Título: O sonho possível
Autor: Pessoa, Ana Gabriela e Barenboim, Igor
Fonte: O Globo, 23/03/2007, Opinião, p. 7

O que fazer para mudar a atual situação da educação brasileira? Altas taxas de repetência e evasão, má qualidade de ensino, baixas taxas de conclusão do Ensino Fundamental (EF) e do Ensino Médio (EM).

Duas políticas públicas simultâneas deveriam ser implementadas para mudar esse quadro. Uma de correção de fluxo escolar e outra de melhoria da qualidade de ensino. É importante estabelecer objetivos claros.

O movimento Compromisso Todos pela Educação propõe que algumas metas sejam alcançadas até 2022, ano do bicentenário da independência do país. Dentre elas, destacamos:

1. noventa e oito por cento ou mais das crianças e jovens de 4 a 17 anos devem estar na escola; 2. noventa por cento ou mais dos jovens de 19 anos devem ter terminado o EM; e 3. oitenta por cento ou mais das crianças e jovens de uma série devem estar acima do nível da escala do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica considerado satisfatório para a série.

Há necessidade de inovar para alcançar esses objetivos e são propostas aqui algumas medidas para uma efetiva Reforma da Educação Básica.

Os jovens de até 19 anos, inclusive, deveriam estudar somente no Ensino Regular (ER), no turno diurno, com pelo menos 5 horas diárias. É um absurdo que a LDB exija somente 4 horas (800 horas em 200 dias).

Para garantir um bom fluxo escolar, o objetivo deve ser uma taxa de aprovação acima de 95%. Não se pode admitir mais que um ano de atraso. Deve haver um monitoramento do progresso de cada aluno e programas contínuos de reforço ou recuperação. Os alunos com 2 anos de atraso devem obrigatoriamente ir para uma classe de aceleração, cujo objetivo é recuperá-los e fazê-los retornar ao ER na série apropriada para sua idade.

Em 2005, 8% dos jovens de 14 anos estava fora da escola, porcentagem que sobe com a idade, atingindo 30% para os jovens de 17 anos. A correção do fluxo escolar e a melhoria do aprendizado contribuirão para mantê-los na escola. A maioria desses jovens se evade porque estão atrasados e não estão aprendendo. Devem-se oferecer cursos que aumentem a empregabilidade e, se necessário, dar auxílio financeiro. Por que não redirecionar recursos do Bolsa Família?

A Educação de Jovens e Adultos é um sistema de ensino paralelo ao Ensino Regular que existe devido à ineficiência deste. Ela deveria atender somente adultos de 20 anos ou mais, ter metodologia adequada e ser chamada de Educação de Adultos.

O que fazer para melhorar a qualidade de ensino? Inicialmente, deve se estabelecer um currículo mínimo nacional por série, para que seu ensino possa ser cobrado. Hoje em dia, isso é impossível, pois cada escola e livro didático fazem o que querem.

O professor é o principal ator no processo de aprendizado dos alunos. É preciso criar uma nova e atraente carreira, com bons salários e promoção por mérito (medido por avaliação externa da taxa de aprovação e desempenho dos alunos). Para entrar nela, precisam de certificação.

Os professores da 5ª série em diante não precisam necessariamente ter licenciatura, mas devem ter formação de nível superior, ser selecionados em exame de conteúdo na disciplina que pretendem ensinar, ser capacitados em serviço e passar por um processo de certificação. É preciso garantir que os professores conheçam bem os conteúdos que vão ensinar e saibam estimular os alunos a pensar. Devem conhecer a situação do país em termos de fluxo escolar e compreender os resultados do SAEB e da Prova Brasil.

Os programas de capacitação precisam chegar à sala de aula e, portanto, devem ser avaliados também pelo resultado dos alunos e dos professores capacitados. Deve haver responsabilização pelos resultados.

O governo federal precisa reconhecer a educação básica como prioridade número um na Educação e, além de gastar bem, alocar mais recursos.

Vale a pena pensar em uma Lei de Responsabilidade Educacional?

Essa reforma é possível ou somente um sonho? Cremos que é possível. No entanto, como sempre, depende não só dos governos, mas, principalmente, da mobilização da sociedade.