Título: Bolha nos EUA abala mercados
Autor: Santos, Ana Cecília
Fonte: O Globo, 14/03/2007, Economia, p. 19

AMEAÇA EXTERNA

Inadimplência imobiliária americana cresce, gera temor de colapso no setor e derruba índices.

Oaumento da inadimplência no mercado imobiliário americano para o nível mais alto em três anos e meio e o anúncio de que uma nova grande empresa de crédito hipotecário está com problemas de caixa aumentaram o temor de desaceleração da economia dos Estados Unidos e derrubaram as bolsas no mundo. Após três altas consecutivas, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) seguiu o mau humor externo e fechou em queda de 3,39%. Todas as 57 ações do Ibovespa sofreram desvalorização. Desde a turbulência iniciada na China, em 27 de fevereiro, o Ibovespa acumula perda de 7,48%.

A queda nos mercados começou com a divulgação de dados abaixo do esperado no varejo americano. Mas o pior veio quando a Associação de Bancos de Financiamento Imobiliário informou que os atrasos nos pagamentos de hipotecas saltou, no último trimestre de 2006, para 4,95%, o maior nível desde 2003.

Ameaça de despejo atinge 2,2 milhões

Os casos de execuções hipotecárias alcançaram o seu maior patamar histórico (0,54%), já que os clientes não conseguiram continuar honrando os pagamentos mensais. Cerca de 2,2 milhões de proprietários podem perder suas moradias até o fim do ano, como conseqüência dos empréstimos de alto risco que contraíram, com prestações cada vez mais elevadas.

Um dia depois de a New Century Financial Corp. ter anunciado que apresenta risco de falência, sua principal concorrente no setor de crédito imobiliário de alto risco, a Accredit, alertou o mercado para problemas de caixa. A preocupação com os empréstimos de segunda linha no mercado imobiliário (subprime), que têm risco elevado por não exigirem garantias, levou o índice Dow Jones a fechar em queda de 1,97%, a segunda maior do ano, e o Nasdaq, em baixa de 2,15%. As principais bolsas européias e as asiáticas também registraram desvalorização.

Segundo Carlos Cintra, especialista em renda fixa do Banco Prosper, o principal problema é que os dados negativos sobre o setor imobiliário vieram em um cenário que não é de recessão:

- Os dados do setor imobiliário mostram que a inadimplência está muito alta, semelhante aos níveis de 2001, quando havia recessão. Como o cenário hoje não é esse, esperava-se que os dados viessem melhores. Mas o setor imobiliário americano está muito alavancado. Como os bancos resolveram cortar o financiamento, cresceu a pressão sobre as empresas de concessão de crédito imobiliário.

Para Daniella Marques, analista de renda variável da Mercatto, é cedo para apontar que os dados negativos confirmam aumento no ritmo de desaceleração da economia dos EUA:

- A economia americana já vinha desacelerando, e os dados pessimistas aumentaram o temor de que esse ritmo possa se acentuar. Mas ainda é cedo para previsões mais pessimistas. Como o Brasil é um dos principais mercados na lista dos emergentes a receber crédito externo, em um momento como esse, a bolsa local sofre.

Acompanhando o desempenho da Bolsa, o risco-país - um dos principais termômetros da confiança dos investidores na economia - subiu 4,76%, para 198 pontos centesimais. O dólar também subiu 0,76%, fechando em R$2,104.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu ontem que o governo está "fortemente preocupado" com a alta valorização do real , mas descartou qualquer medida adicional para conter esse movimento. Segundo ele, o governo manterá a política de câmbio atual, elevando reservas e reduzindo juros. Mantega disse ainda que o Brasil está mais resistente a choques externos e passou com sucesso pelas turbulências iniciadas com a queda da Bolsa de Xangai.

- O Brasil não está mais à mercê da economia mundial.

COLABOROU Martha Beck (com agências internacionais)