Título: Não é Bush que conterá Chávez
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 08/03/2007, O País, p. 9

CIDADE DO MÉXICO. Bush tem mini-planos para cada parada deste seu giro pela América Latina: etanol e rodada de Doha no Brasil; acordos comerciais no Uruguai; Plano Colômbia e combate a drogas em Bogotá; imigração e segurança em México e Guatemala. Mas há uma agenda mais ampla que foi percebida tardiamente pelos EUA e, na verdade, pode avançar muito pouco: a contenção de Hugo Chávez.

O balanço de forças na América Latina mudou. A inclinação à esquerda persistiu, a influência de Chávez aumentou. Aqui, ele encontrou espaço e usou impressionantes ferramentas para seduzir a região. Graças a retóricas anti-EUA, lucros ilimitados com a venda de petróleo (por enquanto), um fluxo sem fim de médicos, educadores e especialistas em segurança cubanos - e, em breve, armas russas em abundância -, o novo caudilho do Caribe está fazendo a festa. Chávez foi habilidoso ao explorar o desapontamento da região, que quase não cresceu economicamente nas últimas duas décadas. Ele fornece o que está faltando a muitos países: petróleo a baixos custos, alimentos, saúde.

Chávez foi estendendo seu alcance: na Bolívia, é idolatrado por Evo Morales; na Argentina, seu colega populista Néstor Kirchner deixou-o preparar uma grande manifestação anti-Bush; Equador, Nicarágua. Guatemala e Paraguai podem ser os próximos.

Enquanto as medidas econômicas de Chávez só dizem respeito à população venezuelana - se ele quiser destruir a economia o problema é dele e de seu povo - quando o presidente busca aumentar sua concentração de poder na Venezuela ou em qualquer outro lugar o problema vira de todo o mundo. É hora de as pessoas acordarem para isso.

O problema é que George W. Bush é a pior pessoa do mundo para tentar contê-lo. Bush é extremamente impopular aqui. Muita gente aposta que, se ele defender a democracia na América Latina - como ele faz no caso do Iraque - somente Deus poderá ajudar os democratas latinos.

A boa notícia é de que há alguém capaz de fazer o trabalho, se receber apoio político e suporte financeiro: o presidente do México, Felipe Calderón. Defensor de direitos humanos e democracia, assim como entendedor de políticas macroeconômicas e das necessidade de programas eficazes de combate à pobreza, ele é capaz de travar uma queda de braço com Chávez e os irmãos Castro. Ele é mais apto do que os demais líderes da região.

A esquerda brasileira, por exemplo, não deixaria o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lidar com Chávez, mesmo se ele quisesse. No Chile, exemplo esplêndido de como políticas sociais e de esquerda podem ser bem sucedidas, Michele Bachelet já provou não querer lidar com o problema. Calderón tem um problema. Partidos mexicanos alinhados a Fidel, Chávez e Kirchner protagonizaram sua conturbada recente eleição (declarando-a ilegal). O presidente, por isso, está relutante em enfrentar adversários, se Bush não lhe der respaldo. Mas, se o apoio vier, com um comprometimento sério em relação a reformas na política de imigração, por exemplo, Calderón adoraria promover debates de idéias para conter a onda populista na América Latina. Idéias são melhores do que possíveis tentativas de Washington de resolver a questão na marra.

JORGE G. CASTAÑEDA é escritor e ex-chanceler do México, e escreveu este artigo para o "Washington Post"