Título: Brasileiro made in China
Autor: Beck, Martha e Duarte, Patricia
Fonte: O Globo, 09/03/2007, Economia, p. 23

Das empresas nacionais, 25% sofrem com concorrência e 12% das grandes produzem lá.

Uma em cada quatro empresas brasileiras enfrenta a concorrência de produtos chineses no mercado doméstico, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O trabalho mostra um quadro preocupante: 52% das companhias que disputam o mercado nacional com a China já registraram queda nas vendas, e no exterior esse percentual sobe para 58%. Além disso, 12% das grandes empresas entrevistadas já têm parte de sua produção feita na China, onde os custos são menores. Foram ouvidas 1.581 pequenas, médias e grandes firmas.

- O processo de competição com a China está se intensificando, e as empresas brasileiras percebem isso tanto no mercado nacional quanto o exterior - disse o coordenador da Unidade de Política Econômica da CNI, Flávio Castelo Branco.

Mais da metade das exportadoras enfrenta concorrência chinesa

No grupo de empresas que decidiram usar a China como plataforma de produção, 7% têm fábrica própria no país asiático e 5% terceirizaram parcialmente as atividades. Entre os setores estão o automotivo, o de máquinas e materiais elétricos e o de metais. Castelo Branco diz que não é possível atestar se há troca do Brasil pela China ou fuga de investimentos. Segundo ele, a internacionalização das empresas brasileiras é positiva e só deve ser considerada preocupante se prejudicar a indústria nacional, o que não é possível captar pelo estudo:

- Uma empresa pode ter transferido parte de sua produção para a China por uma questão de logística, para poder vender com mais facilidade para o mercado asiático, ou para reduzir parte de seus custos.

No mercado doméstico, os setores mais prejudicados são têxtil, de vestuário, de equipamentos hospitalares e calçados. Três em cada quatro empresas têxteis e duas em cada três de vestuário já perderam espaço para os chineses. O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados, Elcio Jacometti, diz que o setor está sendo "massacrado". O Brasil importou sete milhões de calçados chineses em 2004, número que pulou para 14,7 milhões em 2006. Segundo Jacometti, os brasileiros preparam um pedido de aplicação de direitos antidumping:

- Muitos produtos entram no Brasil subfaturados ou contrabandeados. Até setembro, entraram três a quatro milhões de pares declarados por menos de US$1. Qual é o calçado que custa isso?

No mercado internacional, 54% das empresas exportadoras sofrem com a ameaça chinesa. Nesse grupo, 6% deixaram de atuar no exterior, e 88% das exportadoras de móveis e de madeira perderam clientes. O dólar enfraquecido, os juros e a carga tributária elevados são os principais vilões. O diretor superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel, diz que as importações crescem 40%, enquanto as exportações estão estagnadas. A saída é desonerar o setor. No setor eletroeletrônico, o quadro é parecido. Está mais barato montar alguns itens - como batedeiras e liquidificadores - lá fora e depois trazê-los.

As empresas também tentam enfrentar a concorrência chinesa com redução de custos e mais qualidade. É preciso ainda diferenciar marcas e, até, reduzir a margem de lucro.

O ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, reconhece que a competição com a China ficou mais acirrada. Mas ele afirmou ontem que a compra de produtos chineses considerados sensíveis - especialmente têxteis e vestuário - está perdendo a força, depois de acordos voluntários de cotas de exportação pela China. Furlan disse ainda que o governo está mais eficiente no combate às fraudes nessas importações, e que o patamar do câmbio não mudará tão cedo.