Título: Falta uma política industrial
Autor: Paret, Banito
Fonte: O Globo, 13/03/2007, Opinião, p. 7

É, no mínimo, lamentável que no pacote de medidas para incentivar o crescimento da economia divulgado pelo governo federal não se encontre um só item voltado para a indústria brasileira de software. Nenhum programa de desenvolvimento sustentável na era do conhecimento pode ignorar o peso da tecnologia da informação no conjunto da economia. E por tecnologia da informação é preciso que se entenda não apenas a fabricação de microprocessadores e componentes - o hardware, mas também o desenvolvimento do software -, processos e programas que automatizem, simplifiquem e desburocratizem o mundo produtivo.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado como ponto de partida para que o país alcance taxa mais robusta de crescimento, está assentado em duas premissas básicas: melhorar a infra-estrutura nacional na área de bens e serviços; e desobstruir os canais por onde flui a produção, principalmente a logística e os entraves legais e burocráticos. Tanto um quanto outro objetivo passam, inevitavelmente, pelo investimento maciço em TI.

Não resta dúvida que atrair fabricantes internacionais de microprocessadores para produzirem e exportarem do Brasil, como está sendo programado, através da MP 352, é importante para o crescimento industrial e para a área de TI. Mas não podemos ignorar que Tecnologia da Informação é, acima de tudo, geração de conhecimento. Mais ainda: é transformação de conhecimento em capacidade industrial; aplicação do conhecimento gerado nas universidades e centros de pesquisa em processos e programas que aumentem a competitividade do mundo produtivo. Desenvolvimento sustentável é, cada vez mais, domínio de conhecimento.

Nossas universidades e centros de pesquisa equiparam-se ao que há de melhor, no mundo, em capacidade intelectual na área de TI. O que nos falta é um "PAC" que transforme essa excelência intelectual em capacidade industrial. E isso só se faz com um tratamento tributário diferenciado, e com o crescimento de encomendas, principalmente pelo setor público, o maior consumidor nacional de TI. A demanda impulsiona o desenvolvimento de soluções. Só assim incentivaremos efetivamente um setor vital para o crescimento e reduziremos nossa enorme dependência externa.

O mercado de TI, no Brasil, gira aproximadamente US$10 bilhões por ano. Ou mais, segundo alguns especialistas. Mas cerca de 80% desse mercado são dominados por empresas de capital estrangeiro. Essa desnacionalização não é sintoma de incompetência da indústria nacional, como se poderia supor. Resulta de uma cultura enraizada, que prefere comprar pacotes prontos, desenvolvidos no exterior, a desenvolver soluções próprias, desenvolvidas internamente. Com isso, pagamos cerca de US$1,2 bilhão por ano em royalties e licenças de uso. Uma despesa que, somada ao custo de outros serviços, supera o que o país pretende ganhar com a meta de exportarmos US$2 bilhões, em software, por ano, conforme previsto na Política Industrial e de Comércio Exterior - a PITCE.

Um programa de incentivo ao crescimento da economia não pode, portanto, deixar de contemplar uma área infra-estrutural tão importante como a indústria do software, que permeia todo o processo produtivo. E isso se pode fazer com medidas simples, que canalizem a demanda do mercado interno para a indústria nacional. Principalmente às compras públicas com "demandas pioneiras" e utilizando os mecanismos previstos na Lei Geral das Microempresas, dividindo as contratações para privilegiar as MPEs de TI. Outras medidas viáveis poderiam ser de ordem tributária, permitindo que as empresas de software descontem dos demais tributos devidos o que recolhem de encargos sobre a folha de pagamento.

Não pedimos que se proíba a entrada das empresas estrangeiras. Queremos, sim, um "PAC" para a indústria nacional. Dispomos de centros de excelência suficientemente preparados para desenvolver os produtos mais sofisticados na área de software. Nossa experiência em automação bancária, no uso da internet para as declarações do Imposto de Renda, nas eleições, entre outros exemplos, é prova disso. O que nos falta é uma política industrial que de fato proteja a empresa brasileira.

BENITO PARET é presidente do Sindicato das Empresas de Informática do Estado do Rio de Janeiro.