Título: Governo usa trator para barrar CPI
Autor: Braga, Isabel e Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 21/03/2007, O País, p. 3

Com maioria obtida após divisão de cargos, Planalto derruba investigação do apagão aéreo.

Ogoverno usou ontem a força de bloco majoritário na Câmara e todos os instrumentos regimentais para aprovar, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), parecer contra a instalação da CPI do Apagão Aéreo. Foi o primeiro teste da base do presidente Lula após a partilha de cargos com aliados, principalmente o PMDB. Pelo segundo dia consecutivo, os líderes governistas rejeitaram qualquer acordo com a oposição e conseguiram barrar a CPI para investigar o caos nos aeroportos, apesar de o presidente Lula ter passado a campanha eleitoral dizendo que jamais trabalhara contra uma CPI. Hoje, em sessão extraordinária, os governistas vão tentar enterrar de vez a CPI, com a votação no plenário da Casa.

Depois de um dia inteiro de discussões e bate-boca, a CCJ aprovou, por 39 votos a 21, o parecer do deputado Colbert Martins (PMDB-PA), que alega a falta de fato determinado e problemas na indicação do prazo e dos integrantes da CPI como fatores que impedem a instalação. Apesar de o PDT integrar a base e estar cotado para assumir a Previdência, dois deputados do partido votaram contra o governo na CCJ. Uniram-se a PSDB, PFL e PPS três aliados: os pedetistas Sérgio Brito (BA) e Wolney Queiroz Maciel (PE), e o líder do PV, Marcelo Ortiz (SP).

- Desde ontem, a oposição quer negociar, mas o governo radicalizou. Não tenho dúvida de que a CPI causa um temor para o governo, porque vai mostrar a omissão, a inércia e os esquemas que existem no setor aéreo - acusou o líder do PFL, Onyx Lorenzoni (RS), referindo-se às suspeitas de irregularidades em obras da Infraero.

Oposição ameaça recorrer à Justiça

Apesar de a pauta do plenário estar trancada por MPs, o governo se baseia em parecer da assessoria jurídica da Câmara e reafirma que pode votar hoje o recurso contra a CPI. O argumento é que se trata de matéria administrativa, sem conteúdo legislativo. A oposição discorda. Diz que qualquer votação só poderá acontecer depois de apreciadas as MPs que trancam a pauta, e ameaça ir à Justiça.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), disse ontem que só responderá na próxima semana ao pedido de informações do Supremo Tribunal Federal sobre o requerimento da instalação da CPI. O governo corre contra o tempo para que uma decisão do plenário contrária à CPI sensibilize o relator do processo no STF, Celso de Mello, que poderia optar por não interferir em decisão de outro poder. Chinaglia e líderes governistas admitiram ontem que a decisão do STF será soberana e terá que ser respeitada.

A primeira parte da discussão na CCJ começou por volta das 10h e foi interrompida às 16h15m. Os governistas tentaram, em vão, aprovar o fim da CPI antes do início da ordem do dia no plenário. Sem sucesso, passaram, então, eles mesmos a obstruir a sessão no plenário para voltar à CCJ. Deu certo, e, antes das 19h, o parecer de Colbert havia sido aprovado, depois de mais de sete horas de tensão. Chinaglia tentou minimizar o clima:

- É importante que tanto a CCJ quanto o STF opinem, porque vai criando jurisprudência. O Congresso, e a Câmara em especial, já viveram momentos de tensão infinitamente maiores. Isso é absolutamente insignificante do ponto de vista do papel da Câmara e de tensões reais.

A sessão da CCJ foi retomada por volta das 18h. O líder do PDT, Miro Teixeira (RJ), lamentou a radicalização.

- Reunimos a bancada e decidimos manter nosso apoio à CPI, mas aqueles da oposição que radicalizaram querem mesmo uma CPI? E aqueles que radicalizaram contra a oposição também não erram?

No início da tarde, a oposição propôs que a CCJ suspendesse a discussão até a decisão do STF. Em contrapartida, acabaria com a obstrução. Mas o governo foi irredutível até derrubar a CPI na comissão.