Título: Greve termina mas caos nos aeroportos continua
Autor: Camarotti, Gerson e Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 01/04/2007, Economia, p. 35

Manhã de sábado teve 14% dos vôos suspensos. Lula deve convocar reunião de emergência e Pires pode cair

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO. Apesar do acordo fechado entre o governo e controladores aéreos no fim da noite de sexta-feira, os atrasos continuaram na manhã de sábado nos principais aeroportos do pais e muitos vôos foram cancelados. Balanço divulgado ontem às 10h45m pela Infraero, informava que dos 553 vôos previstos entre a meia noite de sexta-feira e às 10h30 de ontem, 14,8% (82 vôos) foram cancelados e 18,3% (101 vôos) estavam atrasados.

Em Manaus, 41,7% dos vôos estavam atrasados. E os cancelamentos em Recife chegavam a 62,5% dos vôos previstos. Em Brasília, 15 vôos foram cancelados, o que representava 41,7% dos vôos previstos ontem pela manhã. Segundo o superintendente regional da Infraero Sudeste, Edgard Brandão Júnior, a situação só deve se normalizar na manhã de segunda-feira e isso apenas se não houver novos problemas no Cindacta 1.

Em entrevista à rádio Jovem Pan, o presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira, disse que protestos como o dos controladores destroem a malha aérea do país. A Infraero informou que os controladores de vôo retornaram ao trabalho na madrugada e as operações nos sistema de radar nos Cindactas estava normalizada.

- Uma paralisação longa como essa destrói a malha aérea do país. Estamos, praticamente, começando do zero neste sábado - lamentou José Carlos Pereira, durante a entrevista à emissora de rádio.

A nova crise aérea deve antecipar a saída do ministro da Defesa, Waldir Pires. Para interlocutores, o próprio ministro admitiu que sua situação ficou insustentável e que ele só vai esperar a normalização dos aeroportos para ter uma saída honrosa. Previsto para chegar de Washington na madrugada deste domingo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve convocar, ainda hoje, uma reunião em Brasília com ministros e assessores ligados ao caos aéreo.

Lula quer plano emergencial para a Semana Santa

Nos últimos meses, o próprio Lula resistia em demitir do governo o amigo Waldir Pires. Tanto que o nome do titular da Defesa não foi incluído na reforma ministerial. A idéia era substituir Pires em dois meses, quando a crise estivesse normalizada. O presidente estava fazendo sondagens sobre o melhor perfil para a Defesa e tinha concentrado sua preferência pelo nome do ex-presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP). Mas diante do agravamento do caos aéreo, na sexta-feira, a avaliação feita ontem por assessores do governo é de que a solução para a mudança na Defesa terá que ser imediata.

Na reunião de hoje, Lula vai avaliar as providências tomadas para curto prazo e a situação dos aeroportos. Mas segundo assessores do Palácio do Planalto, ele deve criar um plano emergencial para resolver o impasse dos controladores antes da Semana Santa.

Para interlocutores, o presidente avaliou que não havia outra solução que não fosse a negociação com os controladores. Neste momento, o Planalto ainda não avaliou como será a reação dos comandantes, que tiveram que voltar atrás e recuar da ordem de prisão de controladores militares que estavam em greve.

Pela manhã, os primeiros sinais que chegaram no Ministério da Defesa eram de que, com a interferência direta do presidente Lula, os oficiais militares da aeronáutica lavariam as mãos nas tratativas com os controladores de vôo. No gabinete do ministro da Defesa, acreditavam que os oficiais repassariam de agora por diante a responsabilidade pela condução da crise para a área civil do governo.

A desmilitarização do tráfego aéreo, prometida aos controladores, ainda pode levar algum tempo, Isso porque segundo estudos internos uma migração definitiva do controle militar para o civil pode durar alguns anos.

A negociação para por fim à greve dos controladores foi feita pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, por determinação de Lula. A decisão do presidente, que, pela Constituição, é o comandante das Forças Armadas, desautorizou os oficiais da Aeronáutica que tinham endurecido com os grevistas que estavam sob ameaça de prisão da Força. A determinação de prisão foi cancelada por determinação do presidente Lula.

O governo acabou cedendo às pressões dos controladores, a grande maioria sargentos da Aeronáutica. Pelo acordo, o governo garantiu que não haverá perseguição dos militares envolvidos no movimento nem transferências (estopim da paralisação), ofereceu gratificação especial aos grevistas e prometeu implementar a desmilitarização do controle do tráfego aéreo, com criação de uma carreira para os controladores civis. A integridade física dos trabalhadores também foi assegurada, bem como sua volta para casa.

O aeroporto internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, amanheceu lotado de passageiros. Até as 10h da manhã de ontem, 17 vôos nacionais e internacionais haviam sido cancelados no Galeão e outras dez decolagens sofriam atrasos de até três horas. Os saguões estavam lotados. Só no check-in da Gol, a fila tinha mais de mil pessoas. Um grupo de argentinos fez uma pequena manifestação, gritando e batendo palmas, para protestar contra os atrasos.

Em Guarulhos, também houve problemas e o Procon de São Paulo já pensa em entrar na Justiça contra os controladores de tráfego aéreo.

O aeroporto de Brasília, segundo a Infraero, começou a operar às 5h49m e apenas vôos destinados à região Norte tinham autorização de decolagem. Para outros destinos, os vôos estavam suspensos. O número de reclamações à Agência Nacional de Aviação explodiu. Da noite de sexta-feira ao início da manhã de ontem, foram apresentadas 143 queixas de passageiros. Em períodos normais as reclamações não passam de dez por dia. Onze vôos da Gol tinham sido cancelados. Os funcionários explicaram que a companhia foi obrigada a retardar o embarque de várias vôos para cumprir a regra de descanso de pilotos, que ficaram até tarde na sexta esperando autorização para decolagem.

- Os passageiros de ontem não devem viajar nem hoje, imagina a gente - comentou o funcionário público José Neto Sobrinho.

Ele e a mulher Maria Marques Neto há um mês compraram bilhete da Gol para Salvador. O vôo com partida prevista para 9h40m de ontem foi cancelado.