Título: Irã: urânio em escala industrial
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Fonte: O Globo, 10/04/2007, O Mundo, p. 21

País ameaça deixar o Tratado de Não Proliferação Nuclear e assusta o Ocidente.

TEERÃ

Num anúncio em tom de desafio e que preocupou especialistas e governos de todo o mundo, o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, disse ontem que o país alcançou a capacidade de produzir combustível nuclear em escala industrial. O presidente não deu detalhes sobre a capacidade nuclear do país mas, de acordo com autoridades, pelo menos três mil centrífugas para enriquecimento de urânio teriam sido instaladas e já estariam em operação. O Irã também ameaçou deixar o Tratado de Não Proliferação Nuclear caso continue a sofrer pressões.

A declaração foi feita durante um discurso, transmitido ao vivo pela TV iraniana, na usina nuclear de Natanz, na província de Isfahã, para celebrar o Dia Nacional de Tecnologia Nuclear.

- Durante o último ano, com os grandes esforços de nossos queridos cientistas, o Irã foi bem-sucedido em produzir combustível nuclear e alcançar o estágio de produção industrial - afirmou.

Segundo a agência de notícias estatal iraniana Irna, o país estaria agora no seleto clube nuclear, atrás somente dos cinco membros do Conselho de Segurança da ONU, e de Japão e Alemanha na produção de urânio enriquecido, e ao lado do Brasil em oitavo lugar. Segundo o vice-diretor da Organização de Energia Atômica iraniana, Mohammad Saidi, em 20 dias o país dará o número exato de centrífugas em funcionamento.

- Por enquanto, só dizemos que já ultrapassamos o número de três mil (centrífugas). Mas em breve todos saberão o número exato - disse, ressaltando que, apesar do país ter sido alvo sanções do Conselho de Segurança em duas votações, continuará investindo apenas em tecnologia pacífica.

Até ontem, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) estimava que Teerã tinha, no máximo, mil centrífugas para enriquecimento. Especialistas afirmam que 1.500 centrífugas em funcionamento são capazes de produzir em um ano material suficiente para a produção de armas atômicas.

Rússia pressionada a tomar atitude

O anúncio provocou reação imediata de governos e alertas de especialistas. Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido fizeram duras críticas a Teerã. Segundo o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, Gordon Johndroe, a Casa Branca ficou "muito preocupada" com a informação divulgada:

- O Irã continua desafiando a comunidade internacional e se isolando ainda mais ao expandir seu programa nuclear, em vez de suspender o enriquecimento de urânio.

Na Rússia, parceira comercial e estratégica de Teerã, diplomatas e especialistas preocupados com o andamento da crise pressionam Moscou a tomar atitudes mais enérgicas. Um dos principais cientistas nucleares russos, Yevgeny Velikhov, fez um alerta ontem de que "é apenas questão de tempo até que o Irã desenvolva uma arma nuclear."

- O programa nuclear iraniano deve ser interrompido. Do ponto de vista científico, é claro que eles podem criar armas nucleares. A questão é quando - disse o cientista, amigo e aliado do presidente russo, Vladimir Putin, e que trabalhou com o líder do projeto da bomba nuclear russa, Igor Kurchatov. - Os cientistas americanos esperavam que a União Soviética levaria até 1954, no mínimo, para produzir a bomba nuclear. Ficaram muito surpresos quando conseguimos em 1949.

Alguns países europeus sustentam que o Irã está a alguns anos de conseguir a bomba atômica, e dizem que os motivos são problemas técnicos em centrífugas antigas e um estoque de urânio cheio de impurezas.

Em meio ao agravamento da crise entre o Irã e o Ocidente, o secretário britânico da Defesa, Des Browne, anunciou que os 15 marinheiros capturados pelo Irã e libertados semana passada serão proibidos de vender suas histórias. A medida foi tomada após duras críticas à permissão de que cobrassem cachê para conceder entrevistas.