Título: Lula dá carta branca para FAB
Autor: Alvarez, Regina e Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 04/04/2007, Economia, p. 23

Aeronáutica retoma controle do tráfego aéreo e monta plano de emergência contra greves.

OComando da Aeronáutica reassumiu ontem totalmente o controle do tráfego aéreo civil, enquadrou os controladores de vôo militares no rígido modelo de hierarquia e disciplina e acionou um plano de emergência, para garantir o funcionamento dos aeroportos em caso de nova paralisação. Para o plano de contingência, que pode ser adotado a qualquer momento, inclusive no feriado da Páscoa, a FAB mobilizou cerca de mil militares lotados em diversas áreas do setor de Defesa Aérea, em todo o Brasil. Eles têm formação de controlador de tráfego aéreo, mas não atuam na aviação civil.

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu o Conselho Político - formado pelos líderes e presidentes dos partidos da base - e durante o encontro desautorizou o acordo fechado pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, na última sexta-feira, com os controladores amotinados. O presidente informou que as negociações para resolver a crise no setor aéreo seriam conduzidas, a partir de agora, pelo Comando da Aeronáutica.

- Só depois de restabelecida a ordem voltaremos a discutir mudanças no setor. Entendo as razões da greve, mas não se pode admitir isso na Aeronáutica. Se admitirmos isso, teremos greve em todos os serviços essenciais do país - disse o presidente na reunião.

Crise mais delicada, admite Lula

O clima no alto escalão das Forças Armadas melhorou ontem, com a decisão de Lula de dar carta branca ao comandante Juniti Saito (FAB) para retomar o controle do tráfego aéreo e enquadrar no regimento militar os controladores que haviam se rebelado na sexta-feira. Entretanto, entre os controladores, a crise agravou-se, com o endurecimento das medidas disciplinares e a abertura do Inquérito Policial Militar (IPM), que deve resultar em punições severas para 18 militares.

A crise atingiu seu clímax na segunda-feira, quando Lula chamou para conversar os comandantes das três Forças - Exército, Marinha e Aeronáutica. Eles deixaram claro ao presidente que a quebra dos dois pilares das Forças Armadas - hierarquia e disciplina - era inaceitável. Saito ainda ressaltou que era inadmissível dar gratificação aos insubordinados.

O próprio Lula admitiu a interlocutores que estava vivendo o momento mais delicado do seu governo, após o escândalo do mensalão, e a maior crise com as Forças Armadas desde a redemocratização, em 1985. Por isso, precisava restabelecer a autoridade dos comandantes, recuar taticamente e encaminhar as mudanças prometidas de forma institucional. Com os sinais emitidos, os comandantes se acalmaram e avaliavam ontem que o clima de tensão tinha acabado, embora a crise não estivesse totalmente resolvida.

No Cindacta-1, pouco antes da mudança de turno dos controladores de vôo, prevista para às 14h30m, o oficial que chefia a unidade fez uma preleção aos controladores, alertando para os riscos de uma nova paralisação. Ele falou em prisões e perda da carreira. Naquele momento, os militares já tinham sido informados do resultado da reunião com o ministro Paulo Bernardo e do recuo do governo.

Com a FAB novamente no controle do tráfego da aviação civil, os militares incluídos no plano de contingência estão de prontidão para atuar em qualquer situação de emergencial. No Cindacta-1 (Brasília), epicentro da crise, os sargentos da Defesa Aérea foram aquartelados e ficaram de prontidão logo pela manhã, à espera de orientações.

Segundo cálculo de um militar graduado, esses militares teriam condições de garantir a operação dos principais aeroportos do país, com número de vôos reduzido, mas mantendo o fluxo do tráfego aéreo (cerca de metade das operações diárias em caso de paralisação geral).

Para a Aeronáutica, embora a maioria dos militares do grupo não esteja na atividade de controle da aviação civil, eles têm conhecimento básico para executar a tarefa. Para isso, porém, terão de passar por treinamentos e ser homologados por órgãos da própria Força. Essa é também uma exigência da Organização Civil da Aviação Internacional para que esses profissionais possam controlar aeronaves estrangeiras.

Para o plano de contingência, foram convocados militares lotados nos Centros de Operações Militares (Copm); Grupos de Comunicação e Controle (GCC), que atuam com radares móveis e especializados em controle de aproximação; e nas torres de bases exclusivamente militares (como Santa Cruz, no Rio).

Dissidentes vão para carreira civil

Caberá à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) decidir a prioridade de decolagem. Transporte de doentes, órgãos para serem transplantados ou vôos que envolvam segurança nacional terão pronto atendimento. Ficou decido ontem que as regiões com maior movimento, como Brasília, São Paulo, Rio e Belo Horizonte, teriam prioridade nos pousos e decolagens em caso de greve geral. Nos cálculos da FAB e da Anac, se o plano estivesse em vigor, uma paralisação como a de sexta-feira reduziria o tráfego em 30%, não em 80%.

No contexto da desmilitarização, cuja idéia o governo encaminhará a médio prazo, a Aeronáutica considera que o efetivo acionado para o plano de emergência - cerca de mil homens - será mantido na Força. Os sargentos rebelados lotados nos Centros de Controle são considerados dissidentes e devem ser transferidos para a Secretaria a ser criada pelo governo, na estrutura do Ministério da Defesa, iniciando uma nova carreira de controlador civil.

Ao todo, esse órgão deve receber 1.500 profissionais. Porém, os controladores que forem punidos pela Justiça Militar serão expulsos da FAB e não poderão mais pertencer ao serviço público.