de crescimento.

- Diria que, de todas as reuniões de que aqui eu já participei, essa é a que me dá mais esperança de que o presidente agora, com o compromisso não apenas com o seu partido ou com a sua própria reeleição, mas com o compromisso com a História, saberá iniciar ou reiniciar o pacto federativo no Brasil. Para isso, ele contará com a nossa solidariedade. O presidente deu a demonstração, e acredito na sua sinceridade, de que pretende fazer alguns gestos para os estados - disse Aécio Neves, que acrescentou: - Vi um presidente querendo entrar para a História. O presidente viu que estava diante de homens públicos e não adversários.

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), elogiou o fato de o governo ter aceitado a proposta de desonerar da cobrança de PIS/Cofins as empresas de saneamento estaduais, elevando a capacidade de investimento em projetos, inclusive os do PAC.

- Foi uma reunião longa, e eu diria que foi produtiva. No caso do saneamento, será R$1,3 bilhão a mais em saneamento, na veia do sistema. É muito importante - disse Serra.

Ao falar das conversas sobre renegociação das dívidas e reforma tributária, Serra foi mais cauteloso:

- Foi um bom diálogo. É preciso agora que haja passos concretos.

No caso das dívidas, o governo federal aceitou duas propostas: permitir o financiamento da dívida dos estados com a União junto ao setor privado e possibilitar a alienação da dívida ativa dos estados, ou seja, que o estado passe para o setor privado a cobrança de seus créditos em dívida ativa - a securitização da dívida.

"Mantega não é tão duro quanto parece"

Ao lado de Mantega, o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (PFL), foi porta-voz dos colegas.

- Na média, os governadores viram parte de suas reivindicações atendidas. Diria que Mantega não é tão duro quanto parece - brincou.

- Não sei se isso me compromete ou me ajuda, na medida em que o ministro da Fazenda tem que ser duro mesmo - respondeu Mantega.

No caso da negociação das dívidas junto ao mercado financeiro, Mantega ressaltou que o governo ainda estudará como isso será feito legalmente. O mesmo ocorre com a alienação da dívida ativa dos estados.

Já a reforma tributária, que o governo tanto queria, ficou para depois e condicionada pelos governadores à divisão dos recursos da CPMF e da Cide. Por enquanto, o governo quis mesmo garantir apoio para prorrogar CPMF e DRU este ano, no Congresso.

COLABORARAM: Regina Alvarez e Adriana Vasconcelos