Título: Mantega quer veto à emenda sobre contratação
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 07/03/2007, Economia, p. 31

Ministro considera que texto restringe demais trabalho dos fiscais da Receita. Decisão de Lula sai até o dia 16.

BRASÍLIA. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que vai recomendar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que vete a emenda 3, incluída no projeto de lei que criou a Super Receita. O texto, aprovado por ampla maioria no Congresso, estabelece que a prerrogativa de contestar um contrato firmado entre duas pessoas jurídicas para a prestação de serviços é da Justiça do Trabalho e não do fiscal.

A medida, que Lula tem até o dia 16 para sancionar ou vetar, abriu polêmica porque algumas entidades e ministros consideram que ela tira poder dos fiscais. A emenda 3 reafirma que a Justiça do Trabalho é que pode julgar se um profissional que presta serviços como pessoa jurídica deve ser considerado pessoa física (assalariado).

Já outras entidades, tributaristas, advogados e juristas consideram que a emenda 3 apenas reforça uma área de fronteira na qual o fiscal não pode atuar. O Palácio do Planalto quer ouvir todos os lados e está estudando as argumentações favoráveis e contrárias à sanção da emenda 3.

Para Mantega, a emenda restringe demasiadamente o trabalho de fiscalização feito por auditores das Receitas Previdenciária e Federal. Sua recomendação de veto segue a mesma linha do Ministério do Trabalho e de áreas técnicas da Receita Federal.

- É claro que ninguém deve permitir abusos por parte dos auditores. Porém, quando há uma investigação a ser feita, o auditor tem que poder atuar. Ela (emenda) é muito extremada - justificou o ministro.

Para o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, a emenda 3 não traz limitação ao trabalho dos fiscais. Segundo ele, não é papel do fiscal reclassificar uma pessoa jurídica como pessoa física (assalariado), e isso não tem relação com o trabalho de fiscalização tributária:

- O fiscal não pode desconsiderar uma pessoa jurídica que está prevista na lei. Isso é um evento e não compromete a fiscalização. É como ele querer multar, por não recolher impostos, uma empresa que se instalou na Zona Franca de Manaus, justamente para usufruir do benefício de isenção que a lei concede.

Entidades como a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) entendem, porém, que a emenda é restritiva e abriria brechas ao abuso das empresas e à criação de entraves até mesmo ao combate do trabalho escravo.

O ex-secretário da Receita considera infantil a tentativa de vincular os efeitos da emenda 3 ao trabalho escravo: - As pessoas em trabalho escravo são pessoas físicas e não jurídicas. A não ser que você imagine essas pessoas constituindo uma empresa para serem escravizadas.

Atualmente, os fiscais da Receita Federal autuam as empresas quando concluem que prestadores de serviços contratados como pessoa jurídica estão na verdade dissimulando um vínculo empregatício para fugir de encargos.

- Essa é a visão da máquina de arrecadação. Essa atitude violenta as duas partes na sua vontade livre de firmar um contrato. Até o juiz só pode fazer isso a pedido de uma das partes interessadas - disse o advogado especialista em legislação trabalhista Luiz Carlos Robortella.