Título: 'Paciência (com caos aéreo) já passou do limite'
Autor: Jungblut, Cristiane e Fadul, Sergio
Fonte: O Globo, 06/04/2007, O País, p. 5

Ministra do Turismo cobra solução para apagão e, sobre política, diz que o PT, "graças a Deus", enfim aceita coalizão.

BRASÍLIA. Escolhida ministra do Turismo após ser mantida em suspense por meses pelo presidente Lula, a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PT) diz que está muito animada com a nova função e que só gasta energia no que vale a pena. Em entrevista de mais de uma hora ao GLOBO, em seu gabinete, esforçou-se para mostrar que está enfronhada nos assuntos da pasta, citando números e nomes de programas governamentais. Ela não se esquivou de falar de política e disse que o PT amadureceu, "graças a Deus", aceitando uma ampla coalizão. Impecavelmente arrumada e maquiada às 9h30m de ontem, disse que a paciência do brasileiro com o apagão aéreo "já passou do limite" e que é preciso uma solução imediata.

Cristiane Jungblut e Sergio Fadul

A senhora foi a ministra indicada pelo PT. Como está sendo recebida no governo?

MARTA SUPLICY: Estou encontrando uma boa vontade grande de todos os ministérios.

Como está vendo a coalizão de apoio ao presidente Lula? Ela está sendo harmônica, ou cada partido tenta marcar seu território?

MARTA: Em todo começo de governo, há um olhar mais aguçado em relação a como se encaminham os acordos. Já estamos vivendo um momento que mostra que os acordos vão funcionar. A maioria dos parlamentares já percebeu que vai ser para valer. Os ministros antigos e os que entraram entendem a importância de uma base sólida. Ninguém está de brincadeira.

A senhora declarou que não pretende ser candidata a prefeita de São Paulo em 2008, que imagina ficar no ministério até 2010...

MARTA: Olha, as coisas não estão escritas de antemão. Isso é que é. Como já disse, não sou candidata a nada e estou trabalhando duro neste ministério.

Em 2010, a senhora retoma seu projeto político?

MARTA: Quando o presidente colocou na posse que a prefeita de São Paulo pode ser candidata a qualquer coisa no mundo, me senti muito honrada. Estou aqui para trabalhar dia e noite. Estou animada. Agora, política é uma montanha-russa. Não tenho costume de fazer trampolim das coisas. Não tenho projeto de passar dois aqui, um ano aqui, três anos ali e já estar pensando onde vou chegar, que cargo vou ocupar. Meu estilo é: estou lá, vou fazer, e o dia seguinte é o dia seguinte. Gasto energia onde vale a pena. No momento, vale a pena gastar aqui. O que vem depois, vem depois.

Como o PT está reagindo à coalizão com o PMDB?

MARTA: Graças a Deus, o PT amadureceu! Graças a Deus! (risos) O PT hoje tem a plena consciência, na maioria dos filiados, de que para governar é necessária uma coalizão. Em São Paulo, já governei com uma coalizão amplíssima, da qual só não faziam parte o PFL e o PSDB. Sem base de apoio você não governa.

O PT já superou as recentes crises?

MARTA: Quando estava na prefeitura, fizemos essa grande coalizão. Ali foi o grande teste. O PT não tinha essa experiência. Não tivemos um cisco com o PT na prefeitura, e lá não é fácil. Depois, tivemos uma experiência nacional que foi pesada e difícil. O que restou é que tem que ter coalizão e que ela seja de forma transparente. Tem que ter emendas dos deputados, mas que sejam emendas que privilegiem a população. Base que não vota com o governo não é base.

E a cobrança de que o PT de São Paulo deveria fazer uma "coalizão" com o restante do PT?

MARTA: Não teve nunca isso. Vai ver os postos que o PT de São Paulo tem no governo federal! Isso não é verdade.

Quais serão as prioridades no Turismo para o Rio?

MARTA: Estou muito feliz de ir para o Rio hoje (ontem), participar da inauguração do Teatro Popular, que é muito importante para o Caminho Niemeyer. Um dos poucos artistas que atraem, não só para a visitação, mas também para a compra de sua obra, é o Niemeyer, que é um nome internacional.

Que outros projetos o ministério tem programado?

MARTA: Veja essa eleição em que o Cristo Redentor está concorrendo, para ser uma das novas maravilhas do mundo. Adorei isso. Todos temos algumas imagens do país, e uma delas é o Cristo. E no mundo também. Faz parte não só do Ministério do Turismo, mas de todo brasileiro fazer essa campanha, que coloca o nosso país de forma positiva no exterior e pode se tornar um símbolo de apelo de visitação internacional do Rio. Fizemos uma parceria, quatro filmes para a campanha "Vote no Cristo, ele é uma maravilha". Aliás, por que não fazemos uma campanha dentro do Pan com isso? Inclusive com o dia de votar na internet.

Na posse, a senhora citou o combate ao turismo sexual como prioridade.

MARTA: Falei que iria combater o turismo sexual e a exploração infantil. Mas o Brasil não é um destino de turismo sexual, como alguns países o são, e não podemos transformá-lo nisso. Se fizermos uma bandeira, se reiterarmos continuamente esse tipo de debate na mídia... O turismo sexual e a exploração infantil têm que ser combatidos de forma eficaz e quieta. Como é o combate eficaz? É colocar uma máquina no ministério, que vai ver onde existem focos, onde as crianças estão sendo exploradas, fazer isso em parceria com o Patrus Ananias (Desenvolvimento Social) e com o Carlos Lupi (Trabalho), porque faz parte da mesma teia de problemas.

O caos aéreo não atinge em cheio seu ministério? Todos os seus planos não podem dar em nada, diante da insegurança no funcionamento dos aeroportos?

MARTA: Tenho certeza de que esse problema vai ser solucionado. Um país como o nosso não pode ter um segundo episódio como o que vivemos. E o presidente está empenhado pessoalmente na resolução.

Esse problema afetou a percepção do turista estrangeiro em relação ao Brasil?

MARTA: O turista estrangeiro não, porque a Jeanine Pires, que é presidente da Embratur, lançou o programa de mídia "Brasil, vire fã", na Itália, e ela me ligou e disse que foi o máximo. Aí, perguntei: "e os aeroportos, como a turma está reagindo?" Ela falou: "nenhuma palavra". Não chegou lá. Infelizmente, não temos essa importância, mas felizmente nesses momentos (risos).

E internamente? Não foi um duro golpe?

MARTA: Internamente, é outra situação. As operadoras vêm se queixando, mas não sabemos o resultado final. Isso porque, se os aeroportos estão com menos movimentação, e isso é uma realidade, o deslocamento nas rodovias aumentou em 20%. Então, não sabemos se vai resultar numa baixa hoteleira. Que afetou, é evidente. Que a paciência do brasileiro que viaja de avião está no limite, é evidente. A paciência já passou do limite. Tem que estar resolvido esta semana, na Páscoa! E espero que até julho não tenhamos nem mais sombra disso, que seja uma página virada.

O Ministério do Turismo pretende contribuir para solucionar esse problema?

MARTA: Dentro do que posso fazer, eu fiz. Conversei com o embaixador americano, Clifford Sobel, e vou ter um encontro, provavelmente nos Estados Unidos, com as operadoras americanas de aviação. Vamos fazer uma viagem com cinco grandes cadeias hoteleiras americanas para o Nordeste. E tentar ver qual teria interesse de ter uma linha, porque elas não voam para o Nordeste. E como é que Brasília não tem vôo internacional? A partir de julho, terá: da TAP. Serão cinco vôos diretos de Lisboa para Brasília, cinco para o Rio de Janeiro e três para São Paulo. O Galeão está ocioso. Temos que descentralizar de São Paulo.

O apagão aéreo não expôs uma impotência do governo, que ficou nas mãos dos controladores de vôo?

MARTA: Estou vendo o desabafo de um cidadão. Eu te ouvi, dez minutos de ministra como terapeuta é fogo! Vou cobrar (risos).

No Natal, não foram os controladores, foi o overbooking praticado pelas empresas...

MARTA: Estou contando mais dez minutos de desabafo! (risos). Elas foram abusadas, mas eu nem estava no governo e isso eu não posso fazer. Eu tenho que fazer o que posso fazer. Eu gosto de fazer e sou fazedora! O que eu posso fazer, pode ter certeza que aqui vai acontecer.

Na conversa que a senhora teve com o embaixador americano, tratou-se da questão dos vistos?

MARTA: Não é uma questão que eles têm muita disponibilidade de discutir. Mas tem um pedido deles, que, na minha opinião, poderia facilitar a vinda de americanos para cá: é o americano poder tirar o visto quando chega ao Brasil, porque não temos consulado em todos os estados americanos. Ele tem que ir pessoalmente a um consulado, demora uma semana, o que dificulta muito a viagem. Vários países têm o visto na entrada. O embaixador colocou que, da porcentagem de turistas americanos para o mundo, apenas 1,2% vêm ao Brasil. Ou seja, nada.

A senhora disse que quer desenvolver o turismo popular. De que forma?

MARTA: Um dos focos principais desse ministério é aumentar a cesta de consumo do trabalhador. Estou desenvolvendo um pacote de turismo de baixa renda, para colocar na cesta de consumo do trabalhador a possibilidade do lazer.

Mas o turismo dentro do Brasil é caro...

MARTA: Você acha caro um pacote de R$400? Vamos ter. O aposentado escolhe uma viagem e ele tem de seis meses a 24 meses para pagar, com juros que vão de 1,3% a 2,41% ao mês. A operadora recebe cash, e o aposentado paga em 24 meses. E pega na Caixa Econômica. Gostei muito da poupança-turismo, na qual o correntista entra e concorre a uma viagem de R$4 mil a R$6 mil. E vou fazer a "Semana do Saco Cheio".

O que é a "Semana do Saco Cheio"?

MARTA: Pela lei, o professor tem direito a uma semana em que ele faz estudos de avaliação sobre a escola. A escola pára e os alunos apelidaram de "Semana do Saco Cheio". As escolas de classe média fazem excursão. Mas já vi que 75% da classe vão à excursão e 25% não vão, porque não têm como pagar. Então, a gente faz uma oferta, através da Caixa, para o pai pagar em até 36 meses, e o aluno vai com os outros.

E como será a gestão do ministério?

MARTA: Não se deve pulverizar dinheiro. Até a primeira semana de maio, vou ter a noção exata dos pontos turísticos que vamos investir, que serão de quatro a seis. Vamos buscar o crédito do BNDES para facilitar pousadas e hotéis, investidores internacionais, fundos de Previdência, fazer projetos de formação profissional, incrementar linhas aéreas para esses locais. E com as emendas dos deputados, que também vou correr atrás, fazer a infra-estrutura.