Título: As nuvens escuras
Autor: Franco, Ilimar
Fonte: O Globo, 19/03/2007, O Globo, p. 2

O segundo governo Lula começa em vôo de cruzeiro, mas há ameaça de turbulência no horizonte. A obstrução comandada pela oposição, na semana passada, deu a medida das dificuldades que o governo pode enfrentar para aprovar temas polêmicos. A reação da base aliada à CPI do Apagão Aéreo na Câmara uniu a oposição, que no Senado terá a CPI das ONGs para fustigar o governo.

Os aliados dizem que o atual clima político decorre do comportamento conciliador do PSDB e da unidade do PMDB no apoio ao governo. Os Democratas (PFL) estavam sós na oposição. Os tucanos chegaram a ajudar o PT a eleger o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). Essa construção foi trincada com a CPI do Apagão. O governo não negociou com os tucanos, que ficaram a reboque dos Democratas.

Os integrantes da oposição avaliam que a condução arrogante no debate sobre a CPI foi decisiva para unir a oposição. Eles apostam em novos erros do governo para impedir a aprovação da prorrogação da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF) e da Desvinculação de Receitas da União (DRU). Para os Democratas, acabar com a CPMF é estratégico, não só para criar uma identidade com as parcelas médias do eleitorado mas, principalmente, para inviabilizar a ação governamental.

Na base aliada também há focos de instabilidade. O governo ainda não recebeu a conta pela derrota do grupo do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), do senador José Sarney (AP) e do deputado Jader Barbalho (PA), na disputa no PMDB. Nem se pode prever os desdobramentos do conflito entre o projeto do Bloco de Esquerda (PSB-PCdoB-PDT) de lançar candidato à Presidência em 2010 e o do PT de fazer um dos seus o sucessor do presidente Lula.

O comportamento do PT diante do novo ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia, também é imprevisível. Na semana passada, os petistas manobraram para que ele não fosse escolhido. O partido não aceita ficar fora da coordenação política e se ressente de não ter nenhum dos líderes no Congresso. O PT não vai reagir agora. O governo está começando e é preciso aprovar o PAC. Mas já há aliados, e oposicionistas, fazendo apostas sobre quando e com qual pretexto os petistas iniciarão as ações para desestabilizar o novo ministro. A governabilidade, como se pode verificar e como dizem os políticos, é uma construção permanente.