Título: América do Sul corre para modernizar tropas
Autor: Valente, Leonardo
Fonte: O Globo, 07/03/2007, O País, p. 14

Hugo Chávez dribla embargo americano comprando caças, fuzis e helicópteros da Rússia.

Chile e Venezuela desbancam Brasil e Argentina na compra de novas armas. Movimento preocupa os EUA.

A corrida para a modernização das forças armadas em alguns países da América do Sul está despertando o interesse de governos, como a Rússia, e a preocupação de vizinhos e principalmente do governo do presidente americano, George W. Bush, que desembarca amanhã em São Paulo. Brasil e Argentina, que tradicionalmente eram os que mais investiam na renovação de suas forças, perdem agora para Chile e Venezuela. Segundo o jornal argentino "La Nación", os chilenos foram os que mais investiram em modernização de seu equipamento de defesa em 2006, cerca US$2,7 bilhões. A Venezuela - a maior dor de cabeça dos EUA na região - ficou em segundo, com gastos de US$2,2 bilhões. O Brasil, apesar de ter um orçamento militar de cerca de US$6 bilhões (o maior do continente), ficou com o terceiro lugar em investimentos para modernização das tropas, com US$1,3 bilhão. Já a Argentina registrou apenas US$800 milhões.

No Chile, a chamada lei do cobre, principal matéria-prima do país, é o principal motor do impressionante rearmamento das tropas. Segundo a lei, 10% da receita bruta proveniente das exportações do metal é destinada às Forças Armadas. Recentemente, o país comprou 16 caças F-16 dos EUA, considerados de primeira linha, tanques alemães Leopardo 2, que estão entre os melhores do mundo, e investe pesado em treinamento de seu efetivo. O governo chileno, no entanto, diz que não quer promover uma corrida armamentista.

- Nossas compras só têm como objetivo modernizar as Forças Armadas, que estavam defasadas tecnologicamente. Não são aquisições sistemáticas - disse a presidente Michelle Bachelet no anúncio da compra dos caças americanos.

Especialista diz que é pontual

Mas o temor entre os vizinhos é notório. Peru e Equador seguiram o exemplo chileno e suas forças armadas passaram a receber participação nas exportações de petróleo de seus países. A Bolívia também pretende fazer o mesmo com o gás natural.

Mesmo sofrendo um boicote na venda de armamentos pelos EUA, a Venezuela também investe pesado na modernização de suas tropas, para irritação de Washington e alegria dos russos, os maiores fornecedores de Caracas. Foram comprados da Rússia no ano passado 24 caças Sukhoi-30 e Sukhoi-35, cem mil fuzis AK-103 e dez helicópteros de última geração. O embaixador dos EUA no Brasil, Clifford Sobel, ao falar das compras de armamentos pelo presidente Hugo Chávez, deixa claro o desconforto da Casa Branca:

- Todos os países do hemisfério e de outros lugares deveriam se preocupar com qualquer país que adquire armas além de suas necessidades de autodefesa.

Apesar dos investimentos em modernização no continente, o professor Domício Proença, coordenador do Grupo de Estudos Estratégicos da Coppe/UFRJ e membro do Instituto de Estudos Estratégicos, de Londres, não vê um movimento no continente que possa ser classificado como corrida armamentista:

- Não há qualquer indício neste sentido. O que estamos vendo são compras pontuais pelos países de novos armamentos para modernizar suas forças. Os números altos não refletem uma tendência ainda. Os países sul-americanos não têm condições de manter esses gastos todos os anos. Somente se esse volume de despesa se repetir no próximo ano é que podemos considerar a hipótese de corrida armamentista