Título: Inclusão digital de 32 milhões
Autor: Almeida, Cássia e França, Mirelle de
Fonte: O Globo, 24/03/2007, Economia, p. 35

Brasileiro com acesso à web é jovem e tem renda alta. Uso principal é para estudo.

Legenda da foto: MARIA LUIZA é veterana

OBrasil tem 32,1 milhões de cidadãos com idade acima de dez anos que acessam a internet. O número parece grande, mas representa apenas 21% da população, o que põe o Brasil no 62º lugar no ranking de nível de acesso no mundo, e em 4º lugar na América Latina, atrás de países como Costa Rica, Guiana Francesa e Uruguai. Os dados são do suplemento especial da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/2005), divulgado ontem pelo IBGE, e evidenciam a enorme exclusão digital em que ainda vive a população brasileira. No perfil encontrado pelo instituto, a maioria é estudante, a idade é baixa (sobretudo entre 15 e 17 anos), a renda alta (mil reais em média per capita por residência) e o uso é majoritariamente para educação e aprendizado, citado por 71,7% dos entrevistados. Na opinião do economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), esses dois indicadores, juventude e estudo, são o sinal de que o investimento em inclusão digital é fator fundamental de atração do jovem à escola, numa faixa etária mais vulnerável à violência e ao desemprego:

- O grande medo de que a internet fosse veículo apenas de lazer para os jovens não se confirmou com os números da pesquisa. A internet é o meio que interessa a essa população. No momento que se fala de PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) educacional é importante descontingenciar os recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), que se tornaram uma verdadeira frustração.

E a renda, pela pesquisa, é a principal barreira para o acesso à rede. Enquanto o rendimento médio familiar per capita do brasileiro é de R$471, o ganho dos que acessam a internet sobe para mil reais. Na parcela dos que não acessam, o rendimento cai para R$333.

- A primeira barreira é ter o computador, a segunda é pagar o acesso - disse Plínio Aguiar Júnior, presidente da Agência Nacional de Telecomunicações

A escolaridade é outro fator importante. A parcela de incluídos digitais entre os que têm mais de 15 anos de estudo (pelo menos o ensino superior completo) chega a 76,2%. Por isso, cientistas e trabalhadores em serviços administrativos são os que mais acessam.

Casa é o principal local de acesso à rede

A empresária Maria Luiza Paiva Chaves é fã e usuária de primeira hora da internet. Mal o acesso à rede mundial de computadores começou a ganhar força no país, ela correu para garantir seu acesso. Hoje, Maria Luiza usa a internet em casa e no trabalho, onde chega a ficar online por até dez horas diárias.

- Faço pesquisas, serviços bancários, troco e-mails, converso com minha filha que mora fora do país. Ou seja, a internet faz parte da minha rotina - contou.

A comunicação ocupa o segundo lugar no ranking de motivos de acesso à rede citados pelos entrevistados. Já as transações bancárias ficam em penúltimo lugar, seguidas das compras, mostrando que ainda há desconfiança em usar dinheiro na internet.

- Esse tipo de uso é maior nas faixas etárias mais velhas e entre os homens, que também acessam mais para lazer e compras. As mulheres usam mais para educação - disse Maria Lucia Vieira, gerente da Pnad.

Por local de acesso, a residência é mais citada por 50% dos entrevistados, seguida de perto pelo trabalho (39,7%). A escola ainda é pouco utilizada como forma de entrar na internet. Apenas 25,7% citaram esse local de acesso.

- É importante usar a escola como ponte para essa inclusão. A escola socializa e educa para o uso mais voltado ao aprendizado, o que deve se refletir no desempenho dos alunos. Na pesquisa da Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), os jovens que têm acesso ao computador apresentam resultados 15% melhores - disse Neri, da FGV.

Os centros públicos gratuitos são os menos citados na pesquisa. Apenas 10% dos incluídos usam esse local de acesso. O diretor-executivo da ONG Comitê para a Democratização da Informática (CDI), Rodrigo Baggio, ressaltou o fato de a pesquisa contemplar os dados de acesso à internet pública gratuita, ou não, e nas escolas. Segundo ele, esta pesquisa já é resultado do esforço de políticas públicas e também da sociedade civil para incentivar a inclusão digital. Mas ele lamenta que os números ainda mostrem muita desigualdade no acesso à internet no país:

- Os dados constatam que ainda existe um apartheid digital. A taxa de crescimento do acesso à internet é muito maior nas classes mais altas e bem menos veloz entre a população de baixa renda.

COLABOROU Bruno Rosa