Título: Onda de protestos: Via Campesina invade usinas
Autor:
Fonte: O Globo, 08/03/2007, O País, p. 14

Bush entra em cena no momento em que Lula fez uma opção pelo capitalismo", diz dom Tomás.

Entidade ocupa também minas e engenhos; houve manifestações contra o presidente americano em diversos estados.

SÃO PAULO, BELO HORIZONTE, FORTALEZA, RIO e RECIFE. Na véspera da chegada do presidente George W. Bush a São Paulo, centenas de mulheres da Via Campesina, a internacional camponesa que unifica movimentos como o MST, a CUT e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), invadiram ontem a maior usina de álcool do país, a Cevasa, em Patrocínio Paulista (SP), controlada pela americana Cargill Agrícola. A entidade também comandou invasões e protestos no Rio, em Minas, no Ceará e em Pernambuco.

A invasão foi um protesto contra a parceria que Bush pretende firmar com o Brasil para a produção de etanol, segundo o representante da Via Campesina no Brasil e líder do MST, João Pedro Stédile. Para os movimentos sociais, o acordo trará destruição ambiental e não produzirá empregos.

- Bush entra em cena num momento em que Lula fez mesmo uma opção pelo capitalismo. Agora não é mais reforma agrária, é o agronegócio. Não tenham ilusões. Esse acordo só favorecerá as transnacionais e as oligarquias, e destruirá ainda mais o meio ambiente - disse dom Tomás Balduíno, da CPT.

- Mister Bush é um office-boy de três grupos transnacionais: petrolíferas, agronegócios e automobilísticas. Esses grupos miram o controle do agrocombustível em todo o mundo. Esperamos que o presidente Lula valorize os votos da população e não assine nenhum tratado, porque sofreremos enormes consequências: poluição, desemprego e mais pobreza. Para cada cem hectares plantados, a cana emprega apenas uma pessoa - disse Stédile.

Ocupação deu prejuízo à Vale

Segundo a Via Campesina, 900 mulheres ocuparam a Cevasa ontem de madrugada. A usina é a maior do Brasil: produz 1,4 milhão de toneladas de cana por ano ou 125 mil litros de álcool. A Cargill, que detém 63% do capital da Cevasa, não quis se manifestar. A Cevasa, por sua vez, informou que foi invadida por 200 manifestantes, às 6h de ontem.

Em Minas, mulheres da Via Campesina interditaram, por quatro horas, a entrada da Mina Capão Xavier, de extração de ferro, em Nova Lima, na Grande Belo Horizonte. A manifestação reuniu cerca de 350 pessoas. O acesso foi liberado no fim da manhã. Em nota, a Companhia Vale do Rio Doce, uma das proprietárias da mina, condenou a ação e informou que cerca de 12 mil toneladas de minério de ferro deixaram de ser produzidas.

No Ceará, cerca de 500 mulheres da Via Campesina ocuparam ontem, por seis horas, o trevo da Chapada do Apodi, bloqueando a principal via de escoamento da produção de fruticultura irrigada de Limoeiro do Norte, a 198 quilômetros de Fortaleza. A região é maior produtora de frutas para exportação. Em Alagoas, pelo menos duas mil mulheres da Via Campesina e outros movimentos participaram de um ato contra o agronegócio e a transposição das águas do Rio São Francisco. Elas ocuparam a Secretaria de Agricultura do estado.

Em Pernambuco, mulheres ligadas à entidade ocuparam o engenho São Gregório, destruíram parte dos canaviais e deram início ao plantio de feijão e milho, em protesto contra a a monocultura açucareira. O engenho pertence à Usina Estreliana, cujas terras são reivindicadas pelos sem-terra há mais de cinco anos. Segundo o MST, cerca de 200 mulheres participaram, mas a direção da usina diz que foram apenas 20 pessoas. Em nota, a direção da usina chama o ato do MST de "baderna".