Título: Cada vez mais iguais
Autor: Amora, Dimmi e Autran, Paula
Fonte: O Globo, 08/04/2007, Rio, p. 18

Tráfico e milícias em guerra repetem no Rio modelo que fez disparar violência na Colômbia.

Na crônica da anunciada trajetória do tráfico e das milícias cariocas - quando se toma como base a experiência colombiana com traficantes e paramilitares -, são muitos os capítulos quase comuns entre estes países vizinhos de passado coronelista e presente de violência urbana. Guardadas as devidas proporções, já que suas realidades não são exatamente as mesmas (a Colômbia é produtora e exportadora de drogas, enquanto o Brasil é um país de consumidores), o Rio vem seguindo um roteiro já vivido por Medellín, Cáli e Bogotá.

Uma vez que os traficantes de lá se organizaram em cartéis, os nossos formaram grupos armados denominados facções. Os dois grupos se utilizaram de forte territorialização para manter o poder. E logo deixaram de dar ênfase à maconha para investir na cocaína. Na falta de reação do Estado contra os traficantes, não tardaram a surgir no país vizinho grupos paramilitares, cuja ação lembra muito a dos milicianos recém-surgidos aqui.

Os grupos do Rio, formados por policiais civis e militares que não resolvem os problemas de segurança e sociais dentro da legalidade, seguem o exemplo colombiano ao contribuir para o aumento da criminalidade. E não só no que diz respeito à cobrança por segurança e ao fornecimento de serviços, como a venda de botijões de gás e a criação de centrais de TV a cabo clandestinas. Aqui, como lá, estes grupos estão se infiltrando na política e contribuindo para uma guerra urbana, com direito à subnotificação de crimes dos dois lados. Milícias e tráfico anunciavam uma nova guerra no Rio. Não por acaso, o governador Sérgio Cabral viajou para o país no mês passado.

- Uma semelhança muito clara é a debilidade dos dois estados em dar segurança a seus cidadãos. E vários grupos se organizaram para se aproveitar da situação. Em alguns casos, é possível até que esta organização seja positiva. Mas o que acontece aqui e lá não é. Grupos com interesses econômicos ou políticos passam a tomar o lugar do estado. E, como ambos os países não têm consciência cívica e coletiva, por suas histórias, o tráfico fez isso, assim como as milícias e os paramilitares - afirma a pesquisadora Marianna Olinger, que acompanhou processos de paz na Colômbia.

O sociólogo Hugo Acero, que durante dez anos foi chefe da Polícia Metropolitana de Bogotá, usa a imagem de um pequeno leão para descrever o que é a milícia. Ele diz que, no início, o animal come pouco, mas vai crescendo e querendo mais carne, até que devora o próprio dono:

- Os cidadãos contratam um delinqüente para matar ou controlar outro delinqüente. Os grupos começam a se atacar. E temos uma violência que não se sabe quando vai terminar.

Maurício Rubio, economista colombiano que estudou a violência, diz que a origem do problema nos dois países é a mesma: o baixo investimento em educação. Lá, contudo, as principais cidades chegaram a um estado tão profundo de caos que abriram os olhos e começaram a resolver seus problemas. Se não iniciar ações políticas efetivas, como algumas cidades colombianas, o Rio continuará tendo apenas exemplos negativos para se espelhar no país vizinho.

* Enviado especial à Colômbia COLABOROU Cristina Azevedo