Título: Governo convocará 2,6 milhões de aposentados
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 11/03/2007, Economia, p. 35

Afastados por invalidez, eles precisarão fazer novos exames médicos. Objetivo é economizar R$11,3 bilhões

Geralda Doca

BRASÍLIA. O governo começará a convocar, em julho, 2,6 milhões de aposentados por invalidez para fazerem novos exames médicos, a fim de verificar o quadro de saúde desses segurados. Quem estiver plenamente recuperado e em condições de voltar à ativa terá o benefício cancelado. A medida será tomada pelo Ministério da Previdência, que há 15 anos não revisa esses benefícios e pretende, com o recadastramento, economizar R$11,29 bilhões nos próximos quatro anos.

De acordo com o plano de ação - considerado a principal medida de gestão para melhorar as contas do INSS do segundo mandato do governo do PT - serão chamados inicialmente os 2,2 milhões de aposentados considerados inválidos com menos de 50 anos e que recebem o benefício por mais de dois anos.

Outros 400 mil brasileiros estão acima dessa faixa etária e serão convocados apenas numa segunda etapa. Como o INSS acredita que eles já têm idade e tempo de contribuição suficientes, deverão ser transferidos para a aposentadoria tradicional do regime geral da previdência.

Primeiro corte deve começar pelos mais jovens

Caso a perícia conclua que o segurado já se recuperou totalmente do problema e tem condições de voltar à ativa, ele terá o benefício cancelado. Mas, para isso, o ministério adotará dois critérios. Primeiro, o corte começará pelas pessoas mais novas, a partir dos 20 anos, e que estão afastadas há entre dois e cinco anos.

Acima desse período, o cancelamento do benefício será feito gradativamente, num prazo de um ano e meio. O valor integral da aposentadoria será mantido nos primeiros seis meses, depois cairá à metade e, nos dois últimos semestres, haverá corte de 25% em cada um, extinguindo-o.

- A idéia é garantir uma transição segura para o beneficiário que recuperou a capacidade mas perdeu o vínculo com a empresa, de forma que ele tenha condições e renda para se manter nesse período de adaptação - afirmou um integrante do governo envolvido nas negociações.

Apesar de a legislação determinar a revisão periódica das aposentadorias por invalidez a cada dois anos, a Previdência, há uma década e meia, as esquece após concedidas. Por esse motivo, os benefícios atualmente têm tempo médio de recebimento de 689 dias, no caso do auxílio-doença (até dois anos de afastamento), e de 4.572 dias, no das aposentadorias por invalidez.

40 mil ditos inválidos trabalham com carteira

O resultado foi uma explosão nos gastos com os benefícios por incapacidade. Se for considerado o auxílio-doença, praticamente um em cada quatro beneficiários do INSS recebe por ser incapacitado, quadro que consome mais da metade do desembolso anual da Previdência. Além do crescimento da despesa, há uma perda de receita, pois esses trabalhadores deixam de ser contribuintes.

Por isso, a meta do Executivo é reduzir a participação deles no universo de 31,2 milhões de segurados dos atuais 14,1% para 7% até 2011. Essa é a média de vários países comparáveis ao Brasil, como o Canadá, por exemplo. Para alcançar esse patamar, o governo vai rever inclusive sua concepção de invalidez, vaga na legislação.

- A taxa brasileira é o dobro da existente em vários países. É preciso considerar que uma pessoa inválida é aquela que está de cama (ou seriamente comprometida psicologicamente). Mesmo quem precisa de cadeira de rodas pode trabalhar - disse um técnico do governo envolvido na elaboração do projeto.

Para Ronaldo Adriano de Souza, de 30 anos, pedreiro aposentado há três anos por invalidez devido a um câncer, a iniciativa do governo servirá para inibir fraudes. Como considera-se enquadrado na legislação, está tranqüilo para enfrentar a revisão. Apesar de ainda ter de enfrentar tratamento por pelo menos mais seis anos, ele disse ter esperança de se recuperar e voltar a trabalhar:

- Sou muito novo, sempre fui trabalhador e não quero ser inválido para o resto da vida.

Já na agência central de atendimento do INSS em Brasília, dois aposentados, relativamente jovens e sem problema aparente, aposentados por Lesão por Esforço Repetitivo (LER), se recusaram a falar com a equipe de reportagem quando informados sobre o tema.

O ministério já detectou, com base nas informações prestadas pelas empresas, que 40 mil trabalhadores aposentados por invalidez estão empregados com carteira assinada. Esse universo pode ser muito maior se for considerado o mercado informal, destacou um técnico do INSS. Quem estiver nessa situação, além de ter o benefício cancelado automaticamente, terá de devolver o que recebeu indevidamente.

Para evitar reações contrárias, o governo pretende deixar claro para a sociedade que está cumprindo a legislação e oferecerá incentivos para recolocar o segurado ainda incapacitado no mercado de trabalho. Para isso, o INSS está fechando, com o Ministério do Planejamento, a criação de uma diretoria específica, com três coordenações: Prevenção e identificação da incapacidade; Recuperação da capacidade laborativa; e Inserção no mercado de trabalho.

Caberá à nova equipe elaborar um banco de dados sobre os aposentados por invalidez e suas opções para voltar ao mercado. Os técnicos dão um exemplo: um motorista de ônibus, afastado por uma doença na coluna e ainda comprometido, passará por uma avaliação para ver qual função pode assumir sem complicar mais a sua condição física. Depois, passará por um programa de reabilitação médica e por treinamento.